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4 DE NOVEMBRO DE 1997

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III — Apurar as questões atinentes à responsabilidade política do Governo:

Eram de intervenção do Primeiro-Ministro a sua autorização para a tomada de decisão e a iniciativa que lenha tomado conducente à posterior concretização deste acto da Administração;

Apurar as demais circunstâncias políticas, o tempo e o modo em que a questão se começou a colocar, no contacto temporal das negociações que conduziram à assinatura do acordo de concertação estratégica.

2 — Os trabalhos da Comissão, no que respeita ao presente relatório, foram prorrogados por duas vezes: pelas deliberações n.os ll-PL/97, aprovada em 31 de Julho de 1997 (por mais 108 dias), e 14-PL/97, aprovada em 16 de Outubro de 1997 (por mais 25 dias).

Parte III — Fundamentação A — Questão prévia — Poderes da Comissão

1 — Chegados à parte conclusiva do presente relatório, importa, porém, antes de mais, discutir e resolver uma questão prévia trazida ao debate da Comissão pelos Deputados do PS e enunciada, também, pelo Ministro das Finanças, na sua audição.

Como vimos já, a Comissão foi informada pelo Pro-curador-Geral da República e pelo STA, de que, de autoria do procurador-geral-adjunto junto do STA, foi interposto recurso contencioso directo de anulação do acto do Mi-. nistro das Finanças que concedeu o aval do Estado à UGT (despacho n.° 122/97-XITI, de 7 de Março), recurso esse que deu entrada no STA em 26 de Junho de 1997, tendo aí sido distribuído à 2." Subsecção da 1." Secção, com o n.°42 574.

Embora sem que ninguém tivesse, em concreto, suscitado a necessidade, ou sequer a oportunidade, de suspender os trabalhos da Comissão enquanto o referido recurso se encontrasse em apreciação no STA, a verdade é que a questão chegou a ser sugerida, tendo-se mesmo gerado algum debate. No entanto, dado não ter sido presente qualquer proposta para deliberação da Comissão, esta não chegou a pronunciar-se sobre o assunto, tendo prosseguido os seus trabalhos.

2 — Assunto diferente e mais complexo encontra-se subjacente à agora enunciada. E é, aliás, matéria já tratada por alguma doutrina nacional e pelo Tribunal Constitucional, estando sobejamente discutida noutras ordens jurídicas. Referimo-nos à eventual inconstitucionalidade da resolução da Assembleia da República que aprovou o objecto da presente Comissão por violação do princípio

' da separação de poderes consagrado na nossa Constituição.

Em concreto, alguns Deputados do PS e o Ministro das Finanças colocaram dúvidas sobre se não violaria o princípio da separação de poderes, em especial a reserva de jurisdição atribuída aos tribunais, a apreciação da legalidade do acto de concessão do aval à UGT por parte desta Comissão.

3 — Como dissemos já, não se trata de um debate novo, nem no estrangeiro, nem entre nós.

O próprio Tribunal Constitucional teve já oportunidade de se pronunciar sobre questão semelhante (Acórdão n." 195/94, Diário da República, 2." série, de 12 de Maio de 1994), dirimindo o conflito surgido entre a V Comissão Parlamentar de Inquérito ao Acidente de Camarate e o

Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, apreciando da constitucionalidade de vários artigos da Lei n.° 5/93, de 1 de Março, que estabelece o regime jurídico dos inquéritos parlamentares.

No acórdão citado, o Tribunal Constitucional pronunciou-se pela conformidade com a Constituição dos artigos em exame da Lei n.° 5/93.. Em síntese, o Tribunal considerou «que o conceito de separação de poderes não é um princípio inamovível, mas algo sempre adaptável às circunstâncias concretas e a cada regime político em particular, desde que se mantenha a independência entre os diversos poderes que caracteriza o Estado de direito democrático, tal como é concretamente configurado na Constituição». Fazendo apelo à densificação do conceito constitucional do princípio da separação e interdependência de poderes tal como ele tem vindo a ser realizado pelo Comissão Constitucional e pelo Tribunal Constitucional em variadíssimos pareceres e acórdãos (por todos, pareceres n.°s 16/79 e 1/80 e Acórdão n.° 26/84), o Tribunal entende que «o princípio da separação de poderes, tal como está previsto no artigo 114.°, n.° 1, da lei fundamental (actual artigo 111.°], veda, por um lado, que um órgão de soberania se atribua, fora dos casos em que a Constituição expressamente o permite ou impõe, competência para o' exercício de funções que essencialmente são conferidas a outro e diferente órgão e, do outro, que um determinado órgão de soberania se atribua competências em domínios para os quais não foi concebido, nem está vocacionado». Concluindo que, «não obstante a coincidência ou sobreposição de objectos entre a comissão parlamentar de inquérito e o processo judicial findo, verifica-se uma profunda e radical diversidade entre os objectivos prosseguidos num e noutro caso. [...] Na realidade, o objectivo das indagações parlamentares só poderá consistir numa averiguação informal e global, destinada a habilitar a Assembleia da República — como órgão político e não obviamente como entidade jurisdicional — a adoptar as medidas (legislativas, políticas, de fiscalização, etc.) situadas no âmbito da sua competência constitucional, que julgar adequadas.» Assim, a Constituição «não veda o denominado 'inquérito paralelo', isto é, a possibilidade de um mesmo facto ou situação ser simultaneamente objecto de üm inquérito parlamentar e de um processo judicial».

4 — Por nós aderimos totalmente a estas considerações do Tribunal Constitucional.

No actual Estado de direito contemporâneo pouco sentido faz defender o princípio da separação de poderes como um «modelo normativo pré-constitucional», que se impusesse à própria lógica constitucional de distribuição de funções entre os vários órgãos de soberania, máxime, o legislativo, o executivo e o judicial. Conforme decorre de um princípio metodológico aceite (Gomes Canotilho), só pela análise em concreto de cada sistema constitucional é possível encontrar os equilíbrios de poderes existentes. Cada Constituição constrói o seu sistema de «freios ou contrapesos», ou mantendo-se fiel à concepção originária na antiguidade clássica, onde o pluralismo estrutural cria um verdadeiro equilíbrio de poderes, ou alicerçando-se na mie of law anglo-saxónica, assegurando um primado do' legislador democrático.

O actual artigo 111.°, n.° 1, da nossa Constituição explicitamente consagra o princípio da separação e interdependência dos poderes conferidos pela Constituição aos órgãos de soberania. O que significa duas dimensões antagónicas que conformam o princípio orgànizatório básico do poder político na nossa Constituição. Por um lado, a