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II SÉRIE-C — NÚMERO 4

«empresas privadas nacionais». No entender desta Câmara, «poderão verificar-se casos em que se justifique a concessão de avales pelo Estado a sociedades não anónimas», além de que o conceito de instituto público já integrava a noção de empresa pública, de acordo com a doutrina de Marcello Caetano, razão por que se deveria prever na lei o conceito de empresa privada nacional. Ou seja, o essencial da proposta de alteração desta Câmara residia na possibilidade de alargar a concessão de aval do Estado a sociedades não constituídas sob a forma de «sociedades anónimas de responsabilidade limitada». Mas, para esta Câmara, não oferecia dúvidas de que o conceito de empresa por eles proposto abrangeria apenas sociedades.

A discussão no Plenário da Assembleia Nacional foi bastante participada, com a intervenção de alguns Deputados da chamada «ala liberal», como Magalhães Mota e Pinto Balsemão {Diário das Sessões de 17, 22, 23 e 24 de Novembro de 1972).

No relatório da Comissão de Finanças e de Economia figura já a adesão à fórmula proposta pela Câmara Corporativa, «de forma a cobrir todas as empresas nacionais, privadas ou públicas, de economia mista ou não». No seu seguimento, foi apresentada uma proposta de alteração, explicitada pelo Deputado Almeida Garrett, referindo que «deve conceber-se que, em princípio, a forma de sociedade que revestirão as empresas que venham a contratar operações de crédito [...] será a forma de sociedade anónima, dada não só a grandeza exigida a essas empresas como a tendência moderna na respectiva figuração. No entanto, entendeu-sc que conviria [...] generalizá-las a todas aquelas empresas que pudessem prestar um concurso válido para o desenvolvimento económico e social do País. [...], seja qual for o tipo e forma de sociedade que essas empresas revistam.»

Questionado pelo Deputado Magalhães Mota, que defendeu a manutenção do termo «sociedades anónimas» por entender que se trata de «empreendimentos de grande dimensão, essenciais ao desenvolvimento económico, e só para esses empreendimentos, e só para essas fórmulas, se

compreende que o Estado venha, com o seu aval, comprometer-se na realização desses empreendimentos», o Deputado Reboredo e Silva explicitou que «poderá haver sociedades por quotas, e sei que houve e há algumas suficientemente poderosas em meios e capital para serem consideradas empresas de manifesto interesse nacional», completado pelo Deputado Alberto de Alarcão, que referiu que, «para além das sociedades anónimas, outras sociedades poderão interessar à obtenção desses avales, nomeadamente as sociedades cooperativas nacionais».

Face a este debate, é inegável que a Assembleia Nacional, em 1972, manteve o conceito de empresa já presente no Decreto-Lei n.°43 710, eventualmente explicitando que nele se deve considerar abrangida qualquer sociedade anónima, por quotas ou cooperativa, com suficiente dimensão organizatória e económica para levar por diante um empreendimento de manifesto interesse nacional. Para a mens legislatoris da Lei n.° 1/73 tão importante era a empresa como a actividade por ela desenvolvida (o empreendimento), sendo necessária uma dimensão organizativa e económica consentânea com a própria dimensão do seu objecto. Daí a necessidade da forma societária, preferencialmente como sociedade anónima, excepcionalmente como sociedade por quotas ou cooperativa.

4 — Como dissemos, não consideramos os elementos histórico ou subjectivo como decisivos para a interpretação

da lei, desde que não possuam na letra da lei expressão suficiente (Manuel de Andrade). No entanto, deve ter-se em atenção que o legislador foi actualizando a sua interpretação da Lei n.° 1/73, através dos vários debates que se realizaram em torno das propostas de alteração legislativa do regime jurídico do aval (desde 1976 até hoje, incluindo-se, em 1981, um projecto de lei do actual Ministro das Finanças, Sousa Franco, e em 1997 uma proposta de lei do Governo, apresentada também pelo Ministro das Finanças, e que, aliás, deu origem à nova «lei do aval» —Lei n.° 112/97, de 16 de Setembro).

É interessante analisar este último debate em torno da proposta de lei n.°92/VII, originária da actual Lei n.° 112/97, principalmente porque, relativamente à interpretação a dar ao conceito de empresa, trouxe elementos novos e actuais.

Desde logo refira-se que este debate decorreu com plena consciência do problema interpretativo do conceito de empresa constante da Lei n.° 1/73, até porque a presente Comissão de Inquérito é contemporânea desse debate. Além de que a proposta de lei expressamente se propõe alargar o âmbito subjectivo das entidades a quem pode ser concedido o aval. Com efeito, no seu preâmbulo a proposta de lei refere que não se opera «qualquer discriminação baseada única e exclusivamente na natureza jurídica do sujeito beneficiário da garantia financeira pública, por se entender que tal se encontra constitucionalmente vedado pelo princípio da igualdade, que apenas permite discriminações objectivas que encontrem na Constituição fundamento material bastante». No seguimento, a proposta de lei, no seu artigo 6.°, considerava como beneficiário «qualquer sujeito de direito».

Na discussão na generalidade tal questão foi referida por vários oradores, tendo sido assumido pelo Ministro das Finanças, como objectivo da alteração legislativa (Diário da Assembleia da República de 27 de Junho de 1997?. No debate em Comissão o artigo 6.° foi alterado no sentido de limitar os beneficiários às pessoas colectivas nacionais ou comunitárias. Finalmente, no debate final em Plenário {Diário da Assembleia da República de 18 de Jumo te 1997) foi apresentada uma proposta de alteração recuperando a terminologia do Decreto-Lei n.° 43 710 e da Lei n.° 1/73, «entidades públicas ou empresas nacionais», tendo essa proposta sido aprovada sem votos contra, com o aditamento «ou outras empresas que legalmente gozem de igualdade de tratamento». Versão que consta hoje do artigo 6.° da nova Lei n.° 112/97.

A razão de ser deste último aditamento resultou de imperativos comunitários, face ao princípio de não discriminação entre nacionais de Estados membros. Tal decorre da discussão no Plenário de todas as intervenções produzidas.

Resulta do exposto que a nova Lei n.° 112/97 optou çor manter a mesma terminologia das leis anteriores, expressamente rejeitando a redacção da proposta de lei original. O único sentido que tal atitude pode ter é o de considerar prejudicado o novo entendimento proposto pelo Governo, mantendo actual o entendimento tradicional que constava do Decreto-Lei n.° 43 710 e da Lei n.° 1/73, com a única concessão relativamente às exigências do princípio comunitário da não discriminação entre empresas comunitárias, expresso pelo direito de estabelecimento.

Este elemento subjectivo de interpretação, pela sua actualidade, não pode também deixar de ser tido em consideração.