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4 DE NOVEMBRO DE 1997

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ciados» (artigo 4.°). Estes fins legais encontram expressão no artigo 9." dos Estatutos da UGT, onde, nas alíneas m) e r), se encontra o objectivo de defender e promover a formação sindical inicial e contínua e a formação cultural--profissional e político-sindical dos representados pelos sindicatos seus filiados.

A UGT desenvolve, assim, também actividades de formação para os seus associados, ao lado da sua actividade de defesa dos interesses sócio-profissionais dos trabalhadores que representa e de outros serviços prestados aos seus associados. A actividade de formação profissional, não sendo o cerne dos seus objectivos enquanto confederação sindical, é, no entanto, importante, até pelo peso económico espelhado na situação financeira da UGT. Não é, no entanto, o núcleo essencial do seu objecto, razão pela qual a UGT resolveu abandonar a sua actividade de formação a partir de 1996 em consequência dos problemas surgidos com as subvenções comunitárias.

Face a um conceito de empresa próprio dos artigos 85." e seguintes do Tratado CEE, a UGT, enquanto prestadora de serviços com", possível repercussão económica no mercado, seria uma empresa, atento o sentido amplo que aí reveste o conceito. Note-se, porém, que o próprio despacho do Ministro das Finanças que concedeu o aval à UGT (despacho n.° 122/97-XJII), no seu n.° 1.8, refere que a «concessão de garantia do Estado no presente caso não afecta o comércio entre os Estados membros», pelo que também por aqui se vê quão desajustado ao caso seria a aplicação de um conceito próprio e exclusivo do direito da concorrência.

Mas é notório que falta à UGT o requisito de organização de meios que constitui um instrumento de exercício relativamente estável e autónomo de uma actividade de produção para a troca (Coutinho de Abreu), que, como vimos, é o conceito próprio da Lei n.° 1/73.

Pelo que é forçoso concluir que a UGT não se enquadra no conceito de empresa previsto na base i da Lei n.° 1/73.

13 — Importa, agora, verificar se, apesar de a UGT não ser uma empresa para os efeitos da Lei n.° 1/73, não terá de ser a ela equiparada por imperativo decorrente do princípio constitucional da igualdade (artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa).

Tenhamos, porém, desde logo a noção de que o princípio da igualdade num Estado social de direito não tem correspondência com o princípio da igualdade aceite num Estado liberal. O princípio autonomizou-se do seu criador, evoluindo de um conceito formal para um conceito material de igualdade. Não se pode ler o artigo 13.° da Constituição como exigindo um tratamento igual para todos, independentemente da situação específica de cada um dos componentes desse todo. Um conceito hodierno de igualdade permite discriminações, impondo-as mesmo em determinados casos: só deve ser tratado como igual o que é igual, devendo ser tratado diferentemente o que é diferente, impondo-se privilegiar aqueles mais desfavorecidos (discriminação positiva) de forma a se atingir uma real situação de igualdade material.

Lido neste contexto, o princípio da igualdade encontra suporte em variados artigos da Constituição, assumindo-se como conformador de toda a actuação dos poderes públicos, seja nas suas vestes de legislador, administrador ou juiz, bem como da dos particulares nas relações entre si (Canotilho/Moreira).

O princípio da igualdade na sua dimensão negativa, de proibição do arbítrio e de proibição de discriminações, não elimina totalmente a liberdade de conformação legislativa,

pois ao legislador pertence, nos limites constitucionais, «definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente» (Canotilho/Moreira).

Para que haja violação do princípio da igualdade pelo legislador é, por isso, necessário que exista uma diferenciação de tratamento sem qualquer justificação razoável ou critério objectivo relevante, sem adequado suporte material (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 186/90 e 330/93).

Ora, a Lei n.D 1/73 entendeu só autorizar a concessão de garantia do Estado a entidades que possuam" uma determinada organização destinada principal ou predominantemente à prossecução de um empreendimento reconhecido de interesse público, gozando de capacidade e dimensão administrativa e económica para o efeito. Ficarão de fora todas as restantes entidades que também prossigam actividades económicas, mas sem dimensão ou autonomia, nem assumam essa actividade como predominante no seu objecto.

Não é uma discriminação quanto à forma jurídica, pois deve entender-se que a Lei n.° 1/73 abrange hoje muito mais que apenas as sociedades comerciais ou sequer cooperativas, como pressupunham os legisladores de 1973. Na Lei n.° 1/73 estão abrangidas quaisquer formas jurídicas que dêem suporte ao conceito de empresa aí contido, sejam sociedades comerciais ou civis, agrupamentos de empresas, institutos ou fundações empresariais, etc. O determinante não é a forma jurídica, mas sim o grau de organização para o desempenho de uma principal actividade económica. Só essa organização pode oferecer garantias de fiabilidade técnica e económica para levar até ao fim satisfatoriamente um «empreendimento ou projecto de manifesto interesse para a economia nacional», bem como assegurar que o Estado não venha a ser chamado a honrar a garantia dada ou, se tal acontecer, que possa reembolsá-lo pontualmente.

Igualmente, hoje, deve considerar-se que a Lei n.° 1/73 compreende no seu âmbito subjectivo, enquanto beneficiários, quaisquer entidades públicas e não só os «institutos públicos», que, aliás, não abrangem já dogmaticamente as próprias «empresas públicas» (Freitas do Amaral).

Do exposto se retira, claramente, que a Lei n.° 1/73 estabeleceu uma discriminação não arbitrária, com um fundamento objectivo relevante e adequado suporte material (Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 186/90). Chega para se concluir pela não violação do princípio da igualdade, argumento algo esdrúxulo neste contexto.

14 — Importa prestar ainda atenção a um último argumento. Foi afirmado que a Administração concedera anteriormente garantias a entidades equiparáveis 'à UGT pelo que a sua concessão a esta decorreria da necessária conformação da actividade administrativa aos princípios da igualdade e da imparcialidade (artigo 266.°, n.° 2, da CRP).

Não nos cabe antecipar conclusões próprias do segundo relatório desta Comissão, pelo que não sabemos se foram ou não concedidos anteriormente garantias do Estado a entidades equiparáveis à UGT (v., porém, a informação n.° 208/1997, de 5 de Março, da DGT, que afirma que não, reiterada, aliás, pelas declarações da directora-geral do Tesouro na audição à Comissão). No entanto, sempre diremos que se o foram tal poderá constituir violação da Lei n.° 1/73 e não pode haver precedentes juridicamente criadores de direitos ou expectativas construídos com base em actos ilegais [v. o regime dos actos consequentes de actos inválidos — artigo 133.°, n.° 2, do Código do Procedimento Administrativo (CPA)].