O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

regulamentação. Esta não terá como origem apenas do uso do fogo pelas comunidades rurais

como prática coletiva, autorregrada, para a abertura de clareiras, instalação de cultivos e

renovação de pastagem. A necessidade de legislação terá provavelmente surgido quando o

património do Estado (Matas e Coutadas) ou dos Senhorios foi afetado ou esteve em risco,

pela expansão das terras para a sustentação das comunidades rurais. Por conseguinte, em

virtude de medidas cada vez mais restritivas, surgiram situações igualmente mais conflituosas

com as comunidades rurais e as suas práticas ancestrais, o que não é um fenómeno recente.

Para além da legislação, são vários os testemunhos sobre o conflito gerado pelo uso tradicional

do fogo e, também, a sensibilidade de alguns técnicos florestais da primeira metade do século

XX, sobre a necessidade de não se criminalizar este uso e de se estudar e compreender a

motivação que está por detrás da causa dos incêndios rurais.

“Atribui-se aos pastores ou, antes, às sociedades locais de pascigo, o lançamento de

fogos, para criação de pastos para o gado. A destruição do mato é o objectivo de quem

lança o fogo.

Êste sistema é, diz-se também, um uso ou costume das povoações da serra.

Aceito a doutrina como verdadeira, e, contudo, repugna-me a idea de que estes fogos e

desastres da serra sejam devidos às sociedades pastorais.

Há, pois, que estudar as causas morais e utilitárias.”

Tude Martins de Sousa, “Mata do Gerês”; Coimbra 1926

“Em 1825 arderam nada menos de 5.000 hectares de arvoredo do Pinhal de Leiria e o

ofício que o administrador daquela mata recebeu, depois do pavoroso incêndio dizia:

“…e torno a recomendar-lhe toda a modração, e boas maneiras no exercício das funções

do seu cargo a fim de conciliar a afeição dos Povos.”

Os povos que vivem junto da floresta, são enxames que entreteem quási todo o seu

labor em trabalhos variados na mata e que não se devem perturbar porque, uma vez

alterados na sua labuta, lançam o fogo à própria ama que os alimenta.”

António Arala Pinto, “Fogos”

Comunicação apresentada ao I Congresso Nacional de Ciências Agrárias; 1943

No contexto dos conflitos a respeito dos incêndios gerados entre as comunidades rurais e os

serviços de policiamento, Aquilino Ribeiro deixa-nos um testemunho na sua obra “Quando os

lobos uivam”, publicada em 1958, onde se culpam aquelas populações pelo uso criminal do

fogo e por gerarem incêndios:

“Chegou um passageiro que falou do incêndio que lavrava de lés a lés da floresta. Se

lhe não acudissem, era a ruína total duma obra custosa de alguns anos e muito

dinheiro. Mas os Serviços abstiveram-se de pedir socorro às aldeias, supondo-as

conjuradas na malfeitoria.”

A análise que se segue sobre a causalidade dos incêndios rurais tem por base os dados

oficiais constantes no Sistema de Gestão de Informação de Incêndios Rurais (SGIF) que

compreende 456.531 ocorrências que produziram uma área ardida total acumulada de 2,9

milhões de hectares ardidos em 20 anos, entre 1 de janeiro de 2001 e 13 de outubro de 2020.

Com o fim de diferenciar o dito uso tradicional do fogo de outros usos e causas de incêndios

rurais, procedeu-se à agregação de todas as causas que se encontram relacionadas com essa

II SÉRIE-B — NÚMERO 14______________________________________________________________________________________________________

56