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II SÉRIE-E — NÚMERO 17

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comunicações e na correspondência está sujeita a autorização judicial, o que se justifica pelo princípio da

proporcionalidade face à especial danosidade social que implica tal intromissão.

Da redação do artigo 17.º da Lei do Cibercrime parece resultar que não esteve no espírito do legislador

transpor para o correio eletrónico e registos de comunicações de natureza semelhante a distinção, por referência

ao correio tradicional, de correio aberto ou fechado, o que desde logo se colhe do elemento literal previsto neste

preceito legal com a expressão «armazenados» – o que pressupõe que a comunicação já foi recebida/lida e,

consequentemente, armazenada, além de não existirem razões para considerar diminuídas as exigências

garantísticas do correio eletrónico quando aberto/lido relativamente ao correio eletrónico fechado, atenta a

natureza própria destas comunicações.

Noutra perspetiva, podemos dizer que se o artigo 17.º da Lei do Cibercrime tivesse o seu âmbito de aplicação

circunscrito à apreensão de correio eletrónico ainda não conhecido pelo destinatário, ou seja, ao correio

eletrónico que já entrou no servidor do destinatário mas não foi ainda aberto, então a exigência de tutela

jurisdicional para salvaguarda de direitos fundamentais (reserva e intimidade da vida privada) ficaria reduzida

ao mínimo, ficando assim sem proteção o grosso da correspondência eletrónica.

Assim, no nosso entender, não se vislumbram razões para se distinguir entre mensagens lidas e não lidas,

sendo tal irrelevante para efeitos de enquadramento jurídico-constitucional.

Com efeito, pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26 de junho de 2023, considerou-se ser

inquestionável que o artigo 17.º da Lei do Cibercrime não faz qualquer distinção entre as mensagens de correio

eletrónico abertas ou fechadas no momento de exigir a intervenção do juiz de instrução para autorizar ou ordenar

a sua apreensão. A distinção entre mensagens abertas e fechadas é, neste âmbito, em bom rigor, artificial e

falível.

Nesta conformidade, é praticamente pacífico, presentemente, que o regime de intromissão no correio

eletrónico ou similar, para apreensão de mensagens armazenadas em sistema informático, estabelecido no

citado artigo 17.º, terá de exigir a intervenção do juiz de instrução, como juiz das liberdades, independentemente

de as mensagens se encontrarem ou não assinaladas como abertas (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

n.º 10/2023).

Por outro lado, o facto de estar em causa uma CPI constituída ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do

RJIP e de o presente requerimento ter sido apresentado ao abrigo do n.º 4 do artigo 13.º do RJIP em nada

dissipa as dúvidas aqui densificadas. Um entendimento diferente seria um claro entorse no sistema, que

redundaria na permissão de «deixar entrar pela janela» aquilo a que ele «fechou a porta».

É certo que, tratando-se de um requerimento apresentado ao abrigo do disposto no artigo 13.º, n.º 4, do RJIP,

as «informações e documentos» que se julguem úteis à realização do inquérito, solicitadas pelos Deputados

requerentes do inquérito, são de realização obrigatória, não estando a sua efetivação sujeita a deliberação da

comissão. No entanto, suscitam-se dúvidas quanto à possibilidade de inclusão das «comunicações e

telecomunicações privadas» de inquiridos, concretamente o registo e/ou cópia de todas as

comunicações (nomeadamente, cartas, mensagens escritas por meio de telemóvel ou via internet –

WhatsApp, Messenger, Telegram e mensagens de correio eletrónico), no núcleo essencial do direito de

inquérito parlamentar previsto no normativo ínsito no artigo 13.º, n.º 4, do RJIP.

Na verdade, se o artigo 178.º, n.º 5, da CRP atribuísse às CPI todos os poderes de investigação próprios

das autoridades judiciais, estas ficariam inclusive habilitadas, por sua iniciativa, e esgotadas as possibilidades

legalmente previstas de fazer colaborar com ela terceiros recalcitrantes, emitir com carácter auto-executório (i)

mandados de condução sob custódia para assegurar a comparência perante ela de depoentes recalcitrantes,

(ii) mandados de revista, de busca e de apreensão domiciliária dos documentos recusados, ou mesmo (iii)

determinar a intercetação de comunicações e telecomunicações privadas de inquiridos. Tais competências,

como se sabe, cabem na competências dos tribunais penais (Nuno Piçarra, Poderes e limites de atuação das

comissões parlamentares no direito brasileiro e no direito português, in O Direito, GC – Gráfica de Coimbra).

Aqui chegados, afigura-se que o artigo 34.º, n.º 4, da CRP é suscetível de uma interpretação no sentido

de tais ingerências só serem admissíveis em processo penal, e não para outros efeitos. Ainda que assim

não fosse, e não se excluam os meios de comunicação privadas do procedimento de inquérito

parlamentar, permanecem dúvidas se não será necessária coadjuvação do tribunal, no mais estrito

respeito dos princípios da determinabilidade e da proporcionalidade. Assim o explicitou o Acórdão

n.º 195/94 do Tribunal Constitucional, segundo o qual os poderes das comissões têm um limite naqueles