de se encontrarem formas de esta obsessão do controlo do défice não acabar por "matar o doente com a medicação", esta obsessão pelo controlo do défice, dizia, faz com que o Governo seja obrigado a tomar medidas avulso, como fez recentemente, proibindo que, até ao final do ano, seja gasta metade das despesas de investimento (esclareceu agora a Sr.ª Ministra que tal se aplicava apenas ao investimento não co-financiado) e metade das despesas ainda disponíveis em matéria de aquisição de bens e serviços correntes.
Mas a questão não é tão simples como a Sr.ª Ministra acabou de referir, porque o problema não se resume apenas ao facto de, no final do ano, os serviços serem tentados a gastar as verbas das rubricas que ainda estavam por usar. Admito que seja uma prática, mas o problema não é esse.
O problema prende-se com a seguinte situação: devido à subdotação de outras rubricas de despesa corrente, a Sr.ª Ministra sabe que existe uma prática na Administração Pública e, por exemplo, em muitos ministérios (não estou a dizer que ela seja legal do ponto de vista das normas orçamentais) de se ir buscar às despesas de serviços correntes verbas que ainda restam para pagar salários. Esta prática existe, não a podemos ignorar! Aliás, não é por acaso que, durante esta semana, vários directores de serviço e directores-gerais de ministérios estiveram reunidos e afirmaram que se esta medida for adoptada, nos termos em que é colocada, para travar esta prática da Administração Pública, que não foi corrigida anteriormente - portanto, estão em causa medidas avulsas tomadas em cima de outras medidas, sem qualquer correcção estrutural -, criará problemas insuperáveis na Administração Pública.
Portanto, Sr.ª Ministra, nesta matéria, pergunto que medidas estão a ser preparadas para evitar que as decisões agora tomadas não vão traduzir-se em mais problemas, seja ao nível dos próprios investimentos que estão em curso (mesmo não sendo co-financiados), seja ao nível de medidas de completo descontrolo e de desorganização ainda maior dos serviços da Administração Pública, com repercussões nessas práticas que têm sido adoptadas.
Gostaria ainda que a Sr.ª Ministra me confirmasse o seguinte: penso que o Governo, ou a Sr.ª Ministra, não tem a certeza de que esta decisão que acabou de tomar seja suficiente para chegar ao final do ano com um défice de 2,8%, valor a que se propõe chegar - e todas as projecções apontam para que tal não aconteça. Portanto, gostava que a Sr.ª Ministra aqui confirmasse se é ou não verdade que o Ministério das Finanças está a preparar como nova medida de contenção da despesa não pagar o décimo terceiro mês aos trabalhadores da Administração Pública, optando por uma de duas hipóteses: ou fazer esse pagamento em Janeiro ou pagar, no todo ou em parte, em certificados de aforro, em Dezembro.
Gostava que a Sr.ª Ministra fosse clara na resposta à questão que lhe estou a colocar porque, obviamente, isto levanta problemas gravíssimos, designadamente de ordem social, e, se for verdade, é necessário que a Assembleia da República e, em particular, os milhares de trabalhadores afectados também tenham conhecimento desse facto para organizarem as suas vidas.
O que pergunto é se, neste momento, já foram dadas instruções aos serviços para suspender o processamento do 13.º mês enquanto se está a apurar se essa decisão vai ou não ser tomada.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): - É bom que se diga!
O Orador: - A Sr.ª Ministra já respondeu à pergunta formulada pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira quanto às eventuais derrapagens das despesas não efectuadas agora e transferidas para o próximo ano. Em todo o caso, como referi, as projecções feitas revelaram-se irrealistas, e isto tem a ver com 2003, Sr.ª Ministra. Aliás, aquando do debate na generalidade, afirmámos que as projecções de receitas fiscais para 2003, tal como tínhamos afirmado no âmbito do Orçamento rectificativo, eram claramente irrealistas.
As projecções fiscais para 2003 têm de ser feitas em função da execução de Setembro. Ora, pegando na execução de Setembro, a conclusão a que chegamos é que, para se atingirem, em 2003, os valores que a Sr.ª Ministra e o Governo previram no orçamento de arrecadação de IRS, de IRC e de IVA - apenas para falar nestes três impostos mais significativos -, ter-se-ia que dar um salto, em relação à receita de 2003, superior a 8%, o que significa qualquer coisa como 342 milhões de contos (ou cerca de 1700 milhões de euros) de aumento de receitas só no âmbito destes três impostos. Sr.ª Ministra, olhos nos olhos, esta previsão parece-lhe realista?
Uma outra questão tem a ver com as cativações. A Sr.ª Ministra já deu uma explicação técnica para as cativações e descativações. Mas, para além dessa reflexão técnica, há umas reflexões mais simples que são feitas pelos Srs. Ministros que passam por aqui, em sede de especialidade. E tanto o Sr. Ministro das Obras Públicas como o Sr. Ministro da Defesa Nacional consideraram que contam com as cativações para gerirem os respectivos Ministérios, ou melhor, contam com as cativações descativadas! Contam com o dinheiro das cativações para gerirem o seu Ministério durante o ano.
Aliás, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, questionado sobre qual o real valor do orçamento que lhe foi atribuído, foi muito claro na resposta, ao dizer: "O que os Srs. Deputados vão votar é o mapa das despesas e, nesse mapa, estão lá previstas as verbas descativadas, isto é, a totalidade das verbas. Portanto, é com essas que contamos para fazer a gestão do Ministério".
Sr.ª Ministra, voltamos ao mesmo: temos um orçamento virtual, "para Bruxelas ver", e um orçamento real, que os Deputados vão aprovar, e este aponta para um défice - não tenho qualquer problema com o défice, mas quero transparência no orçamento - de 3%, ou até, face aos ajustamentos das contas da segurança social, de 3,1%.
Portanto, em que é que ficamos, Sr.ª Ministra? As cativações são para valer? Ou o que é para valer são as declarações aqui proferidas pelos Srs. Ministros? Como é que vamos gerir o processo neste quadro?
Quanto à questão do sigilo bancário, já foram anunciadas por alguns partidos propostas para o levantamento das informações protegidas pelo sigilo bancário.
Neste momento, Sr.ª Ministra, quero dizer-lhe que estamos satisfeitos com o que está estatuído na lei; não somos tão radicais como o Partido Socialista, que, agora, na oposição, quer ver levantado o sigilo bancário. Repito, estamos satisfeitos com a Lei n.º 30-G/2000, na qual já foram introduzidos quatro ou cinco requisitos que permitem o levantamento das informações protegidas pelo sigilo bancário em determinadas condições, e essas condições ainda não foram anuladas, como sucedeu na questão das mais-valias.