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7 DE JULHO DE 1988 657

mas um sistema modesto nas suas dimensões, realmente emaranhado - temos de pensar de quem é a responsabilidade! Depois, fazendo perguntas muito directas e específicas - não perderia nada, apesar de tudo, em endereçar algumas ao Sr. Deputado Carlos Encarnação -, verá coisas como estas, que são sentidas na carne pelos cidadãos.

Primeiro, que as prestações, enquanto tais, designadamente as pensões e o abono de família, são, a todos os títulos, insuficientes. Qualquer um reconhecerá que estão abaixo do mínimo de subsistência e qualquer pessoa, fazendo contas, verá que o valor mínimo do regime geral é inferior em poder de compra em mais de 29% ao valor de 1974, isto é, foram dados passos atrás em termos materiais, em termos reais, a esse nível.

Também se sabe que o método do cálculo das pensões oferece porventura alguma vantagem para quem queira reter fluxos financeiros, mas não para os cidadãos que deveriam beneficiar deles. As pensões estão, por isso, fortemente degradadas, sobretudo em certos sectores profissionais (ferroviários, por exemplo).

Os financiamentos de modestas prestações que dependem da solidariedade do Estado, portanto da solidariedade nacional como tal, e que são da sua responsabilidade - refiro-me, entre outras coisas, aos encargos com os regimes não contributivos ou aos casos de reduzida contribuição e às despesas com a chamada "acção social" pelo regime geral - conduzem apesar dessa modéstia, a défices que entre 1973 e 1988, como os Srs. Deputados sabem, rondaram qualquer coisa como 692 milhões de contos, pura e simplesmente. Sabe-se também que as transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da Segurança Social são insuficientes para cobrir os défices. Temos vindo, ano a ano, nas execuções do Orçamento do Estado, a discutir e a apreciar esta matéria e entre 1973 e 1988 essas transferências somaram apenas 191 milhões de contos, o que manifestamente não chega.

Sabemos também que as recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da própria lei em vigor sobre as pensões mínimas não estão a ser cumpridas -a actual pensão mínima do regime geral, como sabem, é inferior a 50% do salário mínimo, enquanto a OIT aponta para valores correspondentes a 55 % do salário mínimo - e que o número de subempregados que recebem o subsídio de desemprego é francamente uma proporção ínfima do número de desempregados real - calcula-se que a taxa de cobertura seja inferior a 20%, neste momento, para já não falar nas situações de subemprego e outras que também deveriam ser computadas para termos uma imagem real. Sabe-se, igualmente, que os períodos de garantia são extremamente elevados, certamente para dissuadir e impedir que o apport financeiro do sistema unificado seja atempadamente prestado.

Por outro lado, ainda, se olharmos o panorama em matéria de acidentes de trabalho, desgarrar-se-á uma imagem de desproteção que é perfeitamente chocante.

Se pensarmos em que, quanto ao financiamento, há desde há anos situações críticas quanto à fuga às contribuições, quanto à sua utilização quase a título creditício, com problemas de gestão por inépcia, por desvio de verbas, por afectação de verbas segundo critérios que ninguém percebe, com marginalização das estruturas representativas dos trabalhadores do sistema de gestão e de decisão efectiva da Segurança Social, com a utilização das verbas para finalidades cujo mérito social é, pelo menos, discutível (e que tem sido efectivamente criticado e publicamente discutido), e se, finalmente, tivermos em atenção que o sistema de financiamento da Segurança Social tal qual está hoje erigido é manifestamente desajustado às modificações que se verificaram na realidade económica, designadamente às estruturas das empresas, uma vez que, como todos reconhecem, o sistema actualmente penaliza as empresas de trabalho intensivo e favorece as de capital intensivo (e, portanto, estimula o despedimento e o trabalho precário e acaba por deixar sem contribuição útil as empresas que se constituem com um número diminuto de trabalhadores, usando das vantagens da concentração do capital e da redução da mão-de-obra e da utilização capital-intensiva de factores de produção), então veremos bem como a situação criada é da mais extrema gravidade.

Chamar a isto "Estado-providência" ou dizer, como o Sr. Deputado Carlos Encarnação, que há uma "crise do Estado do bem-estar" e que, portanto, a solução é privatizar, é grave. Significaria substituir o actual sistema por um sistema de "abertura da porta", como disse, a instituições lucrativas que fornecem "complementos apetecíveis", como também disse, o que acarreta deixar os "complementos apetecíveis" para quem os puder pagar! Substituiríamos, então, o princípio constitucional -e nesse sentido registei como significativas as declarações do Sr. Deputado Almeida Santos quanto à manutenção da substância ou entidade do sistema- por um princípio de "quem quer segurança social paga-a!". Quem quer segurança social apetecível há-de poder pagá-la significa, evidentemente, uma inversão do sentido da Constituição neste ponto. Foi isso que o Sr. Deputado Carlos Encarnação não justificou e devo lamentar que, aliás, não tenha usado de toda a adequada transparência nesta matéria. Digo-o porque são conhecidos os planos, são conhecidas as declarações do Govêrno nesta matéria.

Sr. Presidente, solicitava, consoante o combinado, que interrompêssemos a reunião porque é agora que no Plenário da Assembleia da República ocorrerá, a produção de declarações de voto sobre o falecimento do meu camarada Francisco Miguel. Creio que isso não demorará mais de quinze ou vinte minutos e propunha, Sr. Presidente, que retomássemos depois os nossos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Certamente que faremos isso, mas gostaria de saber se V. Exa. já acabou a sua intervenção.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente, porque creio que seria útil especificar a observação ou a crítica de não transparência.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Estou perfeitamente de acordo.

O Sr. Presidente: - Eu também. Vamos então interromper, e recomeçaremos às 11 horas e 45 minutos. Srs. Deputados, está suspensa a reunião.

Eram 11 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 12 horas e 20 minutos.