O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

866 II SÉRIE - NÚMERO 29-RC

O Sr. José Magalhães (PCP): - O que, de resto, não teve nenhum inconveniente porque o Sr. Deputado Jorge Lacão adiantou algumas considerações. No entanto, creio ser sensato remeter os aprofundamentos para uma ocasião ulterior, porque me parece que existe da parte do PSD e, concretamente, da parte do Sr. Deputado Rui Machete, uma certa hipersimplificação da questão que, como esta manhã dizia a propósito de outra matéria, compadece-se pouco com as simplificações. Por uma razão simples: parece-me que é, pelo menos, uma facilidade de argumentação menos razoável afirmar-se que o sistema português "será aceitável" ou "poderá até ser reconvertido", que "poderá até perceber-se que no nosso direito interno se consagrem certas regras permitindo monopólios públicos", "desde que não sejam estes monopólios públicos" ou estas vedações ou estas reservas "fundadas em motivos ideológicos". Estas não, outras sim. Seria estabelecer uma distinção muito especiosa.

O direito comunitário é um gigante tentacular e muito vasto, que penetra em muitos sectores e em muitas dimensões, que tem instrumentos de efectivação, que tem as virtualidades e o vigor que se conhece - e a falta dele também em muitos campos. Em todo o caso, não vale a pena estar a pôr nas obrigações comunitárias aquilo que lá não está para escamotear o que é produto da vontade interna, ou gula interna, ou óculos ideológicos internos do PSD... Não concebo que um qualquer comissário comunitário desembarque em Lisboa com uma maleta, uma ampulheta, um farol, e já agora com uma lupa também, para passar a Constituição a pente fino, dizendo: "Não, não! Este artigo 85.°, n.° 3, tresanda a ideologia. Se isto fosse um monopoliozinho público, baseado em razões sanitárias, de defesa, ou outras, talvez passasse. Mas isto cheira claramente a revolução, isto cheira claramente a 11 de Março. Isto não!" Posto isto, o comissário aplicava-nos um diktat ideológico e chumbava-nos a Constituição. É inconcebível, Sr. Deputado Rui Machete! Não pode passar-se a título nenhum.

O Sr. Presidente: - A sua caricatura é evidentemente engraçada, aliás como alguma parte dos seus comentários e, a este propósito, todos eles. Mas o problema não é esse. Em primeiro lugar, não seria o comissário, mas sim o órgão jurisdicional, que é quem justamente aprecia a compatibilidade das normas com o Tratado de Roma. É esse o problema importante.

Em segundo lugar, é óbvio, Sr. Deputado José Magalhães, que, se forem promulgadas nos Estados membros normas que, sem outra justificação, tenham em vista acabar com a concorrência, com o livre estabelecimento, com o mercado, elas serão contrárias ao Tratado de Roma. Ou V. Exa. tem dúvidas a esse respeito? Foi isso que eu disse.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é evidente que, se entrasse um elefante nesta sala, nós teríamos de sair das cadeiras. Mas é uma hipótese que podemos configurar por divertimento comum e não uma hipótese razoável...

O Sr. Presidente: - Foi a hipótese de 11 de Março, e 11 de Março foi um elefante a entrar...

O Sr. José Magalhães (PCP): - V. Exa. configurou mais do que um elefante, configurou um novo bicho mitológico: o inexistente elefante unicórnico!

O Sr. Presidente: - Que o 11 de Março seja unicórnico, isso não sei. Isso é uma opinião sua...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu não concebo a hipótese que o Sr. Presidente acabou de figurar, na medida em que, se essa hipótese porventura existira, já houvera sido accionada junto das entidades comunitárias. E não. o foi, nem por sombras!

Por outro lado, e acima de tudo, é impossível jogar com vestes diferentes no mesmo tabuleiro. Pelo menos mudem de veste! Isto é, Srs. Deputados do PSD, não podem simultaneamente jogar nas vestes de uma interpretação da Constituição em relação ao artigo 85.°, n.° 3, que conduziu, por exemplo, à viabilização das alterações introduzidas no distante ano de 1983 (que assentam numa desvalorização da perceptividade do preceito, até numa determinada interpretação do princípio democrático do sentido de organização económica e do alcance da primeira revisão constitucional, no fundo, querendo até cumular com a revisão constitucional de 1982 uma revisão por via jurisprudencial), e pretenderem que aquilo que a Constituição estabelece aqui é um monstro inaceitável face à ordem jurídico-comunitária. Na verdade, não se vê que haja ofensa às obrigações comunitárias se for assegurada uma não discriminação de iniciativas, sem prejuízo da existência fundamentada de reservas a favor de entidades públicas. Esta é que é a questão. É isto que é preciso investigar e não um qualquer pesadelo monstruoso sobre a magma comunitário.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, a nossa proposta não se baseou em preocupações comunitárias. De resto, isso foi dito muito claramente...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Ah, bom! Eu gostava de acentuar esse aspecto...

O Sr. Presidente: - Foi muito claramente dito pelo Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva, o que eu corroboro e reitero. No entanto, perante a eventualidade suscitada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, e, tentando corresponder, expressei a minha opinião.

Existe, porém, outro ponto que gostaria de referir. É que depois de 1983 deu-se a adesão, e a adesão mudou algumas coisas...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas quais, Sr. Presidente? A questão é essa. Tem V. Exa. conhecimento de alguém se ter colocado a necessidade de ir, a "toque de caixa", às instâncias comunitárias gritar: "Aqui d'el-rei, que em Portugal, Estado membro, são ofendidas as obrigações do Tratado de Roma! Que é isto? Há restrições ao acesso às seguintes indústrias" - segue-se a descrição de todas as que constam da proposta do Governo. Isto não aconteceu, nem pode acontecer, porque seria ridículo!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, V. Exa. sabe tão bem como eu que esses problemas não surgem nem no Conselho das Comunidades nem na Comissão, mas sim quando, a propósito de casos