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1178 II SÉRIE - NÚMERO 38-RC

O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu sei, Sr. Presidente.

Ora bem, não está referida na proposta do PSD a expressão "para sempre", mas também não está que não o é. Consequentemente, o legislador ordinário - e com isso me preocupo unicamente - ficaria com uma inaceitável margem de liberdade conformadora, liberdade essa que pode ir tão longe que transforme em "tumbas vivas" aqueles que abandonarem as cadeiras governamentais, o que me parece uma péssima ideia e, em todo o caso, uma amálgama inaceitável.

O Sr. Primeiro-Ministro teve ocasião de fundamentar publicamente esta como uma das mais importantes propostas do PSD, coisa que acho realmente curiosa porque dá resposta a uma das enormes dificuldades que, dentro do sistema galáctico de poder PSD, existe: por um lado, a concepção de que a verdade reside no Primeiro-Ministro e, por outro lado, a ideia de que a discordância de quem tenha estado perto dele - quiçá no Conselho de Ministros - deve ser íntima e ocorrer nas alfombras do próprio Conselho de Ministros ou em qualquer outra sede reservada, devendo as bocas que se abrirem em reservado calar-se, publicamente, para todo o sempre.

Será uma ideia interessante para o PSD, mas tem pouco a ver com o funcionamento do nosso sistema democrático e com a ideia que deve presidir à regulamentação do segredo de Estado. Sucede, em primeiro lugar, que o segredo de Estado pode ter de ceder perante determinados valores igualmente relevantes. Em segundo lugar, devo lembrar que a nossa legislação actual, designadamente a processual penal, a legislação sobre inquéritos parlamentares e a legislação sobre segurança interna e serviço de informação, arvoram o Primeiro-Ministro em dono do segredo de Estado.

Já tivemos ocasião, designadamente em determinados inquéritos parlamentares (que não trarei aqui à colação em detalhe, mas apenas em alusão genérica) de verificar ao que isto pode conduzir. Pode conduzir a verdadeiros "nós-cegos", em que o chefe da pirâmide hierárquica governamental fique, não apenas chefe daquilo que chefia, mas "chefe da verdade", isto é, da realidade e dos factos e chefe dos negócios do Estado. E não chefe no momento, mas chefe eterno: porque segundo o regime agora proposto e já, de algum modo, constante por exemplo das leis sobre serviços de informações o segredo que num determinado momento se verifique é segredo que pode ser domesticado e mantido, até que as bocas se calem pela aplicação das leis da vida.

Ora, esta é, naturalmente, a pior das noções possíveis e é também - tenho consciência disso - a mais extrema das interpretações possíveis do preceito do PSD. Só que o preceito comporta essa interpretação e capricha em não se bastar com o sigilo, adjectivando-o e dizendo que os titulares de todos os cargos políticos, ou seja, o mais humilde presidente de câmara e o mais humilde membro de um órgão de uma autarquia local, ficam vinculados a guardar "rigoroso" (e não menos do que rigoroso - não pode ser ligeiro, nem leve, nem apenas sigilo tout court sigilo sobre as matérias de que tenham conhecimento em razão das suas funções (e não esqueci a copulativa pois é fundamental) e que se encontrem abrangidas pelo regime do segredo de Estado.

E quem é dominus do segredo de Estado? É a maioria parlamentar. É isso objecto de qualquer restrição? Resposta: não é, no projecto do PSD, que, horrendamente se comporta perante qualquer ideia de tocar - como a Sra. Deputada Assunção Esteves, de resto fluentemente, há pouco teorizava - aquilo que são os contornos do princípio maioritário, "que é, por excelência, o princípio fundamental do nosso sistema", na leitura que dele faz o PSD.

Isto quer dizer, Sr. Presidente, que aquilo que este preceito viabiliza é da maior gravidade, sobretudo porque o n.° 5 também fala que se farta - embora estejamos a falar de segredo - dizendo o segredo "mantém-se mesmo após a cessação de funções nos termos da lei".

O Sr. Costa Andrade (PSD): - "Após a cessação de funções" - vírgula - "nos termos da lei"!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, não está lá a vírgula, Sr. Deputado. Não está lá vírgula nenhuma. O que está lá é: "após a cessação de funções nos termos na lei"

O Sr. Costa Andrade (PSD): - É um erro de dactilografia.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Então, a culpa é da dactilógrafa do PSD - a famosa dactilógrafa que distorceu o melhor do projecto do Sr. Deputado Rui Machete!

Risos.

O Sr. Presidente: - V. Exa. terminou?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Portanto, Sr. Presidente, creio que esta norma é, no projecto do PSD, não apenas uma das que enforma uma concepção que nos parece extremamente insubscritível do que deva ser a forma de exercício (e, sobretudo, de cessação) de funções dos titulares de cargos políticos, como perigosa, até pelo facto de não ser explícita na sua fundamentação.

Que pode existir segredo de Estado todos sabemos. Discutimos, de resto, com uma certa profundidade, na Comissão de Defesa, não há muito tempo, um projecto do CDS que visa, precisamente, regular, em sede de lei ordinária, alguns dos aspectos relacionados com esta matéria, tendo sido apreciado na mesma altura o projecto do PCP sobre "administração aberta". Nessa altura pudemos fazer uma inventariação bastante vasta do conjunto de problemas que se desdobram nestas vertentes todas - e muitas são. Esta norma, porém, tal qual vem redigida, não tem nada disso em consideração, a não ser a ideia da "rolha eterna", que é, de resto, o bom nome para a proposta do PSD.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Sr. Presidente: - V. Exa. quer fazer um pedido de suspensão? Faça favor. É uma condição suspensiva que espero seja, simultaneamente, resolutiva.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado José Magalhães se