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17 DE OUTUBRO DE 1988 1385

O Sr. José Magalhães (PCP): - Pois não, e aliás nota-se que não a leu. A Constituição espanhola, no seu artigo 87.°, n.° 3, diz (linguagem "horrenda"): "[...] a lei orgânica [veja, Sr. Deputado José Luís Ramos, o horror!] regulará as formas de exercício e requisitos da iniciativa popular."

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - O Sr. Deputado deve falar nas cousas como eu as referi.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Já lá vou, Sr. Deputado, mas esse é um aspecto minudente. A questão da coerência interna é fácil de resolver. Resolvam VV. Exas. as questões da iniciativa popular, que a questão da coerência interna resolvemos nós. Já lhe explico em que é que assenta esta proposta...

O Sr. Presidente: - Sem diálogo directo, por favor.

O Sr. José Magalhães (PCP): - "Uma lei orgânica" - diz a Constituição espanhola - "regulará as formas de exercício e requisitos da iniciativa popular para a apresentação de propostas de lei." Serão exigidas para o efeito não menos de 500 000 assinaturas certificadas. Não é admissível iniciativa popular em matéria de leis orgânicas, tributárias ou de carácter internacional, nem no que diga respeito à prerrogativa de perdão. Eis o que dispõe a norma que citei.

Ora bem, Sr. Deputado José Luís Ramos, parece-lhe chocante o mesmo instituto desde que, por acaso, passe a fronteira de Vilar Formoso? Devo dizer que não percebo porquê. E não percebi porque V. Exa. se limitou a dizer que o PSD não concordava "em termos de fundo" e, tendo dito isto, não adiantou nenhuma razão para não concordar "em termos de fundo". Podia ter adiantado algumas (não lhe vou sugerir nenhuma, dado não ser esse o papel que me cabe), mas, em vez disso, correu rapidamente para um argumento de coerência interna: "Os senhores, que odeiam remissões legislativas, agora põem-se a fazê-las." Se V. Exa. tiver o cuidado de folhear o projecto de revisão constitucional do PCP, encontrará nesse projecto muitas remissões para a lei.

O que ocorre é que nós não optamos pela desconstitucionalização com reenvio legislativo, como faz sistematicamente o PS. Nós pronunciámo-nos aqui, sistematicamente também, contra a técnica de descarga com reenvio legislativo, não nos pronunciámos contra a técnica de carga com reenvio legislativo. V. Exa. verá, com a argúcia que não deixará de lhe ser algo peculiar nos bons momentos, que neste caso se trata precisamente de um fenómeno de carga com reenvio. A Constituição, que tem o grau zero de conteúdo nesta matéria, passa a ter o grau x de conteúdo, cabendo a densificação, o desenvolvimento e a explicitação à lei ordinária. Qualquer comparação entre isto e aquilo que motiva a nossa atitude de rejeição coerente da descarga com reenvio legislativo é, pura e simplesmente, distracção.

Por outro lado, Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de dizer que as observações do Sr. Deputado António Vitorino me sensibilizam, na medida em que consegue estabelecer uma diferença entre uma petição e a iniciativa legislativa popular - o que, a todas as luzes, se deve ter como correcto, pois uma petição é deveras uma petição e a iniciativa legislativa popular é mesmo a iniciativa legislativa popular. Excelente! É também óbvio que através de uma petição podem ser prosseguidos, em parte, objectivos de iniciativa legislativa popular. Exemplo: a população de Vizela, desejando a restauração do seu concelho, apresenta à Assembleia da República uma petição, na qual pede a criação do concelho de Vizela. No cenário ou no esquema de iniciativa legislativa popular, a população de Vizela, mediante subscrição de um número determinado de assinaturas (repare-se que no caso espanhol são 500 000, no caso português não adiantámos nenhum número prima fade), teria de mobilizar x mil assinaturas a apresentar à Assembleia da República um projecto de lei que, em nosso entender, deveria ter algumas garantias de efectiva tramitação. Recordo, aliás, que no direito espanhol há, inclusivamente, recurso de amparo contra a não admissão indébita ou infundamentada de iniciativas legislativas populares (de resto, em torno desses casos de recurso de amparo se têm travado alguns importantes debates com razoável impacte político mas com o seu significado próprio em termos de direito constitucional). Quer isto dizer que existem diferenças e semelhanças e que a opção por um ou outro esquema não se deveria fazer em termos dicotómicos: petição ou iniciativa popular? Não, petição e iniciativa popular!

Recordo que, além da proposta do PS que o Sr. Deputado António Vitorino enunciou, existe uma proposta do PCP no artigo 52.°, n.° 3, que reza precisamente que "a lei fixa os casos em que as petições colectivas dirigidas à Assembleia da República devam ser apreciadas pelo Plenário". Partilhamos, portanto, a mesma preocupação em relação à apreciação pelo Plenário da Assembleia da República de petições colectivas. No entanto, parece-nos que há espaço para duas realidades e não apenas para uma. Compreendo que a realidade "petição" pode vir a consignar algumas das características que, saudavelmente, se projectam na nossa ideia de iniciativa legislativa popular. Só que deficientemente, só que parcelarmente. Aliás, sensibilizados por milhares de assinaturas, vários deputados, ou até um deputado, podem sempre vir a apresentar um projecto de lei que obrigue, na sede própria e com vista à criação de uma lei, à apreciação de uma pretensão justa das populações.

A nossa proposta visa uma abertura relativa do sistema, a efectuar sem prejuízo das dinâmicas normais dos poderes do Governo, do poder de autodeterminação do Parlamento, da sua própria autonomia, que em nada é ferida por uma proposta deste tipo, bem como dos poderes regulamentares. Creio que talvez fosse tempo de deixarmos de fazer uma chaveta em que se põe, de um lado, a democracia representativa (fechada) e, de outro lado, a iniciativa legislativa popular (exilada). Talvez fosse tempo de terminar com esse exílio e de fazer um enxerto de um instituto no outro, enxerto esse que o legislador ordinário determinará que grau e que fórmula deverá assumir e de que cautelas deverá ser rodeado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de salientar que o Sr. Depu-