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29 DE NOVEMBRO DE 1988 1877

isto creio que é indesejável. É, de resto, essa a dificuldade principal do discurso dos Srs. Deputados signatários do projecto n.° 10/V. É que se quisessem inculcar apenas aquilo que dizem, aquilo que dizem seria compreensível, só que incorrecto, seria bem intencionado, só que não exacto. Infelizmente, penetra nas linhas desse discurso uma outra insinuação, ou um outro conteúdo possível, que, pela nossa parte, rejeitamos.

Quanto às implicações da proposta, gostaria de, muito rapidamente, dizer o seguinte: é diferente uma proposta que diga o "Estado unitário regional" e uma proposta que diga o "Estado unitário e regional". Este é o primeiro aspecto (que foi também salientado pelo Sr. Deputado António Vitorino). Este aspecto é importante para que não se misture, designadamente, a autoridade externa de uma pessoa que, seguramente, é merecedora do nosso respeito, o Prof. Jorge Miranda, e argumentações e propostas que não são rigorosamente aquelas que, num determinado momento, enquanto membro de uma determinada força política, o Prof. Jorge Miranda sustentou!

Por outro lado, é essencial que não se inculque que a proposta que é apresentada não tem certas implicações que poderia ter ou, até mesmo, que tem um rigor de que é desprovida. Primeiro: pode-se inculcar com a proposta, tal qual está formulada, que a regionalização política seria um princípio geral da organização do Estado de direito democrático português - sucede que não é, não é um princípio geral. E isto não é susceptível de refutação. Na prática portuguesa tem-se vindo a verificar que estamos a funcionar um pouco como se Portugal fosse um conjunto de três regiões autónomas: os Açores, a Madeira e o continente. De certa forma, o facto de se estar, durante demasiado tempo, a não acatar sequer o princípio que impõe a regionalização (administrativa, claro) do continente contribui para a criação de uma estrutura tripolar que não corresponde ao modelo constitucional da estrutura vertical do poder político e que funciona como uma verdadeira deformação tendente a avantajar aquilo que deveria ter outra proporção constitucional e, simultaneamente, a dar ao continente (assim reduzido a uma dimensão quase metropolitana, indesejável) o papel de um vértice de um triângulo que poderá ser interessante em termos de paixão geoestratégica, mas que seguramente não é interessante em termos de conformação de um Estado unitário. E creio que este problema é bastante sério, até em termos de reflexão sobre os contornos e os desígnios da unidade nacional num contexto europeu, isto é, de Portugal como Estado unitário pertencente às Comunidades, e que é susceptível de desenvolver relações multilaterais difíceis de enquadrar na própria lógica do Estado democrático, se em certos movimentos (designadamente a Europa das regiões, as relações directas Bruxelas/regiões periféricas da Europa/regiões insulares da Europa, etc.) não acautelarmos suficientemente este aspecto basilar que é a nossa estrutura geográfica, este facto inteiramente acidental, que política e historicamente superámos, de, tendo o território espalhado por vários pontos do Atlântico, sermos, todavia, uma só Pátria. E creio que isto se perde um pouco quando se procura inculcar que Portugal seja um Estado regional. Os factos, a geografia e a historia são excessivamente cruéis nesta matéria: parcialmente regionalizados somos. E, tendo as regiões autónomas a importância que têm no contexto da nossa

organização estadual, são uma realidade parcial. Creio que disto é extremamente difícil sair. Chamar então ao Estado Português um "Estado unitário com uma componente regional" é bom para a doutrina, é correcto doutrinariamente, não é desejável constitucionalmente. Componente regional é óbvio que há, é o que é o Estado democrático português: um Estado unitário com uma componente regional.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Isso já está no n.° 2!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto. Porquê dizê-lo, então, dessa forma? A componente regional é objecto de uma alusão específica no n.° 2. Alusão essa que é bastante e suficiente para inculcar que a autonomia regional é um princípio constitucional respeitável, princípio que, todavia, não é senão uma qualificação - não poderia entrar em contradição, é óbvio, com o princípio constitucional geral da unidade. Portanto, creio, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que, fora das paixões e do erguer de estandartes que podem ser vantajosos para procurar menorizar as questões que verdadeiramente atinjem duramente as populações que vivem nas regiões autónomas, não tem sentido prolongar ou fazer uma polémica sobre este ponto.

Vozes.

O Sr. Presidente: - Sim, mas antes está inscrito o Sr. Deputado Pedro Roseta.

Vozes.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não. Queria fazer uma intervenção exclusivamente a título pessoal, mas gostaria de ficar para o fim. Se o Sr. Deputado Almeida Santos quiser...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não tive o privilégio de ouvir tudo o que disse o Sr. Deputado António Vitorino. Sei que ele diz sempre o que é necessário e da melhor maneira. Mas esta expressão "unitário regional" "faz-me cócegas", mesmo do ponto de vista semântico, porque parece que o Estado é, ele próprio, uma região, porque senão teríamos de dizer regional no sentido de "regionalizado". E aí falta a terceira região que o continente não é (ou a quarta ou quinta, quando um dia pensássemos em dividir o País em regiões). Quer dizer, o facto de o País ter duas regiões torna-o a ele como Estado que não é "nacional", mas que é "regional"? Não, um Estado não é regional em si. É, em parte, regionalizado, mas não é todo ele regionalizado. Razão por que isso é confuso e não vejo que acrescente nada à glória de as actuais regiões serem elas próprias a parte que qualifica o todo. Bem sei que nalgumas Constituições, na Italiana, salvo erro, se fala em Estado regional, mas acho o qualificativo desajustado. Se me dissessem "um Estado regionalizado", muito bem. Ora, o nosso Estado tem por base uma nação, felizmente, das mais unitárias que se conhecem, quer na língua, quer nos costumes, quer na história. E creio que destruir esta imagem de um Estado que é um todo, mas que tem partes autónomas (que está, no n.° 2, dito de maneira bem enfática e bem clara), não acrescentava nada à glória das regiões e geravam algumas confusões ao nível da definição do próprio Estado.