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15 DE MAIO DE 1989 2915

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, quando se suscitou a questão da votação das alíneas que agora estão em debate do artigo 80.°, tive ocasião de alertar para o facto de que considerava imprescindível que a matéria fosse objecto de uma consideração mais aprofundada, com vista a ter em conta as observações que entretanto nos foram transmitidas por entidades que ouvimos, de acordo com o nosso Regimento.

Na verdade, em diversos pedidos de audiência e depois, através de memorandos e ofícios, designadamente o apresentado, oportunamente, pela Confederação Cooperativa Portuguesa, fomos alertados para que, no entendimento destes representantes do movimento cooperativo, seria e, muito importante, que, por um lado, "fosse mantida na Constituição a existência de três sectores de propriedade dos meios de produção dos solos e dos recursos naturais"; por outro lado, "a obrigatoriedade de o Estado, tendo em conta a especificidade do sector cooperativo, estimular e apoiar a criação e actividade das cooperativas e definir benefícios fiscais e financeiros e condições mais favoráveis à obtenção de crédito e auxílio técnico pelas cooperativas". E, por outro lado, ainda "uma vez que se verifica a abertura de certos sectores da actividade à iniciativa privada", (que se encontram vedados às cooperativas) entendem estes cidadãos que, "deveria ser incluída na Constituição uma norma impedindo que os sectores de actividade, não exclusivos do sector público, possam ser vedados ao sector cooperativo".

São estas, entre outras reclamações, aquelas que nos foram transmitidas por entidades do sector cooperativo.

Sucede também, Sr. Presidente, que o debate da primeira leitura sobre as propostas apresentadas atinentes a este problema, não equacionou nem deu resposta, na medida que nos parece desejável, a algumas das interrogações que nos são trazidas, não só pelos membros do movimento cooperativo, como por alguns especialistas na análise do sector cooperativo e compartes dos baldios.

Por exemplo, o Doutor Rui Namorado, em artigo publicado não há excessivo tempo, no Boletim do Centro de Estudos Cooperativos da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, sob o título "O Sector Cooperativo e a Revisão Constitucional", além de muitas outras considerações, sublinha a dada altura, que lhe parece "um retrocesso simbólico, gravoso, para o lugar do cooperativismo na ordem jurídica portuguesa, deixar cair a expressão - sector cooperativo - para, em seu lugar, colocar a de sector social". Retrocesso tanto mais injustificável, quando a mudança terminológica tinha como causa um acrescento ao actual sector cooperativo, de dois subsectores do sector público, não só "globalmente pouco relevantes no presente" (expressão do autor), "como, não envolvidos em qualquer novo impulso jurídico-constitucional nos projectos de revisão existentes".

"Seria (diz o Dr. Rui Namorado) como retirar uma parte dos alicerces a um edifício ainda inacabado, sem a afectar a qualquer outra construção." E concluía, "pode ser uma estratégia fecunda criar pontes entre o sector cooperativo e outras práticas sociais institucionalizadas, animadas por lógicas e objectivos afins, porventura dando ao sector cooperativo a função de eixo, numa constelação aberta a novas formas de intervenção social. Mas, diluir a realidade do que é cooperativo nas virtualidades de uma nebulosa do que se queira

designar como social, é não só perturbar o que existe, como obstar ao que se vislumbra como possível. Nada, fora do movimento cooperativo, ficaria em melhor posição do que está; contudo, o sector cooperativo seria gravemente atingido".

"É claro que há uma outra diferença estrutural relevante entre os projectos do PSD e do PS (acrescenta o mesmo autor), já que para aquele, o subsector comunitário pertence ao sector público, enquanto o PS o inclui no sector social. Se esta designação não for adoptada e se se continuar a fazer referência ao sector cooperativo, não será essa circunstância que torna mais defensável a proposta dos socialistas. Num caso, como noutro, não me parece a mais convincente."

O autor analisa, seguidamente, as diferenças entre as cooperativas e as empresas em autogestão, fazendo o mesmo em relação ao subsector público comunitário.

Sr. Presidente, o que quer que se pense sobre a consequência da alteração, que está indiciada, do artigo 90.°, cujos n.ºs 1 e 2 serão, como tudo indica, suprimidos, sem prejuízo de se considerar esse aspecto, seria importante que o PS pudesse precisar os fundamentos e as consequências do texto que agora apresenta e, designadamente, explicitar as razões que levam a incluir no sector social aquilo que são actualmente subsectores do sector público (incluindo também o subsector comunitário).

Sabendo nós do debate que há neste momento, designadamente face às perspectivas do Mercado Único Europeu, mas que já se desenrola desde há muitos anos, sobre o conceito, o sentido e os limites da noção de economia social, como expressão de um projecto congregado de movimentos sociais bastante diferenciados, seria igualmente útil que o PS fundamentasse as razões da sua proposta de adopção constitucional desse conceito, que parece dar um relevo central à noção da economia social e do sector social em prejuízo da centralidade da ideia cooperativa.

Sabemos que, tanto o movimento cooperativo, como o movimento mutualista, como os movimentos de gestão pelos trabalhadores de patrimónios de natureza muito diversa, são, sem dúvida, uma constelação muito complexa de fenómenos, reflectindo uma grande diversidade de experiências, dotadas de sentido muito diferente consoante as visões sociais do mundo e da economia que cada força política tem.

Não se deve ignorar que a adopção jurídica do conceito de economia social, se não for acompanhado de um adequado enraizamento social e de uma inclusão num projecto coerente de desenvolvimento alternativo, não tem o mínimo significado e nesse caso a introdução desse conceito, com a alteração do actual, seria susceptível de prejudicar o movimento cooperativo que é, sem dúvida, o movimento social mais relevante nesta área. Isso, nós não gostaríamos que acontecesse!

Propúnhamos, em qualquer dos casos, Sr. Presidente, que o sector fosse baptizado de forma diferente. Deve continuar a mencionar-se com centralidade a noção de cooperativismo, dando-lhe ênfase, que de resto corresponde à nossa realidade, mesmo no contexto comunitário como provam as reflexões que nesse âmbito nos foram transmitidas por diversas cooperativas que vêm acentuando, que é absurdo, que o movimento cooperativo - mesmo na óptica da resposta do embate do Mercado Único - não tenha um papel mais relevante que aquele que lhe vem sendo atribuído. É um pouco ridículo - permita-me, Sr. Presidente, que in-