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148 II SÉRIE - NÚMERO 9-RC

O Sr. Presidente (Rui Machete): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 12 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete (PSD), presidente.
Ana Paula Matos Barros (PSD).
Fernando Marques Andrade (PSD).
João José Pedreira de Matos (PSD).
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD).
José Manuel Santos de Magalhães (PS).

Encontra-se hoje presente o Sr. Prof. Doutor Fausto Quadros, que teve a amabilidade de aceder ao nosso convite para participar numa sessão de trabalho desta Comissão sobre a revisão constitucional extraordinária; a exemplo do que já fizemos na reunião em que esteve presente o Sr. Prof. Doutor Jorge Miranda, sugiro que faça uma curta exposição introdutória para em seguida conversarmos sobre os temas em relação aos quais nela se vier a debruçar.

O Sr. Prof. Doutor Fausto Quadros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creiam que é com vivo prazer e grande alegria que me encontro aqui hoje. Aliás, fui convidado há alguns meses por dois partidos para participar em reuniões similares dos respectivos grupos parlamentares. Porém, tal não me foi possível, porque não estava nessas datas no País.

É com muita honra que aceito este convite: em primeiro lugar, por homenagem ao Parlamento e a esta Comissão, da qual muito se espera e que é fundamental para o regime democrático português, mas também pela amizade muito grande e sincera, já antiga mas sempre renovada, para com o Sr. Presidente da Comissão, Dr. Rui Machete.

Entendi que não fazia sentido pronunciar-me sobre todas as alterações previstas nos vários projectos de revisão constitucional, das quais sei ter-se ocupado aqui o Prof. Doutor Jorge Miranda. Pensei, por isso, que era mais útil para nós todos e até, porventura, mais consentâneo com as minhas mais recentes preocupações nesta matéria, debruçar-me de modo especial sobre a forma como os vários projectos de revisão constitucional encaram a questão das relações entre o poder político do Estado Português e o poder político comunitário, e também a forma como os projectos não resolvem - a meu ver, deveriam resolver e já o deviam ter feito antes - o problema da vigência do direito comunitário na ordem interna portuguesa.

A primeira, que é a questão imediata que se coloca a esta Comissão, porque é a que tem de se resolver para o Tratado de Maastricht entrar na ordem interna portuguesa, está relacionada com as condições da própria ratificação do Tratado. Mas a outra questão a que me referi não é menos importante, porque, depois de o direito comunitário penetrar, pelo filtro da Constituição, na ordem interna portuguesa, a Constituição deve preocupar-se também em garantir-lhe condições adequadas de vigência na ordem interna. Portanto, estas duas questões prendem-se no fundo com os artigos 7.° e 8.° da Constituição, sendo certo que, em relação a este último, os projectos não tomaram qualquer posição e, a meu ver, deveriam tê-lo feito.

Para entrar de chofre nesta matéria, porque, de facto, não vos quero ocupar aqui senão o tempo mínimo necessário, entendo que as alterações propostas para o artigo 7.°, salvo o devido respeito - e vão demonstrar-me depois que não tenho razão com certeza -, não resolvem o problema das relações entre a soberania do Estado Português e o poder político comunitário; não resolvem esse assunto autorizando o Estado Português, como fazem, a "compartilhar" ou a "exercer em comum" com a Comunidade poderes que, até então, estavam integrados na soberania portuguesa. Devo dizer que não subscrevo esta ideia da compartilha ou do exercício em comum, porque não é isso que está em causa, mas sim saber se o Estado Português delega ou transfere poderes soberanos para as Comunidades. As duas palavras são profundamente antagónicas no seu significado jurídico-comunitário e jurídico-constitucional e eu acompanho a doutrina dominante do direito comunitário e do direito constitucional que entende que há uma antinomia profunda entre delegação e transferência, embora nesta fase da integração ainda estejamos perante uma delegação, porque revogável, e não uma transferência, definitiva e irrevogável.

É isso que está em causa e não a compartilha ou o exercício em comum, que não existe. A Comunidade e os Estados não vão exercer em comum, de mãos dadas, determinados poderes. A questão que se põe é a de saber se o Estado pode ceder, em termos de delegação ou de transferência - agora não interessa distinguir -, parte dos seus poderes soberanos às Comunidades. Não emprego a palavra soberania, porque estou sempre a raciocinar aqui em termos de soberania quantitativa, somatório de poderes soberanos, e não em termos de soberania qualitativa, que é a raiz desses poderes soberanos, questão que não tem interesse para nós neste lugar.

Mas o que há que dizer é que o Estado Português delega - repito: nesta fase, não é necessário falar de transferência - poderes soberanos nas Comunidades, porque não há a ideia da compartilha ou do exercício em comum. Não estou a imaginar as Comunidades e os Estados a praticarem simultaneamente determinados actos ou a exercerem os mesmos poderes sobre as mesmas matérias. Nesse caso, haveria compartilha ou exercício em comum, mas não é isso que se passa.

Aqui, verifica-se a separação de alguns poderes, que vão ficar nos Estados, ou porque as matérias não estão ainda comunitarizadas ou pela via da subsidiariedade - já falarei deste assunto -, mas, tratando-se de outros poderes, eles poderão ser exercidos pelas Comunidades.

Isto é particularmente importante nas políticas comuns, nas sete políticas comunitárias: três, política comercial comum, política agrícola comum e política comum das pescas, já comunitarizadas há muito, e mais quatro, política regional, política de investigação científica, política tecnológica e política do ambiente, a criar como políticas comuns até 1 de Janeiro de 1993, como dispõe o Acto Único Europeu. Então, nessas matérias, o problema do exercício em comum não se põe de todo, porque as Comunidades absorveram os poderes soberanos dos Estados membros.

Entendo que esta terminologia é inadequada e a verdade é que não encontro esta ideia da compartilha ou do exercício em comum em nenhuma outra Constituição. Esse argumento, a meu ver, não é decisivo, porque os outros também podem errar, mas é sintomático.

Bem sei que hoje é vulgar em Portugal os políticos, para explicar a nossa presença nas Comunidades, dizerem que há uma "partilha de soberania". Mas não há uma partilha de soberania. É por isso que o que encontramos nos ma-