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controlo que possa haver, no sentido de evitar o abuso e de, em minha opinião, evitar uma excessiva judicialização (desculpem-me se o termo não é correcto) destas questões. Esta é uma questão técnica, uma questão administrativa, uma questão judicial, mas para nós, médicos, é também uma questão da defesa do doente e da defesa da família, obviamente.

O Sr. Presidente: - Mas há também uma questão de liberdade, e, portanto, uma questão de garantias.

O Sr. Dr. Jaime Milheiro: - Claro. Foi por isso que cá viemos.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Dr. Francisco Santos Costa, peço-vos para serem breves, porque tenho o compromisso, para com alguns Srs. Deputados, de terminar esta reunião às 13 horas.
Tem a palavra, Sr. Dr. Francisco Santos Costa.

O Sr. Dr. Francisco Santos Costa: - Sr. Presidente, vou ser muito rápido.
Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, o conceito de anomalia psíquica é, de facto, abrangente, e nele cabe toda a vasta gama de patologia psiquiátrica.
Vou ser breve, mas não posso deixar passar em claro o apontamento que a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo nos traz, relativamente à família. Sr.ª Deputada, quem lida com estas situações na prática, no dia-a-dia, não tem tanto a noção, a não ser que sejam casos de alguma debilidade mental ou situações de gerontopsiquiatria, casos demenciais, por exemplo, do que é a família para este tipo de doente. Até mesmo quando se fala no paradigma que é a esquizofrenia no conjunto da patologia mental, mesmo nestes casos, costumo dizer que o esquizofrénico não é um marciano, ele mantém a afectividade e a própria família mantém, relativamente a ele, uma afectividade muito grande. Jamais estas famílias trazem o doente no sentido de o despejar, de o deixar ficar ao cuidado do médico ou metê-lo no hospital psiquiátrico, nesta noção de asilo, que, enfim, alguns ainda têm, como resquício dessa realidade asilar que foram no seu passado.
Esta família, quando nos chega ou quando, sem o doente, vem ter connosco, está a viver um verdadeiro drama, porque, em muitos desses casos, são os de casa, por via da sua descompensação, no tal corte com a realidade, aqueles que estão mais próximos, aqueles que, muitas vezes, estão envolvidos na sua actividade delirante - seja a mãe, seja o pai. Tanto mais que são estes que, depois, são as vítimas, quando o indivíduo passa ao acto. E aquilo que se passa, quando vêm ter connosco, é darem-nos conta do drama, dizendo-nos: "Sr. Doutor, o que é que podemos fazer? Fui à GNR, fui ao Ministério Público e não me deram resposta!". E nós, médicos, também temos de dizer a essa família, angustiada perante o problema daquele seu familiar, com quem têm uma ligação, apesar de tudo, afectiva, no sentido de o tratarmos: "Provavelmente, temos resposta para ele…". Mas a verdade é que eu não o posso ir buscar, para efeitos de tratamento. Agora, o que podemos fazer, Sr.ª Deputada, é, apesar de tudo, com bom senso, com estas cautelas - e estou inteiramente de acordo com aquilo que o Dr. Jaime Milheiro aqui disse, tanto mais que a própria Lei n.º 2118 já tinha essas "válvulas" de segurança, de controlo -, dar as bases e a forma (e penso que o Sr. Dr. Dantas terá oportunidade de também dar conta disto, que é uma preocupação deste Grupo de Trabalho) como acautelar, fiscalizar, relativamente ao diagnóstico, à situação de anomalia, aquilo que, depois, é a situação em termos da evolução do próprio tratamento e da sua validade, da importância desse tratamento.
De qualquer modo, gostaria de dizer que a família, quando vem ter connosco, vem com esta angustia muito grande, vive este drama, e nós tentamos, na prática, mais do que nada fazer, porque também muitas vezes o facto de não haver diplomas legais que suportem a nossa actuação relativamente ao tratamento cria fantasmas que vêm contaminar esta discussão a propósito do consentimento do doente - o doente está incapaz de consentir, mas pergunto se ele está incapaz só de consentir ou de dissentir, e a situação coloca-se nos dois casos, até porque, se o quadro é psicopatológico, é esta situação que está em causa -, e deixar que, depois, aconteçam os tais desfechos, os tais actos ilícitos que permitem a aplicação de medidas de segurança por via penal, apesar de tudo com bom senso, conseguir, através da relação terapêutica, desde logo na actuação, tanto quanto for possível, com a nossa equipa de serviço social, etc., que aquele doente venha falar connosco e, eventualmente, aceite a nossa proposta de tratamento.
Por último, felizmente, no nosso País também já existem associações de familiares e de doentes, que são parceiros extremamente importantes e que temos de ouvir nesta discussão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Dr. António Leones Dantas.

O Sr. Dr. António Leones Dantas: - Sr. Presidente, no que se refere à intervenção da família, penso que o Sr. Dr. Santos Costa já disse aquilo que é fundamental.
Em termos de estruturação da lei, pois é óbvio que à família e aos familiares mais directos, aos herdeiros, no fundo, terá de se encontrar um conjunto de pessoas que tenham, ao fim e ao cabo, legitimidade para recorrer ao tribunal e pedir que seja aplicada este tipo de medidas.
Portanto, a família é a grande vítima destas situações, não há dúvidas algumas sobre isto, e tem um papel decisivo, a meu ver, no acompanhamento da situação médica do doente - este é um terreno que é mais para os médicos abordarem do que para a perspectiva jurídica. E enquanto esse papel de acompanhamento da família funcionar não é sequer a altura de entrar o Direito. O Direito só entra na altura em que a família já perdeu o controlo de levar o doente a recorrer aos serviços médicos e à assistência; ou seja, o papel do tribunal vai aparecer na altura em que o papel da família acaba. Da mesma forma, sempre que seja possível que a família intervenha e esteja em condições de garantir o tratamento, é óbvio que o papel da instância formal desaparece outra vez - essa já será a altura de cessar o internamento compulsivo e de o doente regressar ao seu ambiente familiar.
Quanto a isto, penso que o fundamental está dito.
Relativamente aos modelos em termos de direito comparado, que abordam esta matéria, basicamente, estão em causa dois modelos: um de tipo administrativo, em que são as autoridades administrativas - no fundo, os presidentes de câmaras municipais, os comandantes da polícia - que têm competência para aplicar este tipo de medida, sempre, nas situações normais, com base em perícia psiquiátrica, no parecer, no apoio do estudo da situação concreta feito pelos médicos psiquiatras. Aliás, todas as recomendações internacionais são explícitas neste sentido.
Nas situações onde a privação da liberdade ocorre sem a intervenção do psiquiatra, que são os casos de urgência, também há recomendações internacionais explícitas. Por exemplo, tenho aqui a recomendação do Conselho da Europa de 1983 sobre esta matéria, que diz, expressamente, no seu artigo 4.º, que, em caso de urgência, o paciente pode ser admitido e retido num estabelecimento com base na decisão do médico, que, mesmo assim, deverá comunicar de imediato à autoridade judiciária ou administrativa competente - esta recomendação admite as duas soluções -, para que essas autoridades decidam se, efectivamente, o internamento se mantém ou não.
Em termos de abordagem e de soluções de fundo para isto, não há dúvidas nenhumas de que, nas situações normais,