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dizer-se que é potencialmente o mais importante de todos, como se tivesse substituído a voz de Deus".
Defende ainda Karl Popper a necessidade da criação de uma ordem deontológica que regule a habilitação e o exercício da profissão dos jornalistas, particularmente dos jornalistas afectos à televisão.
É evidente que estes conceitos são retrógrados e que não nos merecem qualquer tipo de sustentação. Mas é bom não esquecer que nesta matéria da comunicação social e da liberdade de imprensa há um anátema que decorre de uma tendência da nossa história em que a censura assumiu foros de grande relevo. Cito, entre outras, a referência que é feita por Fernando Rosas, no prefácio da obra Entrevistas de António Ferro a Salazar, em que é dito, de uma forma que considero lapidar, qual era o pulsar do Estado Novo relativamente à liberdade de imprensa e à organização e regulação da comunicação social.
Diz Fernando Rosas que a censura surge nas respostas de Salazar como instrumento indispensável para prevenir e controlar a formação da opinião pública, obstar à sua perversão ou à formação de uma falsa opinião pública ou ainda, mais prosaicamente, para impedir a invasão das ideias marxistas, a propagação de mentiras e o malefício da calúnia. De facto, a dado passo desta entrevista de António Ferro a António Salazar perscruta-se com clareza irrepreensível qual era a filosofia enformadora do Estado Novo relativamente à liberdade de imprensa e à comunicação social.
A dado passo, relativamente à formação da opinião pública, quando António Ferro perguntou "dirigi-la não será coagi-la?", responde Salazar que "Tudo depende da ética do regime. Se o governo dirigir a opinião pública fornecendo-lhe sempre elementos verdadeiros, honestos, desinteressados, é evidente que servirá melhor que certa imprensa ligada ao locupletamento de interesses materiais, por vezes inconfessáveis".
Como é evidente, para todos nós está absolutamente posta de parte qualquer hipótese de censura, mas há que reconhecer a necessidade de criar mecanismos de regulação que respeitem os direitos, liberdades e garantias.
Sabemos que, hoje em dia, a liberdade de imprensa é algo que tem garantias constitucionais - Vital Moreira e Gomes Canotilho dizem-no. Tempos houve em que a liberdade de imprensa era erigida, de alguma forma, como uma liberdade de resistência contra os poderes políticos. De facto, no tempo da ditadura assim era, mas a liberdade de imprensa tem hoje uma garantia constitucional da livre formação da opinião pública num Estado constitucional democrático - dizem-no Gomes Canotilho e Vital Moreira. De facto, é essa função específica que cabe à comunicação social, esse papel essencial e vital de formação da opinião pública, de desenvolvimento e de promoção dos valores culturais e civilizacionais, que deve ser garantido por via de uma instância de regulação independente.
Nessa sede - importa dizê-lo - também Portugal não está isolado. A questão da instância de regulação independente não é algo que tenha surgido entre nós de uma forma avulsa, decorre de um movimento europeu, particularmente nos anos 80, em que as instâncias de regulação avultaram como fundamentais para dirimir uma situação nova surgida com o fim da estatização da comunicação social.
Foi exactamente a criação do sector privado por complementaridade ao sector público na área da comunicação social que levou a que, no início dos anos 80, por toda a Europa, surgissem as instâncias de regulação independente, como, aliás, é referenciado na obra Direito da Comunicação Social, de Alberto Arons de Carvalho, António Monteiro Cardoso e João Pedro Figueiredo. Não que essa situação tenha surgido ex-novo na Europa, tem, de facto, a sua origem nos Estados Unidos da América, um século antes, através de Independent Commissions, mas é na Europa, nos anos 80, com o fim da "destatização" da comunicação social que as instâncias de regulação passam a ter um papel de relevo.
Como dizem estes autores, por toda a Europa perpassa um sentimento claro da imperiosidade de uma regulamentação da comunicação social, não para criar qualquer espectro, por mais recôndito que seja, de censura à liberdade da comunicação social e à formação da opinião pública mas, sobretudo, para impor regras e limites e para respeitar, fundamentalmente, aquilo que no nosso projecto enfatizamos, ou seja, os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, maxime os direitos de personalidade.
Nesta sede, e um pouco à vol d'oiseau, direi que por toda a Europa existem instâncias de regulação. Desde logo, citando as mais relevantes, temos, nos Estados Unidos da América, a Federal Commission, que é a matriz genética das instâncias de regulação europeias, e temos, na Europa, o Conseil Supérieur de L'audiovisuel, em França, a Autorità per le Garanzie nelle Comunicazioni, em Itália, e temos, no Reino Unido, três entidades distintas. Na Espanha, como sabem, inexiste uma entidade de regulação independente, que, no entanto, existe na Catalunha. Entre nós temos a Alta Autoridade para a Comunicação Social.
A Alta Autoridade para a Comunicação Social, na sua evolução histórica, promana inicialmente dos conselhos de imprensa, criados logo a seguir à Constituição de 1976, com uma extracção parlamentar exclusiva. Mais tarde, há uma evolução para o conselho da comunicação social na Revisão Constitucional de 1982, com maioria qualificada da assembleia mas já com uma composição diversificada. Na Revisão Constitucional de 1989, então, sim, é criada a entidade Alta Autoridade para a Comunicação Social, com 13 membros, com uma composição mista e, pela primeira vez, com uma maioria de extracção parlamentar.
Paralelamente, no que à regulação concerne, importa também referir, já que o disse, o Instituto da Comunicação Social e o ICP-ANACOM.
Em concreto, o que propõe a maioria no que tange à entidade reguladora da comunicação social? Propomos, praevitatis causa, desde logo, no artigo 38.º, n.º 2, uma línea b) que consagra o respeito pela verdade e pelos direitos de personalidade dos cidadãos em geral e, em particular, pela formação das crianças e dos jovens. Penso que o respeito pela verdade é um truísmo no que concerne à comunicação social séria, porque essa, de facto, não pode estar minimamente arredada da verdade.
Os direitos de personalidade são uma decorrência de algo que já na Revisão Constitucional de 1997 foi consagrado, concretamente no artigo 26.º, e que o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa e José de Mello Alexandrino, na sua obra Constituição da República Portuguesa Comentada, referem como sendo uma verdadeira revolução silenciosa no sistema constitucional de direitos, liberdades e garantias - o inciso do direito ao desenvolvimento da personalidade no artigo 26.º da nossa Constituição.