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7 DE MARÇO DE 1990

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Sublinhou-se aí, com efeito, que o questionado n.° 2 do artigo 268.°, na sua ampla literalidade, isenta de qualquer contributo exegético, iria mais longe do que, designadamente, se passa num dos países em que o padrão do arquivo aberto ganhou emblemático relevo: a Dinamarca.

Na verdade, o Open Files Act de 1970, que definiu o regime geral de acesso aos documentos arquivados na Administração, sofreu em 1975 uma significativa limitação, quando o Supremo Tribunal confinou o seu âmbito aos documentos que tenham a ver com os «casos administrativos» em que tenha de ser tomada uma decisão legalmente vinculativa. Nesta hermenêutica, o Open Files Act tenderá a valer somente em relação aos documentos que digam respeito à actividade jurídica da Administração, não logrando aplicabilidade aos documentos concernentes à chamada actividade material.

Elucida a este propósito Barbosa de Melo (Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, vol. lvii, má-xime p. 290:

Do dever geral de informar, assim extensivamente definido, estão excluídas numerosas hipóteses. Para se avaliar o seu alcance prático, deve notar-se que estas excepções aparecem na lei em cláusulas gerais ou fórmulas abertas, com a consequência de a sua concretização ficar dependente, em larga medida, dos critérios complementares de quem decida o requerimento. [...] Em muitos campos da actividade administrativa, a incidência prática das excepções é tal que a recusa do acesso constitui a regra, invertendo-se assim a intenção última do Open Files Act.

Para depois concluir:

Em larguíssima medida pode dizer-se que o legislador dinamarquês se limita a enunciar uma intenção confiando-a, em seguida, à discrição e à prudência da Administração.

2.2 — Cotejando as experiências escandinavas, ver--se-á que a norueguesa estará paredes meias com a dinamarquesa, na adopção que faz de cláusulas gerais.

Ao invés, e como se mostra do relatório por Bertil Wennergren apresentado ao Colóquio de Graz, promovido em 1976 pelo Conselho da Europa, diversa é a solução adoptada nas legislações finlandesa e sueca: estas enumeram as categorias de documentos oficiais que ficarão subtraídos ao acesso público (e essas categorias são centenas).

2.3 — Numa primeira aproximação, observar-se-á que os sistemas dinamarquês e norueguês, embora de mais fácil execução, não escapam ao divisável risco — sobretudo se transpostos para mais meridionais latitudes — de fazer coincidir o julgador com o destinatário passivo da decisão. A discricionariedade na avaliação incrementará o secretismo.

Por seu turno, como pontualiza Wennergren, «as soluções finlandesa e sueca garantem com segurança que o segredo é mantido dentro de limites rigorosos, mas, por essa razão, o sistema é bastante mais complexo de aplicar para a Administração e mais difícil de estar actualizado pelo legislador».

II

3.1 — Face à abertura criada pelo texto constitucional, o projecto de lei n.° 468/V terá, sem dúvida, enveredado por opções que se poderão abonar pela sensatez e pelo realismo.

A distinção que faz entre o acesso a documentos e registos administrativos nominativos e não nominativos traduz um pressuposto essencial à praticabilidade do sistema.

Por outro lado, o diferimento do acesso aos documentos preparatórios de uma decisão administrativa (artigo 10.°) não poderia deixar de ficar consagrado.

3.2 — Ponto será apenas indagar — e não será agora o momento de o fazer— se os actos meramente materiais da Administração vertidos em documentos deverão ser incondicionadamente franqueados.

Reconhece-se que é difícil defender, sem que o legislador ordinário se abeire da ab-rogação, se bem que parcelar, do texto da Constituição, a tese da inacessibilidade ou da acessibilidade relativa.

Esse texto, com as reticências que comporta, é demasiado peremptório para consentir significativas limitações exegéticas.

3.3 — Vistas bem as coisas, o projecto de lei n.° 467/V ajusta-se mais cumpridamente ao teor do n.° 2 do artigo 268.° da Constituição da República Portuguesa, na sua seca literalidade.

Mas no que pese a esse mais próximo ajustamento, da sua aplicação adviria, sem grande esforço prospectivo, a quase completa afectação do sistema administrativo à exibição dos documentos e registos ou à passagem das solicitáveis fotocópias.

Repete-se, no entanto, que estas previsíveis consequências se encontram latentes no ímpeto, bem intencionado, mas, ao que tudo faz supor, deficientemente formalizado, do legislador constituinte (derivado).

III

4 — Para se aquilatar dessa impetuosidade bastará atentar nas posições assumidas a nível do Conselho da Europa.

Muito naturalmente, tem-se este preocupado com a informação dos cidadãos quanto à actividade da Administração. São disso mostra a Recomendação n.° 854 (1979) da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa e, sobretudo, a Recomendação R (81) 19 do Comité de Ministros (25 de Novembro de 1981).

No anexo desta, depois de se reiterar o direito à informação do público (e não, especificamente, o direito de acesso a documentos), diz-se, na base v, que a aplicação de tal direito apenas poderá estar sujeita a limitações e restrições que se tornem necessárias, numa sociedade democrática, à protecção de interesse públicos legítimos (tais como a segurança nacional, a segurança pública, a ordem pública, o interesse económico do pais, a prevenção da criminalidade, a não divulgação de informações confidenciais) e à protecção da vida privada e de outros interesses legítimos privados.

IV

5.1 — Ninguém questionará que a Administração Pública se tem de abrir perante o povo (conjunto de todas as pessoas de um pais) e perante as próprias pes-