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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Quanto ao ramal da estação actual de Coimbra para o interior da cidade, a que se refere a minha proposta, julgo-o uma excrescencia inutil.

Se isso podesse dar condigna remuneração aos capitaes que n'elle se empregassem, ha muito que a companhia do caminho de ferro do norte o teria construido.

Não me parece que o movimento commercial da cidade de Coimbra seja bastante para alimentar um ramal de caminho de ferro. E quanto ao movimento de mercadorias pelo Mondego até á Figueira, todos sabem que a navegação d'aquelle rio se acha interrompida durante uma parte do anno, para que elle possa servir para o transporte aquelle ponto dos productos e mercadorias trazidos pelo caminho de ferro da Beira.

Agora permitta v. ex.ª e a camara que eu faça tambem um pequeno enxerto n'esta discussão.

Eu disse ha pouco, que por importante que fosse a linha da Beira Alta, ella não podia nem devia preterir outras obras não menos importantes.

Reconheço toda a importancia d'esta linha para o paiz, em geral, é em especial para a rica provincia que atravessa; mas seduz-me muito mediocremente a idéa de que ella seja a nossa verdadeira linha internacional, só pela circumstancia de ser a que mede á menor distancia entre os Pyrineus e o porto de Lisboa.

A França tem portos de mar sufficientes para o seu movimento transatlantico, e não é de certo d'ahi, mas sim de Hespanha, que ha de vir o principal alimento das nossas linhas ferreas e o principal movimento aos portos do nosso litoral.

Ora, sendo assim, as nossas duas unicas linhas verdadeiramente internacionaes são as linhas dos valles do Douro e do Tejo. São aquellas que a propria natureza traçou, e que são, sem contestação, a via mais curta entre a maior parte da Hespanha e os portos do Atlantico.

A linha do valle do Tejo, ou seja pela linha de leste e ramal de Caceres, ou seja pela projectada via da Beira Baixa, é o trajecto mais curto entre Lisboa e Madrid, e as provincias centraes de Hespanha; e mesmo até em relação aos Pyrineos, se considerarmos que ella póde fazer-se em condições de velocidade superiores á da Beira Alta.

Mas sobretudo a linha do Douro é que apresenta condições verdadeiramente excepcionaes.

Como linha interna é ella que serve ao transporte do nosso principal ramo de commercio de exportação, e das immensas riquezas mineralogicas da região que atravessa, servindo dentro do paiz as ricas provincias do Douro, Traz os Montes o ainda da Beira Alta.

Como linha peninsular é ella que, por intermedio da linha do Minho, estabelece a communicação mais rapida entre a provincia da Calliza e o centro de Hespanha.

Como linha internacional tem ella a verdadeira vantagem de que é o trajecto mais curto e mais natural de todas as provincias centraes e occidentaes de Hespanha, e ainda de alem dos Pyrineus com a cidade do Porto. Eu creio mesmo que é a linha de maior futuro que tem o paiz.

A linha da Beira Alta, apesar de toda a sua importancia, não poderá substituil-a vantajosamente. Não poderá competir com a linha do Tejo nas relações entre as duas capitaes da peninsula; mas sobretudo o que não póde por fórma alguma substituir, é o movimento internacional da linha do Douro em relação á cidade do Porto. Poderia mesmo ser-lhe mais prejudicial do que util, deslocando interesses e movimento, que tem por foco natural esta cidade, se se não completasse a linha do Douro.

Eu bem sei que poderão dizer-me que a barra do Porto não se presta ao movimento transatlantico a que póde prestar-se o porto de Lisboa. Eu creio porém que está na mente de todos que a barra do Porto não póde conservar-se como actualmente se acha, e que o melhoramento d'essa barra, ou a construcção de uma doka, ou porto de abrigo, correspondente ao seu grande movimento commercial, é o complemento necessario, indispensavel, impreterivel dos caminhos de ferro do Minho e Douro.

Sem elle nem as duas linhas poderão attingir a importancia e o rendimento de que são susceptiveis, nem a cidade do Porto poderia elevar-se ao logar a que lhe dá direito a sua especial situação, como centro de todo o movimento das provincias do norte.

E o que deveria ser causa da sua prosperidade, poderia sem este complemento ser causa do seu definhamento, sem vantagens para ninguem, e só com manifesto prejuizo do paiz.

A simples conclusão da linha do Douro até á fronteira, que não póde já agora importar muito, é indispensavel para que o rendimento das linhas do Minho e Douro cubra rapidamente o grande desfalque que ainda existe entre a sua receita liquida e os seus encargos, e desembaraçando o thesouro, seria ao mesmo tempo o mais poderoso instrumento economico para auxiliar a confecção das outras linhas.

Eu entendo, pois, que a primeira e mais urgente necessidade do paiz, n'esta especie, é concluir a linha do Douro, ou ella tenha de seguir pelo Valle do Tua ou do Sabor a Zamora, ou como eu entendo melhor sob o ponto de vista internacional, e em harmonia com as considerações expendidas, que ella vá á Barca de Alva a entroncar com a linha de Salamanca, deixando para vias reduzidas as communicações interiores das provincias. Eu não direi que se adie por causa d'ella qualquer outra que se reputo necessaria e que estejamos em circumstancias de construir, mas sim que a conclusão d'esta não póde nem deve ser preterida por nenhuma outra.

E não é só no paiz que se ambiciona e deseja a conclusão d'esta linha.

Diz o relatorio apresentado á assembléa dos engenheiros civis portuguezes, que a directriz da linha do Douro a Salamanca se acha prejudicada, porque a deputação provincial mandou estudar o traçado por Ciudad Rodrigo a Villar Formoso, e que era isso negocio tão adiantado, que não poderia modificar-se.

Ora eu leio, n'uma das excellentes revistas economicas estrangeiras do Commercio do Porto, que esta asserção não é completamente exacta, e que não sómente a deputação provincial, mandando abrir concurso para os estudos da linha de Salamanca á fronteira portugueza, não determinou o seu ponto terminal, mas, o que ainda é mais significativo, quatro deputados da provincia de Salamanca representaram ao ministro da governação, contra o programma do concurso, por não terem sido attendidas as disposições da carta de lei de 22 de dezembro de 1876, a qual auctorisou uma linha que, partindo de Salamanca em direcção á fronteira portugueza, se bifurque em ponto conveniente para entroncar com as linhas portuguezas da Beira Alta e Douro nos pontos que de antemão tenham sido designados pelos governos respectivos.

E vejo ainda mais, que em algumas povoações do mesmo districto se promovem representações em favor da communicação directa d'aquella cidade com o Porto. Um jornal mesmo do districto, publicando as actas da associação dos engenheiros civis portuguezes, diz que é absolutamente indispensavel, que se faça luz sobre estas questões de caminhos de ferro, para que em Hespanha se saiba com o que devem contar e o que lhes cumpre fazer.

É pois indispensavel que o governo tome alguma deliberação a este respeito o mais depressa possivel. O caminho de ferro do Douro, que está quasi concluido até o Pinhão, não póde ficar ali, sem ligação com a rede geral.

Muito seria para desejar que antes do pedido de auctorisação para a construcção de qualquer caminho de ferro, o governo nos apresentasse um plano geral da rede dos nossos caminhos de ferro, e no qual se podessem avaliar as condições da sua importancia, preferencias e concorrencia.