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4 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

só os que estão cegos não vêem que debaixo de effervescencias exaltadas, proprias da luta, ha um grande movimento de ideias, que urge dirigir e não repellir: os combates dos Parlamentos, ainda até com as paixões proprias das assembleias politicas, não devem assustar os nossos homens publicos corajosos, sinceros e honestos, como não assustam os grandes estadistas estrangeiros; só os culpados ou os mediocres é que se receiam das pugnas parlamentares ou não sabem vencê-las: o refugio dos homens publicos, compromettedor para a Coroa, nos adiamentos e dissoluções como expediente de Governo, é um sinal de impotencia intellectual ou moral, uma demonstração de cumplicidades e responsabilidades, a que pretendem os governantes esquivar se.

Creio que o Parlamento Português ha de proceder com a maior ponderação, que não é incompativel com o fervor das assembleias politicas; não serão os dissidentes que o perturbem na sua grande obra; mas, em todas as hypotheses, governe sempre o Governo com as Côrtes e faça uma politica «nacional», fora da velha acção dos partidos, politica generosa e ampla, de tolerancia e de lei, inspirada politica e socialmente numa sincera feição democratica, norteada para a solução dos problemas economicos e financeiros, e terá o apoio tão vigoroso dos dissidentes como terá

O seu combate energico, bem que nunca desvairado e em repellões, se seguir por caminho contrario. Quem fala assim está mais do que em espectativa benévola: está numa espectativa carinhosa

Em conformidade com estas declarações, e para que toda a luz se faça sobre assuntos que interessam á acalmação dos espiritos e ao respeito do país perante o estrangeiro, venho occupar-me do regicidio, das providencias policiaes e judiciaes tomadas pelo Governo com respeito ao aftentado de 1 de fevereiro. Falarei sem paixão, com um inteiro sentimento de verdade e de justiça, sem frases que destoariam do que devo a mim e ao meu partido — que tanto lutou e soffreu! — de um acontecimento tragico que foi uma das mais profundas e commovidas surpresas da minha vida. Ainda tudo me pareço um sonho escuro e mau!

Estava era Salamanca, quando ali chegou a noticia, de manha. Não a acreditei: nem de leve lhe dei a menor attenção.

Na véspera correra noticia do assassinio do Czar; se bem me recordo, haviam sido distribuidos supplementos dos jornaes da terra, noticiando esse facto. Sai de casa convencido da sua falsidade. Vi na praça principal de Salamanca, debaixo das arcadas que a 1 rodeiam, á porta da redacção de um jornal, uma lousa negra onde, a giz, em letras brancas, se annunciava o attentado.

Nem ainda assim acreditei!

Um meu amigo de Salamanca affirmou-me que a noticia era official; e, em breve, d'isso tive a prova.

Como é que semelhante facto acontecera?

Que erros, que desvarios se haviam praticado nesta doce terra portuguesa, para assim d'elles irromper, surgir, um tão tragico successo?

Como é que, da alma de [...]hos de um povo tão docil e brando, tão resignado e soffredor, viçou a flor dê sangue e de morte?

Por que mysteriosos processos se realizou um facto que nunca succedera na historia de Portugal, onde, se tem brilhado bons Reis, outros tem havido de sinistra memoria, tisnada pelo fanatismo ou escurecida de ambições e de desrespeito pelos direitos de povo?

Era verdade, era verdade! O attentado praticara se.

O Rei e o Principe Real morreram. Junto d’elles cairam, mortos tambem, aquelles que sobre o Rei e õ Principe haviam descarregado as suas armas.

Não os matou o povo: matou-os a policia.

Um dos mortos — é horrivel! — provou-se ser innocente.

Foram uma triste acção, só por si demonstrativa da bruteza e incapacidade da nossa policia, essas mortes. Gelaram-se na sepultura bocas que podiam dizer a verdade.

Não me recordo de país algum do mundo, republica ou monarchia, em que os perpretradores de taes attentados houvessem sido mortos: a policia não os acutila ou derruba a tiro, não só porque isso é um assassinio, mas porque é uma inepcia e um processo de collaborar, para o silencio e desconhecimento da verdade, com os autores do attentado.

Só este facto basta para caracterizar a policia de Lisboa!

Loucos os que mataram o Rei? Os loucos merecem piedade, não merecem a morte!

Desvairados por uma paixão sua, individual, determinando-se por si proprios ou com cumplicidades tambem apenas individuaes? Os tribunaes que os julgassem; não é a policia que sentenceia nem a sua missão é cortar com o fio da espada os emmudecer com uma baia a voz humana que tem direito a defender-se e que podia, pela confissão do attentado, ser um instrumento da justiça e da verdade.

Allucinados, impellidos pelo espirito do partido, pelo odio de uma facção que lhes armasse o braço? Então, essa morte, sobre ser uma barbaridade sem nome, assume uma feição profundamente nociva aos interesses nacionaes porque um partido, monarchico ou republicano, que quisesse erguer o seu triumpho sobre a terra de uma sepultura amassada de sangue e impregnada de lagrimas, seria para sempre condemnado.

Seria um agrupamento politico incapaz de governar a nossa patria por desconhecer u piedade, a condição moral do nosso povo, tão cheio de enternecida ternura, tão doce e indulgente para a memoria de todos os mortos, e por não comprehender que o attentado contra a vida de um Rei alienava as sympathias da Europa monarchica e causava, pelo mundo fora, uma impressão de espanto e pavor.

A Servia é um exemplo frisante; e. um partido politico d'este pequeno Portugal, que não reconhecesse a impossibilidade, ou, pelo menos, o perigo enorme de fundar um regimen ou um Governo sobre a morte violenta de um. Rei, esse partido tinha logo, no seu desconhecimento das condições externas do país, a sua condemnação de incapacidade, a razão da sua perda.

Por todos os motivos, sobrelevando a todos a deshumana crueldade incompativel com as funcções policiaes, que se vêem entregues a mãos incompetentes, a morte dos dois perpetradores do attentado foi uma verdadeira catastrophe. E foi, por parte da policia, um crime.

Mas o crime deu se. As investigações policiaes, as diligencias do Juizo de Instrucção Criminal começaram logo. Vão decorridos mais de tres meses. Que ha? Que se apurou? Quaes os resultados das inquirições feitas? Que veio á luz das prisões effectuadas? O Sr. Presidente do Conselho não veja nestas palavras uma accusação ou uma insinuação, lenho perguntar. Não venho aggredir.

Eu penso, sinceramente, que o Sr. Presidente do Conselho tem empregado todos os esforços para se descobrir a verdade Que razões imperariam no seu animo em sentido contrario?

Velho soldado, leal amigo de El-Rei D. Luiz, antigo Ministro do Senhor D. Carlos, homem publico que fez o enorme sacrificio de acceitar o Governo num dos lances mais terriveis da nossa historia, monarchico por fé profunda e por affeição ressoai, que motivos podiam levá-lo a um acto de desfallecimento, de duplicidade e de incuria?

Não accuso o Sr. Presidente do Conselho. E não tenho razões para accusar o Juizo de Instrucção Criminal. Não conheço o magistrado que a elle preside, nem sequer de vista. As minhas informações são de que é um juiz intelligente e digno. E eu sou insuspeito.

Transferi-o do seu cargo de delegado, e d'ahi me resultou, a mim e a meu ir-