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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 147

inutil, e até certo ponto incompativel com as aspirações e modo de ver da nossa sociedade.

Respondendo ao digno par, direi que o regulamento do real de agua continuará em vigor mesmo depois da approvação deste projecto, e nas localidades onde o imposto se arrematar. Dos manifestos, quando os houver, continuar-se-ha a tomar a devida nota nas repartições de fazenda; a differença unica será que á fiscalisação, por vezes menos severa do estado, terá de substituir-se a fiscalisação mais immediata e zelosa do arrematante, e que a este não serão negados os meios coercivos de cobrança, quando e como as disposições do regulamento indicarem que lhe devem ser prestados.

E dito isto, acrescentarei que a organisação desse regulamento tão acrimoniosamente condemnado foi um dos assumptos que mais preoccupou o actual governo, logo que tomou conta da gerencia dos negocios publicos.

Quando nesta camara o digno par, o sr. marquez de Vallada, na occasião em que o ministerio se apresentava pela primeira vez ante os representantes do paiz, me perguntou o que o governo tencionava fazer da auctorisação concedida pela lei de 1878, levantei-me, e declarei, do modo mais terminante, que não usaria da auctorisação que essa lei conferia ao governo, na parte referente ao estabelecimento do imposto de circulação e á creação de barreiras, porque, tendo combatido essas disposições quando estavamos na opposição, não podiamos, sendo inalteraveis as nossas convicções, acceita-las como ministros; mas declarei tambem que o governo, reconhecendo a gravidade das circumstancias financeiras, não deixaria de lançar mão da outra auctorisação que se continha nessa lei, procurando por esse modo, e sem alterar as formas da cobrança, obter um rendimento que mais se approxime do que legitimamente deve esperar-se d'esta fonte de receita. Com esse intuito ordenei a elaboração do regulamento. A camara de certo comprehende que um trabalho desta ordem não podia nem devia ser feito de repente; foi elle, de facto, muito meditado, procurando-se evitar, quanto possivel, vexames inuteis na fiscalisação., mas não aboli-los em absoluto, excluindo qualquer, disposição um pouco mais rigorosa, porque um tal desideratum não o comporta a natureza deste imposto.

Em França, onde tantos são os meios de que se dispõe, para tornar efficaz a fiscalisação, onde existe desde muito a cobrança do imposto na circulação, foi e é ainda assim necessario conservar na lei disposições muito mais rigorosas do que as preceituadas em qualquer dos nossos regulamentos fiscaes.

Alem de que é bem sabido que entre nós os costumes modificam muito o rigor das leis, carecendo infelizmente o legislador de contar com esse elemento, visto que taes costumes não modificam de repente, e por simples desejo dos governos.

Julgava eu, porem, que- o estudo do regulamento, tal qual foi publicado, só podia fazer reconhecer quanto o governo tinha diligenciado suavisar o mais possivel as agruras e asperezas inseparáveis da fiscalisação deste imposto, prescindindo do que na lei de 1878 havia de mais vexatorio, mal imaginando eu por isso que hoje nos viessem accusar, como nos accusam, de havermos lançado mão de quantos vexames e oppressões a subtileza fiscal tem inventado para opprimir os contribuintes.

S. exa, o sr. visconde de Chancelleiros, referiu-se muito particularmente as multas estabelecidas para punir as transgressões regulamentares, e mostrou, sobretudo, preoccupar-se muito com o effeito das denuncias, que pareceu considerar como uma nova e odiosa invenção.
Mas, sr. presidente, antes da publicação do regulamento quasi que não havia differença entre transgressão e descaminho, porque a ambas se applicava uma pena demasiada e injustificavel - a da perda dós generos; julgava eu, portanto, que, fazendo o que fiz, isto é, acabando, com a pena da perda dos generos para as transgressões, e substituindo a por uma multa de 9$OOQ réis, aggravada na reincidência com 1$000 réis mais, tinha prestado um verdadeiro serviço aos contribuintes.

E a respeito da compaixão que a s. exa. inspiram antecipadamente as victimas dessas multas, direi ao digno par, que tanto se jacta de conhecer os habitos da vida campestre, que por minha parte tambem os conheço e sinto por elles entranhada predilecção; direi mesmo que nunca o animo, se me desaffoga tanto, ^nunca o meu espirito sé encontra tão despreoccupado, como entre esses laboriosos habitantes, do campo,- cujo viver modesto inspira tamanha sympathia, e que, pelo amor com que se entregam ao trabalho, desde o romper do dia até ao pôr do sol, nos dão a todos exemplo do dever que nos assiste de concorrermos, nas differentes espheras sociaes, com diligente lavor no sentido do bem commum, não nos limitando a satisfazer ás necessidades da vida, mas procurando melhorar sempre as condições geraes da communidade, cumprir com os deveres do cidadão, satisfazer aos santos encargos da familia.

Nestas condições, sr. presidente, não será de certo por mera satisfação ou injustificavel capricho, que eu irei lançar sobre o paiz um sem numero de empregados fiscaes, essas harpias que o digno par vê desde já pairar sobre as aldeias.

Não transformarei Portugal em um paiz de empregados fiscaes, como s. exa. pareceu receiar, nem o numero de nomeações que tenho de fazer é tão grande como õ digno par suppõe.

S. exa. concedia-me dois desses empregados por concelho, e eu asseguro-lhe que, por emquanto, não tenciono nomear mais de um. E verdade .que alguns concelhos ha para os quaes não é sufficiente um empregado, em consequencia da grandeza da sua area e numero consideravel dós seus habitantes; para esses e nomearei, mas só mais tarde, os que forem precisos.

Portanto, já vê o digno par a que modesta proporção fica desde logo reduzida essa nuvem de aves de rapina que á imaginação de s. exa. se afigurava como que esvoaçando sobre o paiz, e ameaçando o desgraçado contribuinte.

Resta referir-me aos horrores da denuncia, e emquanto a este ponto facil é a minha defeza. Não fiz eu mais" do que repetir no regulamento o que se achava consignado desde muitos annos nos nossos diversos regulamentos fiscaes. A denuncia utilisada como meio fiscal existe consignada, entre outros documentos officiaes, nos decretos de 1864, que dizem respeito ao serviço das alfandegas; por consequencia, e limitando-me a esta simples referencia, não creio que existindo a denuncia na nossa legislação fiscal ha tanto tempo, se possa acreditar que fosse eu quem a inventasse. Se imaginasse que poderia ser atacado neste ponto, teria trazido commigo diversos regulamentos, e poderia facilmente demonstrar ao digno par a verdade da minha affirmativa. Appello, porem, para o testemunho dos cavalheiros que se sentam nesta casa, e que já foram ministros da fazenda, para ã o sr. conde de Valbom, para o sr. Serpa Pimentel, para o sr. José de Mello Gouveia, e s. exas. poderão certificar se é ou não exacto o que estou asseverando.

Se a denuncia existe, pois, na nossa legislação, se é acceita nas alfandegas; se foi sempre reputado conveniente interessar no producto das multas e das tomadas o denunciante.

O sr. Visconde de Chancelleiros: - Sei muito bem quaes são as penas impostas pelos nossos regulamentos fiscaes, e antes delles, pela ordenação mas do que eu tenho medo, é de tudo isso na mão - do arrematante. Livre-nos s. exa. do arrematante, que eu não faço caso do regular mento.

O Orador:- Mas, sr. presidente, antes da arrematação que proponho, existia já a avença com as camaras e com ella indirectamente o arrematante, e nessas condições passo