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152 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

citações que tenho feito do que se passa na Allemanha, não posse deixar de notar que o bacalhau paga ali apenas 6,75 réis por kilogramas.

Se continuando neste exame eu for aos cereaes? o que encontro? O trigo entre nós paga 700 réis por cada 100 kilogramas, emquanto que na Allemanha, nessa Allemanha que tão desdenhada foi pelo digno par com relação á sua administração, paga apenas 225 réis. O milho, que em Portugal paga, 600 réis do direitos de entrada, paga na Allemanha 115 réis.

Estes algarismos são eloquentes, no entanto eu reconheço que esta questão dos cereaes, para que todos olham na actualidade, é altamente importante, e carece ser estudada muito cuidadosamente, antes de se propor qualquer providencia que altere a legislação vigente, porque della póde resultar por um lado o aggravamento da crise por que está passando a nossa agricultura, e por outro a difficuldade de introducção do elemento primordial de toda a alimentação publica.

Mas não é só nos cereaes ou no bacalhau que ha uma tão grande differença entre os direitos que se pagam em Portugal e os que são exigidos na Allemanha; essa differença, dá-se tambem com relação a outros generos de consume. A manteiga, que entre nós paga 150 réis por kilograma, paga ali 45 réis; o chá, cujo direito em Portugal é de 650 réis, tem naquelle paiz o de 225 réis; e onde é que na pauta, chamada proteccionista, daquelle imperio se encontram direitos protectores para os tecidos de lã, que cheguem, como entre nós, a 41 e a 90 por cento, ou sobre os tecidos de algodão subindo a 29 e 56 por cento do valor dos mesmos tecidos?

N'estas condições parece-me que dificilmente poderemos tirar maiores recursos das nossas pautas, e quasi que se póde affirmar que o imposto neste ponto está esgotado.

Não quero dizer com isso que o paiz não esteja uns condições necessarias para poder occorrer ás nossas difficuldades financeiras; mas a verdade é que, procurando nos differentes recursos tributarios aquelles em que poderia achar; com menor inconveniente auxílios para, pelo menos, attenuar o déficit, encontrei um campo muito restricto, e vi-me por fim obrigado a lançar mão, sem ter por ellas enthusiasmo, dos recursos que estão consignados nas propostas que tive a honra de apresentar na outra casa do parlamento.

Peiores que os impostos que proponho são-o por certo a grandeza do nosso déficit e a importancia consideravel da nossa divida; e foi, preocupado com esta convicção, que eu tanto desejei fazer ver ao paiz a situação pouco lisonjeira em que nos achamos, descrevendo-a tal qual realmente ella se apresenta. Não a descrevi com cores de phantasia; procure desenhai-a com as suas proprias.

Não sei se mereço o epitheto de Zurbaran das finanças, com que alguem já me mimoseou. Ainda assim antes Zurbaran, que no meio do horror da nudez das suas figuras ascéticas conservava animado o sopro do ideal, cio que pintor realista, que afeasse o existente, sem ver alem delle a esperança e a salvação.

Seja como for, o que é certo é que não carreguei mais a situação, do que em outras occasiões, aliás menos desfavoraveis, o tem feito espiritos menos propensos á melancolia,

Não careço outros documentos mais para o provar do que um discurso do digno par o sr. conde de Valbom, Tenho tal consideração pelo talento e conhecimentos de s. exa., que folgo sempre que encontro occasião de me defender com as opiniões sustentadas por s. exa.

Em março de 1872, com circumstancias financeiras bem mais favoraveis, discutia-se na outra camara a proposta do imposto de consumo apresentada pelo sr. Fontes. O sr. conde de Valbom combatia então, com o maior vigor, a creação das barreiras, como hoje combate a cobrança por arrematação. Zurbaran das finanças, s. exa. dizia, porem, nessa epocha:

"Devemos encarar a situação tal qual ella é. É facto que temos melhorado, iras tambem é facto que temos um deficit [...] persistente, e que tem sido impossivel debelar. Porem, agora supponho que é de vez que se quer aniquilar, e nesta parte felicito muito o governo por arcar frente a frente com este pretinaz inimigo da fazenda publica.
"Eu, desde que se apresentou aqui o ministerio, tomando a palavra, declarei ao governo qual era o meu pensamento a este respeito. E creio que o illustre ministro da fazenda estará lembrado de eu dizer - nós não devemos já empregar palliativos nem expedientes para atacar a questão de fazenda, e, na sessão proxima hei de tomar conta ao governo, se elle não apresentar um systema completo para resolver as nossas difficuldades financeiras, e acabar por uma vez com o deficit."
E s. exa., acrescentava, note o bem a camara:
"Estamos aqui a discutir quaes são os melhores impostos, se os directos, se os indirectos, quaes os mais vantajosos, e quaes os mias inconvenientes. Para mim, o peior de todos os impostos é o deficit.
"Se as nossas receitas fossem crescendo successivamente em relação as despezas, se houvesse probabilidade de que com o tempo desapparececce o deficit, isso era bom, era uma esperança risonha, mas infelizmente vejo que não podemos ter essa esperança. O deficit cada vez que aggrava mais, as circunstancias peioram, porque os encargos vão crescendo successivamente sobre a fazenda publica para ocorrer a este deficit. Portanto, é necessario acabar com elle, é urgente faze-lo. E oxalá que se tivesse feito ha mais tempo"
Extinguir o deficit parece muito, mas s. exa., não limitava ahi as suas aspirações, dizia logo em seguida:
"Mas digo mais, que não só é necessário acabar com o deficit, mas é necessario obter um saldo positivo, um excesso de receita, que podesse applicar-se a amortisação da nossa divida. É indispensavel isto".
E insistindo na necessidade d'essa amortisação, affirmava que "as necessidades do nosso orçamento nasciam, em grande parte, da excessiva verba de que precisamos para fazer frente aos encargos da divida. Temos no orçamento uma verba, cifra redonda, de 10.000:00$000 réis para satisfazer aos encargos da nossa divida fundada e fluctuante."
Nesse ponto não estão hoje as cousas mais favoraveis, visto ser o encargo correspondente de 14.000:000$000 réis approximadamente.
"Orçamento onde o total da despeza ordinaria effectiva é de 20.000:000$000 réis, e onde os encargos da divida representam metade d'essa despeza, é um orçamento demasiadamente onerada com encargos d'esta ordem."
Ora aqui têem, pois, v. exa., e a camara como naquella epocha o sr. Conde de Valbom apreciava a situação financeira, e como aquelle digno para poderia com justiça ser equiparado, como eu, a um Zurbaran dos mais sombrios, e que nos seus quadros, inspirados por um sombrio ascetismo, mais terror podia inspirar a quem os contemplasse.
Diga-se, em abono da verdade, que nem sempre s. exa., assim foi, e que por vezes tem julgado opportuno, como agora figurar entre os nossos financeiros mais risonhos, entre aquelles que procuram e sabem extrahir das suas palhetas os meios tons mais suaves, os cambiantes mais delicados, as transições mais harmoniosas, as tintas menos carregadas, por forma a tornarem amenos, agradáveis a vista os quadros desenhados nos seus discursos e relatorios.

Tenho presente neste momento um livro muito curioso intitulado Confissões dos ministros de, Portugal; escreveu-o um distincto empregado do tribunal de contas, a quem pessoalmente não tenho o gosto de conhecer.

Diz elle no começo do seu livro:

"Este livro não é echo de paixões, nem fructo de idéas politicas. Ou não tem partido ou é de todos, Não absolve