536 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES do REINO
Este projecto, segundo diz a propria commissão de instrucção publica, tem por fim tres pontos essenciaes: a creação de sub-inspectores, subsidio ás camaras municipaes, auxilio e recompensa á iniciativa e benemerencia individual.
Quanto á primeira questão, isto é, á creação dos sub-inspectores, a minha approvação, a uma tal disposição do projecto, é completa e plena.
Não creio na possibilidade de aperfeiçoar, a instrucção publica e de a reformar - porque reformar não é só escrever algumas palavras no papel, é sobretudo organisar escolas e dirigir o ensino - sem a inspecção constante e bastante numerosa para poder chegar, a todas as escolas, e com bastante illustração para ver o que se faz n'ellas e encaminhar o ensino por onde elle deve ser dirigido. Por consequencia, o artigo do projecto que se refere á creação dos sub-inspectores não póde deixar de ter-a minha approvação; e lamento apenas que as nossas circumstancias financeiras não permittam crear desde já um corpo de inspectores e sub-inspectores mais numeroso, melhor remunerado e permanente. É esta uma necessidade que ninguem póde desconhecer, porque não ha instrucção sem inspecção, assim como não a ha sem professores que sigam methodos de ensino racionaes; isto, porém, não se póde conseguir senão por meio dos inspectores. O inspector é o instrumento essencial do aperfeiçoamento constante e continuado da instrucção primaria. É necessario o inspector porque elle está sempre em contacto com a escola, examina-a, percorre é para e dá ao governo informações incessantes que o podem guiar nos seus actos com referencia á instrucção publica do primeiro grau.
O outro ponto que se apresenta como essencial por parte da commissão, é o que diz respeito ao subsidio ás camaras municipaes, para sustentação da escola.
Sem tratar agora de discutir se seriam ou não extremamente pesados para as municipalidades os encargos que a lei de 1878 estabelecia, direi que, consideradas as circumstancias do paiz, ha sempre vantagem em approximar, quanto possivel, do municipio e da parochia, os interesses do ensino primario.
É certo, sr. presidente, que os impostos destinados ao pagamento dos ordenados aos professores, e das outras despezas das escolas, sáem da bolsa do contribuinte, quer elle pague ao estado, quer ao municipio. Mas tambem é certo que não póde ser indifferente o facto das parochias e dos municipios estarem directamente interessados nas escolas, porque isto promove uma vigilancia constante da parte dos habitantes das respectivas localidades sobre a organisação d'essas escolas.
Os inspectores podem substituir até certo ponto a vigilancia directa da parochia ou do municipio; mas, ainda assim, não será tão efficaz a vigilancia como a d'estas pequenas divisões territoriaes, porque, embora as inspecções façam com que o professor cumpra o seu dever, as diversas circumscripções não têem o mesmo interesse em fazer sacrificios para melhorar as escolas e enriquecei as com o que for necessario para o ensino.
Sr. presidente, é tambem conveniente que ao lado da escola primaria se estabeleça o ensino da gymnastica e o do canto coral; porque, qualquer d'elles é de maravilhoso effeito sobre a robustez, o espirito e a moral dos alumnos.
Todos sabem o que acontece na Allemanha com o ensino do canto coral, e quem tem percorrido aquelle paiz, não ignora que, aonde ha uma escola de instrucção primaria, ha um curso de musica rudimentar, que interessa os alumnos e lhes inspira o gosto pela arte.
Os municipios, contribuindo directamente para as escolas, podem dotal-as de modo que satisfaçam todas as necessidades do ensino.
A lei belga, como muito bem disse o sr. ministro do reino, estabelece em principio que ás localidades cumpre satisfazer os encargos do ensino primario, mas permitte que o estado as auxilie. Isto é que me parece devia ser expresso claramente na nossa lei, de maneira que se visse bem que o subsidio ás localidades era a excepção e não a regra.
Ha tambem outro ponto sobre que a commissão chama a attenção, e que é dos mais essenciaes n'esta reforma. Refiro-me aos subsidios á iniciativa individual.
Em geral sou contrario aos subsidios á iniciativa individual; porque essa iniciativa deixa de o ser, quando se convence que o estado vae auxilial-a, ou antes, substituil-a; e a iniciativa torna-se apenas um pretexto para obter esse auxilio; o que tem graves inconvenientes, quando a iniciativa particular se refere a assumptos, como este de que falla o artigo 18.°
Quanto aos subsidios ás juntas geraes, já disse o meu pensamento a este respeito; e o sr. ministro do reino fez muito bem em observar que, pela lei, é só como excepção e não como regra, a concessão de subsidios para occorrer ás despezas da instrucção primaria.
A primeira de todas as cousas urgentes é que a instrucção publica se estabeleça em boas bases, é que o povo aprenda; mas é necessario tambem, que o povo, no seu proprio interesse, se contente com o thesouro, como recurso subsidiario, e não como recurso principal.
Diz-se aqui no projecto que, entre outras cousas em que o estado póde vir em auxilio da iniciativa particular, póde ser dando auxilio ao estabelecimento de jardins de infancia, cursos de adultos, bibliothecas, escolas de desenho, e outras instituições que tenham por fim o desenvolvimento da instrucção popular, creadas pela iniciativa particular.
Eu não sei se a lei quer suppor a possibilidade de se crearem em Portugal escolas pelo methodo de Froebel, que se conhecem pelo nome de jardins de infancia, com professores ordinarios.
Creio que sim. Ora, quando se trata de methodos especiaes, porque outra cousa não são os jardins de infancia, não me parece isso muito conveniente; nem a iniciativa particular desajudada da intervenção de mestres convenientemente educados poderá conseguir cousa alguma.
Todos sabem que o jardim de infancia é um methodo de ensino que produz e acompanha o desenvolvimento das faculdades intellectuaes na creança. Ninguem de certo desconhece que o ensino que ali se recebe tem vantagens extraordinarias para a evolução d'essas faculdades.
Na Allemanha, nota-se de ordinario que as creanças que vão a estes estabelecimentos, cujo ensino, por meios proprios e adequados, tem em vista desenvolver a intelligencia das creanças ainda no fim de muitos annos, não se enfastiam da escola, antes a buscam e ali aprendem com prazer; ao passo que nas outras escolas, em que não se cuida das faculdades da creança, ao cabo de poucos annos ellas, em logar de se terem desenvolvido, têem-se tornado como que embrutecidas, e, como que com as faculdades mechanisadas.
Estes jardins de infancia não podem ser entregues á iniciativa particular unicamente, e por isso seria conveniente que na lei se estabelecesse que elles, em alguns pontos do paiz, fossem creados como escolas normaes para educar mestres. Desde que o mestre precisa estar compenetrado do methodo, e conhecer a fundo o desenvolvimento das faculdades mentaes da creança, necessariamente não póde conseguir ser bom mestre, sem um estudo previo e uma seria experiencia. Esta só se póde adquirir em escolas normaes especiaes.
Suppor a creação d'estes jardins só por iniciativa particular, sem a protecção do governo, sem ensino normal, é suppor um impossivel.
Mesmo na Allemanha, principalmente em Harburgo, onde esses jardins têem dado optimos resultados, ha o ensino normal para mestres, organisado em escolas especiaes.
Os aspirantes a mestres nos jardins de infancia, recebem educação na escola normal, onde ha uma mestra di-