442 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
Art. 5.° Se o emprestimo for levantado por acções, a amortisação far-se-ha por sorteio publico no dia 31 de dezembro de cada anno; se for contratado por annuidades, as prestações semestraes serão pagas nos prasos mencionados, e se for contratado por diverso modo, far-se-ha a amortisação segundo for accordado entre a camara e os mutuantes.
Art. 6.° As obras a que é destinado o emprestimo poderão ser feitas por administração ou por arrematação em hasta publica, no todo ou em parte, como parecer conveniente ao governador civil em conselho de districto.
Art. 7.° Ao pagamento do juro e amortisação do emprestimo será applicada a quantia de 350$000 réis annualmente, que a camara para este fim inserirá sempre no seu orçamento, e sem a qual não poderá elle ser approvado.
§ 1.° A verba de que trata este artigo será deduzida do imposto de 12 réis em kilogramma de carne vendida para consumo do concelho, imposto que fica servindo de garantia especial do emprestimo.
§ 2.° A dotação do emprestimo formará um capitulo especial no orçamento.
Art. 8.° Os vereadores e quaesquer outros funccionarios que effectuarem, auxiliarem ou approvarem o desvio das quantias mutuadas, ou da que serve de garantia ao emprestimo para qualquer applicação diversa da que lhe é prescripta por esta lei, incorrerão nas penas do artigo 54.° da lei de 26 de agosto de 1848.
Art. 9.° Fica revogada a legislação em contrario.
Palacio das côrtes, em 13 de julho de 1869. = Diogo Antonio Palmeira Pinto, presidente = José Gabriel Holbeche, deputado secretario = Henrique de Barros Gomes, deputado secretario.
O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Tenho difficuldade em approvar estes projectos que auctorisam as camaras municipaes a contrahir emprestimos; e como não quero protrahir esta discussão, direi unicamente duas palavras sobre o modo como encaro este assumpto.
Ha muito tempo que considero um conselho municipal electivo, como a verdadeira e indispensavel garantia para que as camaras municipaes preencham os seus fins com menos sacrificios dos povos; os conselhos municipaes actuaes, na minha opinião, não preenchem o seu fim, porque são tirados á sorte d'entre os maiores contribuintes, que muitas vezes exigem melhoramentos de que a totalidade dos habitantes do conselho não tiram utilidade, e quando se lançam impostos para o pagamento dos emprestimos que é necessario contrahir para custear as obras, estes impostos vão quasi todos recaír sobre o povo, augmentando-lhe as contribuições indirectas; quando o conselho municipal fosse electivo não havia de acontecer assim. Isto é a causa de se multiplicarem os impostos indirectos, com grave prejuizo do povo, como já aqui tenho mostrado muitas vezes.
E agora que se deve tratar da descentralisação administrativa, seguindo-se a opinião do sr. ministro da marinha, parece inconvenientissimo estar a permittir que as camaras municipaes vão contrahir emprestimos sem saber as bases da descentralisação que se pretende estabelecer.
Diz-se n'este projecto que o emprestimo vae ser pago por 12 réis lançados sobre a venda da carne em detalhe; é sempre o mesmo principio de lançar impostos sobre os generos de primeira necessidade.
Ha annos apresentou-se aqui um projecto, que rejeitei, para auctorisar a camara municipal da ilha da Madeira, para contrahir um emprestimo de 40:000$000 réis, para construir os paços do concelho, etc. Estou convencido que estes 40:000$000 réis não chegavam; felizmente, não houve quem tomasse o emprestimo; mas a camara arranjou uns 12:000$000 réis, ou não sei quantos contos, com que principiou a obra, e lá estão apenas umas paredes, segundo me consta, que pouco se elevam do chão. Se lá houvesse um conselho municipal electivo, as cousas haviam de ter tomado outro caminho.
Ora estes casos que todos os annos, por assim dizer, estão a acontecer, é que é preciso prevenir, e por isso é que eu entendo que se não devem dar auctorisações ás camaras municipaes para contrahir emprestimos, sem que haja uma reforma radical na administração publica, e que não póde ser feita senão por meio da descentralisação, estabelecendo-se um conselho municipal electivo como base da administração municipal.
O sr. J. A. Braamcamp: - Sr. presidente, eu não sou relator d'este projecto, como se vê pela ordem das assignaturas dos membros da commissão no parecer que se discute; como porém não está presente quem o relatou, permittam-me v. exa. e a camara, que eu, como membro da commissão que examinou o referido projecto, dê algumas explicações ao digno par que acaba de fallar.
Em primeiro logar, s. exa. apresentou considerações geraes em relação á organisação dos conselhos municipaes, e á importante questão da descentralisação; e como estas considerações, permitta-me o digno par que lhe diga, não cabem na discussão d'este projecto, não tenho que responder a ellas.
Agora quanto ao que s. exa. disse, e que tem immediata relação com a questão de que nos occupâmos; isto é, qual seja a proveniencia dos rendimentos para satisfazer aos encargos do emprestimo de que trata este projecto, devo declarar que esses rendimentos provém de impostos já existentes; não se vae aggravar a situação dos povos do concelho...
O sr. Visconde de Fonte Arcada: - E esses impostos não são precisos para outra cousa?
O Orador: - Eu não sou vereador d'esta camara municipal; e digo por uma vez que a suprema tutela que o parlamento exerce sobre os corpos municipaes não é para entrar no exame minucioso da fórma por que elles se administram. É convicção minha profunda de que estes projectos vem ao parlamento para se ver se em qualquer ponto contrariam os interesses geraes do estado; e esta doutrina está em harmonia com os principios da descentralisação, que s. exa. defende com toda a rasão; mas não applica no presente caso.
Direi a s. exa. que os impostos a que se soccorre a camara municipal, para fazer frente aos encargos do emprestimo são já existentes. A camara aprecia as circumstancias locaes e as forças da contribuição, e harmonisa o projecto das obras em conformidade do conhecimento que tem e da convivencia em que está com aquelles habitantes.
Estas obras são necessarias, e a importancia do emprestimo, apenas de 3:600$000 réis, não deve assustar.
Destina-se o producto do emprestimo, em primeiro logar á conclusão das obras da cadeia, o que é uma obrigação imposta pela lei, porque ás camaras incumbe attender ao alojamento dos presos; por consequencia é uma despeza obrigatoria; em segundo logar, é applicada a somma de 1:200$000 réis para a obra do matadouro, creio que tambem não é nenhum objecto de luxo; por ultimo, 397$980 réis para melhorar os lavadouros publicos e fontes, e para a exploração de aguas; tambem me parece que são objectos indispensaveis do serviço municipal. Todas as outras disposições do projecto em referencia a garantias e á devida fiscalisação correspondem ás clausulas necessarias que se encontram geralmente nas leis d'esta natureza. Por consequencia aceite o digno par as explicações que lhe dirijo com todo o respeito que tributo á sua pessoa, mas convença-se de que os interesses d'aquelle concelho reclamam a adopção do projecto, e persuada-se tambem de que eu partilho e procuro applicar a doutrina da descentralisação, a respeito da qual todos proclamam as mesmas convicções.
Tenho a dizer a s. exa. que os orçamentos das camaras municipaes não são leis permanentes, que variam de anno para anno os rendimentos de impostos, e que podem ter n'um anno applicação para uma despeza muito diversa da que tem para o anno seguinte.