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Sessão de 9 de Julho de 1923
a aura dum momento; foi uma fôrça que, desaparecendo, deixou atrás de si um rasto de inextinguíval luz e enriqueceu a língua portuguesa de novos motivos de beleza, fazendo-a retumbar em sons de epopeia e fazendo-a gemer no sentimento do mais puro lirismo.
O seu poder de imagens exerceu-se com extraordinária fascinação, e o seu jôgo verbal não tinha nem conhecia dificuldades, parecendo bater às portas do infinito.
No emtanto, justiça é confessá-lo, a sua obra não pode ser lida sem reservas; dum lado por ser subversiva de alguns princípios da moral, e de outro lado por ser desrespeitadora duma das maiores organizações do mundo — a igreja. Êle próprio o reconheceu num dos seus últimos livros, dizendo: «Fui injusto para com a igreja».
Eu próprio tive a honra de ouvir uma confissão sua nesse sentido, quando êle afirmou: «Quem me dera ter algum tempo de vida para reeditar toda a minha obra sem a parte de blasfémia para com Deus e para com a igreja».
O seu livro Os Simples, porém, ficou como um dos melhores, tesouros da sua riquíssima joalharia literária, sem as sombras que velam quási sempre a beleza dos seus livros.
Dizia o grande poeta que não queria nem discursos nem coroas. E esta uma das melhores demonstrações do seu génio. A glória humana cousa alguma tem de consistente. O homem aos olhos de Deus é só realmente o que é e nada mais, dizia S. Francisco de Assis, um dos santos da sua maior devoção; no emtanto, se os discursos não acrescentam, nem deminuem a glória eterna do poeta, para nós servem de desabafo pelo grande ensinamento de virtude que nos trazem.
Constituindo nós a primeira assemblea política do país, não é demais lembrarmos que para o grande poeta o principal caminho para nobilitar as instituições vigentes era o das reivindicações dos católicos e sobretudo o ensino religioso.
Guerra Junqueiro, a êste propósito, deixou algumas frases célebres. Êle não encontrou nada melhor para satisfazer a sua alma do que o catolicismo, e professou-o com a abnegação, que é uma forma de compreender o catolicismo.
Nos últimos momentos da sua vida, êle dizia que se não fôsse a sua fé religiosa suicidar-se-ia de tanto sofrer.
Que esta atitude seja um exemplo para a orientação política do país. Reforcemos a fé religiosa de Portugal para que Portugal, longe de continuar caminhando para o suicídio colectivo, viva e progrida como nação de largos e supremos destinos.
Entretanto, de pé, curvo-me à passagem do féretro de um dos maiores homens do nosso tempo e da nossa terra.
Que a misericórdia de Deus seja com êle.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Eça de Queiroz definiu a arte, pela bôca de Fradique, como um resumo da natureza, feita pela imaginação.
Como todas as definições ainda que insufladas de talento, enferma esta da dolorida impotência humana em abarcar numa síntese perfeita aquilo que se não pode condensar em fórmulas áticas, porque encerrar num agregado de palavras a imensidade, é o mesmo que aprisionar um leão numa gaiola de pombos.
E é perante a morte de Junqueiro, neste momento, que a sua obra se ergue aos nossos olhos impersonalizada, numa evocação, forte e dolorosa, que a vacuidade sentimental dessa definição, que, tantas vezes, os moços da minha geração, entusiasmados, fizeram, como dizia Flaubert, passou pelo gueuloir.
Evocar a obra de Junqueiro, é como que seguir o voo, sereno e majestoso, de uma águia.
A ânsia da altura imprime à sua obra gigantesca, laivada de génio, uma curva ascensional de onde a beleza brota com uma harmonia eólia,
Seguir as evoluções do seu altíssimo espírito é percorrer a trajectória duma estrela de primeira grandeza, que aos nossos olhos se tornasse visível em toda a sua imensidade, em toda a sua esplêndida luminosidade.
Junqueiro ergue-se tam alto que pôde fitar «Deus, sem que os seus olhos mortais se cegassem da luz máxima.
De toda a geração contemporânea foi êle o maior, e ouso dizer que foi o maior poeta contemporâneo da raça.