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Sessão de 27 de Maio de 1924 5

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira) (interrompendo): — Eu tenho vindo cá todos os dias.

O Orador: — Mas acontecia que, quando V. Exa. comparecia, não me chegava a palavra.

O que desejo preguntar é a razão por que a República Portuguesa ainda não fez o reconhecimento da República Federativa dos Soviets da Rússia.

Afigura-se-me que se trata de um acto inteiramente necessário ao país, visto que dêsse reconhecimento poderia derivar o estabelecimento de relações de carácter comercial, do mais alto interêsse para nós.

De resto não se trata de um caso esporádico, porquanto aquela República já está reconhecida por três Estados monárquicos da Europa.

Sr. Presidente: o reatamento das relações comerciais é para nós de toda a utilidade, porque a Rússia é produtora de trigo e petróleo, por exemplo, e consumidora de cortiça, conservas, etc.

Nesta ordem de ideas, e colocando-me apenas no terreno da dialéctica egoísta da classe conservadora, afigura-se-me que não há razão para não criar um desafogo aos produtos portugueses, alguns dos quais estão a ser artificialmente desvalorizados por uma incontestável rarefacção da procura, em benefício de nacionais e estrangeiros.

Por toda esta ordem de razões não me repugna a mim defender aqui abertamente, sem me preocupar com os aplausos ou censuras dum lado ou do outro, o mais rápido reconhecimento por parte da República Portuguesa, da República dos soviets da Rússia.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira): — Apesar de, efectivamente o Sr. João Camoesas me ter prevenido, há bastante tempo, de que um dia, na Câmara, trataria do caso do Govêrno Português não haver reconhecido ainda oficialmente o regime dos soviets da Rússia, o que é certo é que foi com alguma surpresa que hoje ouvi S. Exa. tratar dêste assunto, porque, realmente, já lá vão muitos dias que S. Exa. me havia dito que, em dia indeterminado, se ocupava dele.

Até hoje não tenho conhecimento oficial de que qualquer país haja reconhecido a República dos soviets da Rússia, embora os jornais tenham dito que algumas aproximações se têm produzido entre certos governos e o dos soviets.

A República Federativa dos soviets não está reconhecida, pelo menos oficialmente, e não pode S. Exa. e creio que ninguém, imaginar que o Govêrno Português tenha estado inteiramente alheio â existência da referida República. Evidentemente tem considerar-se que essa República existe de facto.

Para fazer o reconhecimento não pode haver nenhuma razão de ordem sentimental.

Estou certo de que o Sr. João Camoesas, espírito livre de todas as peias, que todos nós conhecemos, se estivesse no Govêrno não levaria o seu sentimento de simpatia pelos someis até o ponto de reconhecer oficialmente a existência da República da Rússia.

Devia, efectivamente, procurar saber quais as razões que implicariam êsse reconhecimento, e as razões de oportunidade para que êsse reconhecimento se fizesse.

O Govêrno Português, na hora própria, cumprirá o seu dever reconhecendo a existência da República da Rússia. Mas será, apenas, na hora própria.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu (interrompendo): — Emquanto a não reconhecer cumpre o seu dever.

O Orador: — Parece-me que isto bastará para tranqüilizar, e pacificar o espírito do Sr. João Camoesas.

O orador não reviu.

O Sr. João Camoesas: — Agradeço ao Sr. Ministro dos Estrangeiros a amabilidade de responder à minha pregunta. É verdade que, há muitos dias já, tinha avisado S. Exa. de que, na primeira oportunidade, formularia a pregunta que fiz.

Com efeito, hoje S. Exa. não havia sido prevenido de que eu o interrogaria; mas ainda não me havia chegado a palavra na presença de V. Exa.

Tendo-me chegado hoje e estando S. Exa. presente, não pude preveni-lo, mas não tive receio de usar delatara êsse fim,