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594 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 56

Destas circunstâncias resulta grave dificuldade da repartição da riqueza, em virtude do valor avultado dos prédios urbanos; nela se filia em parte, por isso mesmo, o próprio problema do inquilinato.
A situação descrita constitui também gravíssimo obstáculo às partilhas por morte, dando lugar, com frequência, à necessidade do pagamento de tornas, onerado pela respectiva sisa, ou, como em muitos casos sucede, à própria alienação dos prédios, privando os interessados da situação de proprietários.
Também aqui se trata apenas de mero aspecto de problemas mais gerais. Não é inútil, no entanto, ponderar-se neste lugar a danosa perturbação social a que estamos assistindo, vendo absorver as propriedades privadas por organismos oficiais, por grandes capitalistas, ou por especuladores que adquirem prédios para demolição.
Para a solução deste problema também a propriedade horizontal pode concorrer eficazmente, e muito em especial no que respeita às partilhas. A divisão de prédios por andares pode facilitar às famílias a conservação do seu património sem as privar da propriedade, libertando-as dos encargos das tornas e, acima de tudo, eximindo-as àquela quebra do vínculo moral que une as várias gerações, sempre resultante da delapidação dos bens acumulados por cada uma delas.

5. Gomo resulta dos números antecedentes, o âmbito em que deve desenvolver-se a propriedade horizontal transcende muito o problema da construção de novas habitações. Tem estreitas relações com ele, mas não pode supor-se que esta modalidade de propriedade só interesse para prédios futuros, adrede construídos para serem objecto do regime peculiar a esse instituto.
Na verdade, a questão da propriedade por andares interfere com muitos outros problemas importantes - o da melhor repartição da riqueza, o de maior facilidade de comércio jurídico e de acesso à propriedade, etc.
Demais, já hoje é admitida esta forma de propriedade, e já alguns prédios sé encontram sujeitos a ela. Não seria lícito nem vantajoso privá-los do regime em que se encontram, ou, para regulamentar o instituto em causa, restringir a extensão com que hoje é consagrado na lei.
Convém até não estorvar a constituição desta forma de propriedade sobre prédios já construídos, pois é a respeito destes que ela pode desenvolver-se com maior espontaneidade, criando o ambiente favorável à própria construção de casas destinadas a integrarem-se no mesmo regime.
Não significa quanto deixamos dito que não deva ter-se presente o problema da construção. Pelo contrário, cumpre esclarecer-se bem que ela se pode efectuar com o fim de fornecer habitações em regime de propriedade horizontal, logo expresso nos respectivos projectos de construção, o que pode ter repercussão em alguns pontos contemplados na apreciação na especialidade.
Nomeadamente deve ter-se presente que existem diversos sistemas de fomentar o acesso das famílias à propriedade do respectivo lar - sistema de casas económicas, previsto no Decreto-Lei n.º 23 052, de 23 de Setembro de 1933, o das casas de renda económica, que, quando edificadas por sociedades cooperativas ou anónimas, podem ser vendidas a pronto ou a prestações-, nos termos da Lei n.º 2007, de 7 de Maio de 1945, etc., e convém prever expressamente a adaptação deles à propriedade por andares. Todos esses sistemas, de alcance sempre limitado pelos encargos da construção e pelo condicionalismo urbanístico, quando aplicados a moradias independentes poderão vir a ter notável desenvolvimento, se aproveitados na construção de casas em regime de propriedade horizontal.
6. Enunciadas algumas questões relativas à função e valor da propriedade horizontal, bem como ao âmbito em que deve desenvolver-se, cumpre dizer alguma coisa, posto que a traços largos, sobre a estrutura jurídica deste instituto.
O núcleo social e jurídico da propriedade por andares consiste em atribuir-se a diversas pessoas a propriedade exclusiva de vários apartamentos ou alojamentos incorporados numa ousa, materialmente unitária.
Diversos são os sistemas susceptíveis de estruturarem juridicamente esta realidade. Não vamos examinar todos, mas é-nos forçoso dizer algo sobre os principais, pois só fazendo-o poderemos fixar as directrizes básicas que nos hão-de nortear na apreciação na especialidade.

I - Um primeiro sistema adoptado em Inglaterra e nos Estados Unidos consiste em basear o instituto na ideia de sociedade. Os vários interessados constituiriam uma sociedade, que construiria casas para serem arrendadas aos sócios, mediante pequena renda pagável durante noventa e nove anos, e distribuiria por eles os encargos de conservação e administração dos prédios.
Esta concepção, além de não apresentar a latitude que reclamamos para o instituto (conf. número anterior), é um misto de arrendamento e aquisição a longo prazo, que não pareço satisfazer às necessidades e aos anseios dos moradores.
Não é esse, òbviamente, o sistema do artigo 2335.º do Código Civil e do projecto ora em exame, visto que ambos contemplam os ocupantes das casas como proprietários.
Aliás, já hoje está consagrada, e pode ampliar-se à propriedade horizontal, a prática da construção de habitações pura venda a prestações, geralmente em regime de propriedade resolúvel, por organismos de previdência, cooperativas, etc.; mas esse sistema, se pode conduzir à constituição de propriedade horizontal, é, no entanto, simples meio de aquisição dela e não deve confundir-se com a respectiva estrutura jurídica. Quando muito, o sistema em causa pode reflectir-se transitoriamente no regime da propriedade por andares, enquanto estes não são adquiridos definitivamente pelos moradores.

II - Outra concepção que parece ter inspirado durante muito tempo a jurisprudência francesa é a de considerar o prédio dividido simplesmente em alojamentos, que são objecto de propriedade absolutamente exclusiva dos respectivos donos, onerados reciprocamente por servidões, nus quais se conglobariam todos os interesses comuns aos vários andares. Semelhante a este seria o sistema de estruturar a propriedade dos andares também em propriedades exclusivas, baseadas ou oneradas por direitos de superfície.
Estas soluções levariam à divisão absoluta do prédio por pisos ou apartamentos, com exclusão de qualquer fenómeno de comunhão, além dos que têm lugar entre prédios confinantes. Levaria ainda logicamente ou, pelo menos, tendencialmente a atribuir ao dono do primeiro piso a propriedade do terreno, ao do andar superior a propriedade do telhado, etc.
Cada propriedade parcelar beneficiaria das servidões necessárias para a sua existência o exercício - cada proprietário teria o direito de que a sua casa fosse suportada pelas inferiores e coberta pelas superiores, o direito de transitar pelas escadas de outros andares, ter vistas sobre estes, e semelhantes; cada uma seria onerada por servidões análogas, em benefício dos restantes apartamentos.
Esta forma de configurar a propriedade, horizontal contraria o sistema jurídico vigente e não teria vanta-