14 DE MAIO DE 1956 849
neste período a que estamos a referir-nos, se tem posto em relevo o terceiro. A renovação da mentalidade, a formação do espírito corporativo e a preparação técnica dos diligentes são proclamadas agora, mais do que nunca foram, como condições basilares de qualquer progresso da organização.
O Presidente do Conselho, por exemplo, falando em 1947 à União Nacional e referindo-se, não apenas à doutrinação corporativa, mas à doutrinação política em geral, não hesita em penitenciar-se de ser vim dos principais responsáveis de não se ter dado a essa doutrinação a atenção que ela merecei. E no ano imediato, como em 1949, como em 1953, constantemente repete que a verdadeira revolução tem de fazer-se pela a transformação da mentalidade geral» 2, que «é preciso que a doutrinação exigida pela revolução corporativa se faça intensamente, largamente, levando-a ao comum dos Portugueses»3 e que a faltaríamos a um grande dever ... se, lançadas as bases do plano económico, não aproveitássemos os próximos anos para simultaneamente levar por diante a cruzada corporativa» 4. E se dos escritos do Presidente do Conselho passarmos aos das demais pessoas que destes assuntos se ocuparam nos pós-guerra, é sempre a mesma nota, e com a mesma insistência, que vemos, pôr em destaque. Nos trabalhos de Pires Cardoso 5, Marcelo Caetano 6, Fezas vital 1, Cid Proença, Sedas Nunes 3, etc., põe-se constantemente em foco a importância da doutrinação como seiva alimentadora daquilo a que um destes autores expressivamente chamou a e ânsia de ideal corporativo» 4, e a urgência da formação de dirigentes como condição básica para a progressiva autonomização do sistema.
14. Felizmente, não se ficou só no domínio das palavras, embora se esteja ainda muito aquém do que seria lícito esperar delas. Sem falar já das numerosas conferências de divulgação e dos estudos doutrinais promovidos por entidades oficiais ou pela iniciativa privada, seria faltar a um dever de elementar justiça não citar aqui o trabalho silencioso, mas francamente positivo, do Centro de Estudos Económico-Corporativos anexo à Faculdade de Direito de Coimbra, superiormente dirigido pelo Prof. Teixeira Ribeiro - que já em 1945 conseguia publicar uma valiosa colectânea de estudos de economia corporativa 5 -, e do Gabinete de Estudos (Corporativos- do Centro Universitário de Lisboa da Mocidade Portuguesa, que teve s tem no Prof. Pires Cardoso o principal inspirador e orientador e que há mais de seis anos vem publicando com regularidade uma excelente revista especializada 6.
Estes dois organismos têm prestado relevantíssimos serviços no estudo dos problemas sociais e económicos ligados com o corporativismo; e por eles têm passado - e neles completado a sua formação científica - alguns dos nomes de maior valor com que o futuro da organização pode contar. Mas sendo centros de estudo de nível universitário - verdadeiros centros de altos estudos corporativos-, não pode esperar-se deles que resolvam o problema da formação de dirigentes patronais e sindicais e muito menos o problema da doutrinação das massas.
Não é essa a sua finalidade, nem é conveniente que seja. E, por isso mesmo, pode afirmar-se que, à parte uma tentativa infrutífera da criação de dois «Círculos de Militantes Sindicais», esboçada em 1947 7, e alguns
1 «E temos de confessar que, por demasiadamente absorvidos em resolver problemas, alguns dos quais foram, sem resultado, programa de todos os governos anteriores o aspiração de multas gerações, não se deu ao trabalho da doutrinação política, de organização e formação da consciência pública aquela atenção que
merecia. Posso dizê-lo, porque devo considerar-me um dos principais responsáveis. Cf. «Governo é Política» (discurso à União Nacional em 4 de Março de 1947), em Discursos, vol. IV (1948-1950), p. 276, e Antologia, p. 30.
2 No «Prefácio» à 4.ª ed. do vol. I dos Discursos, Coimbra, 1948, p. XXXII.
3 Eis o posso completo do discurso a que pertence a transcrição feita no texto: «A nossa Constituição admitiu para o Estado a base corporativa, a este corporativismo era, e deve ser, no conceito das pessoas responsáveis, um corporativismo de associação, e não corporativismo de Estado; mas é evidente que não podia de um momento para o outro criar-se um Estado corporativo sobre a Nação inorgânica. O erro cometido não consiste, pote, no eclectismo das fórmulas constitucionais e na longa duração dessas mesmas soluções eclécticas (por muito mais tempo hão-de durar, se dever fazer-se a gradual evolução das instituições). A falta maior, embora justificada, está numa espécie de paragem que a organização sofreu durante anos e nos desvios, tanto de pensamento como de acção, que sofreu sob a imposição de circunstâncias conhecidas.
Assim, para que constitucionalmente se avante na orientação prevista, é necessário retomar a marcha, estendendo a organização, completondo-a, coordenando-a e corrigindo-a no quo se faça mister. É preciso ainda que a doutrinação exigida pela, revolução corporativa se faça intensamente, largamente, levando-a ao comum, dos portugueses, alguns dos quais ainda hoje lhe não vêem, por desfiguração das coisas, benefícios alguns e outros não sabem filiar as regalias materiais obtidas no espirito que as gerou e as tornou possíveis». Cf. «Questões de Política Interna» (discurso aos governadores civis, comissões da União Nacional e candidatos a deputados, em 20 de Outubro de 1949), in Discursos, vol. IV (1948-1950), pp. 482 e 488, e Antologia, p. 198.
4 Discurso proferido em 10 de Julho de 1953.
5 Cf. Uma Escola, Corporativa Portuguesa, Lisboa, 1949, pp. 13 e 14: «... Falta-nos desenvolver e consolidar, entre nós, uma mentalidade corporativa que promova a melhor utilização e concretização dos princípios doutrinários; falta-nos uma grande equipa de dirigentes com uma boa formação corporativa, já que o âmbito da organização aumenta dia a dia e não chega essa plêiade de valores existentes, embora queira suprir pelo devotado fervor o que lhe escasseia em número. Em suma, temos duas grandes tarefas pela nossa frente, já empreendidas antes, mas carecendo de larga reactivação: o problema da generalizarão do espírito corporativo e o problema dos dirigentes». Leia-se também, do mesmo autor, a «Editorial» que precede o n.º 1 (Janeiro-Março de 1950) da Revista do Gabinete de Estudos Corporativos e a «Editorial» que precede o n.º 14 (ano IV, Abril-Junho de 1958) da mesma Revista.
6 V. a citada conferência Posição Actual do Corporativismo, p. 12.
1 V. o artigo «Desvios do Corporativismo Português», no loc. cit., p. 7.
2 «Sobre Algumas Deficiências de Espírito Corporativo», in Revista do Gabinete de Estudos Corporativos, ano V, n.º 18 (Abril-Junho de 1954), pp. 138 e segs. Veja-se também, do mesmo autor, o importante relatório intitulado «Formação Social de Trabalhadores», apresentado em 1948 ao Subsecretário de Estado das Corporações, depois duma visita à Escuela de Capacitación Social de Trabajadores, de Madrid.
3 Situação e Problemas do Corporativismo, Lisboa, 1954, pp. 125 a 128. Aí se afirma, corajosamente, sobre a preparação dos dirigentes: «É este um problema de que bastante se tem falado entre nós, mas em ordem ao qual todas as soluções eficazes se vão inexplicavelmente protelando».
4 Pires Cardoso, O Problema Actual da Corporação Portuguesa, p. 6.
5 Suplemento V ao Boletim da Faculdade do Direito, Coimbra, 1945.
6 Definindo os objectivos da criação do Gabinete, escrevia o Prof. Pires Cardoso, a abrir o primeiro número da respectiva Revista (n.º 1, Janeiro-Março de 1950, p. 2): «Neste particular, tem-se a consciência da oportunidade desta iniciativa, que pretende ser um exemplo e um incitamento. Exemplo, ao demonstrar que, com poucos meios mas muita vontade, alguma coisa se pode realizar, em combate a inércia doutrinária em que nos temos deixado sepultar de há muitos anos para cá. Incitamento, ao desejar que algo de mais importante se faça no sector da doutrinação corporativa, em ordem a dois problemas fundamentais que não devem descurar-se: a formação duma consciência corporativa neste pais e a preparação de dirigentes para os organismos corporativos ou outros estreitamente ligados à organização».
7 Em 18 de Novembro de 1947, por despacho do então Subsecretário de Estado das Corporações, Dr. Castro Fernandes, eram criados dois «círculos de militantes sindicais» e entregue a sua orientação à Fundação Nacional para a Alegria no Tra-