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7 DE JUNHO DE 1956 871

pleta subjugação do indivíduo. O conflito capital-trabalho deixava de subsistir, sem dúvida, mas pelo processo radical de suprimir pura e simplesmente um dos contendores -o capital-, ficando o Estado como patrão de todos. A livre iniciativa e a propriedade privada não tinham mais razão de ser, desde que o Estado tomava para si o comando de toda a vida social e se encarregava de distribuir a todos um paradisíaco bem-estar.
Via-se logo, porém, que o sistema socialista, por melhor intencionada ou lógica que fosse a sua resposta aos clamores contra a injustiça liberal, era portador de um critério de justiça manifestamente abstracto, porque não respeitava as constantes essenciais do homem, exigindo-lhe o sacrifício da personalidade e da liberdade em troca de duvidosas promessas de melhoria material.

15. Apresentada a situação, embora por esta maneira esquemática, não causa estranheza o aparecimento de uma nova mensagem que traduzisse o anseio de uma normalidade social, sem menosprezo dos valores humanos eternos, mensagem que salvaguardasse a eminente dignidade da pessoa e respondesse cumulativamente às aspirações de justiça das classes menos favorecidas.
Surge, por este modo, o neocorporativismo, como fenómeno de reacção, a um tempo contra o liberalismo e o socialismo, propondo-se resolver a «questão social» num ambiente de paz e conciliação e afirmando-se capaz de, pelo .princípio corporativo, ordenar os interesses e coordená-los num sentido finalista de bem comum.
O movimento corporativo, que despontou no último quartel da século XIX, foi buscar inspiração a doutrina germânica do catolicismo social, de que foi fundador Mons. Ketteler, conhecido bispo de Mogúncia, cuja obra teve uma projecção notável. Da Alemanha, a sua semente é transportada para a Áustria, onde germina com o barão de Vogelsang e Rodolfo Mayer, e é lá que o coronel La Tour du Pin, adido militar da França em Viena, a vai buscar e a transplanta para o seu país.
O catolicismo social começa em França, praticamente, com a obra dos círculos católicos de operários, criados a partir de 1871, e a publicação da revista Association Catholique, iniciativas a que estão indissoluvelmente ligadas as figuras do marquês de La Tour du Pin, do conde de Mun e de Léon Harmel- o doutrinador, o orador s o realizador, coimo sugestivamente os identifica um dos anais reputados historiadores do catolicismo social (Georges Hoog).
A Igreja não era estranha ao movimento que começava a alastrar, antes o impulsionou decisivamente. Já em 1881 o insigne papa Leão XIII encarregava teólogos eruditos de encarar a doutrina católica quanto aos seus reflexos nos planos económico e social, examinava a questão junto deles e de outras pessoas eminentes e concitava-os a uma elaboração doutrinária, que veio a concretizar-se na União de Estudos Internacionais de Friburgo (abreviadamente União de Friburgo), donde saiu em 1884 um notabilíssimo documento - as famosas «Teses de Friburgo»-, que se reportam a cinco pontos fundamentais: salário, regime de propriedade, regime de crédito, papel dos Poderes Públicos e regime corporativo.
O catolicismo social, que, na sua corrente francesa- através dos círculos operários e da doutrinação na revista Association Catholique -, se havia já afirmado o iniciador de uma escola corporativa católica, veio reforçar a sua deliberada inclinação para o corporativismo com as teses de Friburgo e a ter a sua consagração na encíclica Rerum Novarum (1891), em que o grande Leão XIII perfilha os princípios do catolicismo social, e designadamente o princípio corporativo, revestindo-o assim da altura e da dignidade de doutrina sancionada pela Igreja.
A escola corporativa católica constitui a primeira grande manifestação do neocorporativismo e o repositório doutrinário aonde todas as outras escolas que se lhe seguiram foram buscar a inspiração.
Com base nesse transcendente diploma pontifício, o pensamento social católica adquire uma funda penetração, não atingida antes, arrasta prosélitos e difunde-se por todos os meios. Instituem-se em 1904 as conhecidas semanas sociais de França, que chegam até aos nossos dias com pequenas interrupções, espécie de «Universidade ambulante», que se reúne anualmente aqui ou além, numa qualquer cidade, onde os católicos sociais franceses procedem a uma intensa elaboração e fixação doutrinárias em todos os sectores dá vida social; e o exemplo das semanas sociais frutificou em tantos outros países, inclusivamente Portugal, que as tem desde 1940. De assinalar, a Semana Social de Angers (1935), onde o problema corporativo foi estudado nos seus mais salientes aspectos por nomes destacados do pensamento francês e se definiu mais precisamente o sentido do catolicismo social, aliás sempre proclamado, para a fórmula de um corporativismo de associação.
Já anos antes de Angers havia sido publicada outra famosa encíclica papal - a Quadragésimo Anno, de Pio XI (1931) -, que veio, em seguimento e complemento da Rerum Novarum, confirmar e revitalizar a doutrina da Igreja em matéria social, reforçando o papel preponderante conferido ao princípio corporativo, como substrato e apoio dê uma organização social mais perfeita.
Com todos estes elementos se estruturou a escola corporativa católica, preconizando um corporativismo de associação, que veio depois a firmar-se em três pilares essenciais: livre iniciativa quanto à criação dos organismos corporativos, inscrição facultativa e auto-direcção. Esta fórmula constitui incontroversamente o processo ideal de se concretizar o sistema corporativo, mas, talvez por isso, será porventura, e só, a meta que sempre se procurará alcançar nó delineamento prático da ideia corporativa.
Exactamente por esse facto, já antes da última guerra e dentro do próprio catolicismo social se estava desenhando uma corrente revolucionária, no sentido de emprestar maior eficiência e maior celeridade às realizações corporativas. Assim, excluindo-se em absoluto o corporativismo de Estado, defendia-se simplesmente um certo «corporativismo de associação», pela consideração verdadeira de que «mesmo um regime novo, realmente revolucionário, não pode ser inteiramente espontâneo; deve ele surgir da iniciativa dos interessados, mas os Poderes Públicos deverão estabelecer-lhe de início os quadros legais e territoriais, depois generalizá-lo e impó-lo» (padre Jarlot, S. J.).
Tal directiva aproxima-se, já notoriamente da solução portuguesa, como é visível. Mas, pelo momento-nesta incompleta digressão pelos domínios da génese e evolução do neocorporativismo -, convém assinalar, e apenas nos tópicos principais; as escolas de maior representação que enfileiram na corrente corporativa do nosso tempo.

16. Seguiu-se a escola corporativa italiana, caracterizada fundamentalmente pela fórmula «corporativismo de Estado» -melhor diremos: «socialismo corporativo» - e pela particularidade de circunscrever a organização corporativa ao sector económico, preconizando portanto um «corporativismo parcial».