7 DE JUNHO DE 1956 877
quase sempre a necessidade estrita de fazer um enquadramento rígido, por meio de organismos de tipo uniforme - agrupados por actividades, categorias profissionais e áreas geográficas, de modo a efectuar, a sua integração harmónica e por planos sucessivos na competente corporação -, já no domínio sui generis dos interesses morais e culturais, ao contrário, nem se vê necessidade de proceder identicamente, nem seria viável o intento, nem talvez mesmo vantajoso.
Está-se, nesta hipótese, perante um campo muito específico de actividades que se resolvem em fins predominantemente desinteressados, nas quais uma grande maioria da população não está em causa por vínculo directo, inversamente do que sucede no domínio económico, em cuja órbita todos gravitam com maior ou menor intensidade. Enunciem-se apenas os objectivos pressupostos nesta teia de interesses - ciências e letras, belas-artes, educação física e desportos, assistência, beneficência, caridade - e ter-se-á a imagem real (melhor diríamos: ideal) do ambiente em que penetramos, a noção clara da distância a que se situam estes dois sectores de interesses humanos, para os quais não há termo de comparação.
31. Não importa, pois, criar um padrão de organismo tecnicamente corporativo para a integração de todos estes variados interesses; antes se impõe aproveitar as instituições espontaneamente nascidas, respeitá-las na sua diversidade natural - associações religiosas, academias, centros, grupos desportivos, Misericórdias, associações de beneficência, etc.-, e enquadrá-las por modo racional na correspondente corporação.
A tarefa está, pois, e por natureza, grandemente simplificada. E nem sequer normalmente haverá que falar em organismos intermédios, embora em alguns casos haja necessidade ou simples conveniência em os instituir, quando não existam já, como sucede designadamente no ramo da educação física e desportos. Mesmo na hipótese de grande número de instituições primárias, que imponha a selecção de representantes para fazerem parte da respectiva corporação, não será difícil encontrar o processo da sua designação dentro de áreas geográficas a fixar, tal como já hoje se pratica em relação aos municípios e às Misericórdias para eleição de Procuradores à Câmara Corporativa.
Tudo está, portanto, no trabalho de erguer a corporação moral ou cultural, mercê de cuidadoso estudo para cada caso particular; de maior ou menor complexidade, embora, mas sem obstáculos irremovíveis. Assim pudéssemos manifestar o mesmo optimismo - fundado em previsão que não se receia distante da realidade - a propósito das corporações económico-sociais, onde se suscitam óbices que nem a teoria nem a experiência lograram transpor totalmente, sendo imperioso ladeá-los na antecipada convicção de soluções nunca perfeitas.
Até por isso, até pela maior simplicidade de realização, está aberto o caminho para a instituição das nossas corporações morais e culturais, devendo activar-se com celeridade os seus indispensáveis preparativos. Assim se implantariam pela primeira vez autênticas corporações de base ideal, como que a afirmar o primado do espírito numa época de marcada vocação materialista. E não ficaria mal pôr aqui uma discreta nota de orgulho.
Nestes termos, propõe-se que a base XV seja alterada no sentido de prescrever a instituição de corporações de natureza moral e cultural simultâneamente com as de tipo económico constantes da proposta de lei, reservando-se ao Governo a competência para definir quais os ramos de actividade social por elas abrangido».
§ 18.º
Corporação económico-social: ou corporação económica e corporação social?
económica
32. Visto sumàriamente o caso das corporações morais e culturais, trataremos em capítulos subsequentes da corporação de natureza económica. Diremos melhor: de natureza económico-social, porquanto o simples qualificativo económico pode dar a entender que os problemas de ordem social, pertinentes, sobretudo, às relações entre capital e trabalho, não entram na esfera da corporação.
Note-se mesmo que, se há divergências de doutrina, enquanto respeita às funções assinadas à corporação, raros serão os autores que lhe negam competência em matéria social e já em maior número se apresentam os que por aí se quedam, retirando-lhes o fim especificamente económico. Sem embargo, a corrente dominante inclina-se decididamente para o exercício das duas ordens de funções económicas e sociais, embora com desvios importantes de uns para outros, sobretudo no concernente à latitude da competência económica.
Pelo que respeita ao nosso país, os textos legislativos conferem à corporação a dualidade daquelas funções essenciais, além de outras mais secundárias. E, pelo círculo muito limitado dos nossos doutrinários, também se não topam discrepâncias fundamentais em tal matéria. Adoptaremos, por isso, e de preferência, o qualificativo económico-social para a corporação, no desejo de assim utilizar terminologia mais compreensiva e correcta do que a fixada na própria lei portuguesa.
Nesta espécie de corporação, de natureza económico-social, intervêm simultaneamente os dois elementos, patronal e trabalhador.
Mas não deve deixar de dizer-se que já tem sido sustentada uma concepção diferente, ao preconizar-se a separação em dois corpos distintos dos sectores económico e social.
É a tese de Mathon: para cada ramo de actividade uma corporação económica e uma corporação social. Na primeira - a corporação económica - integrar-se-iam apenas as empresas, só a elas respeitando a gerência das actividades económicas; na segunda - a corporação social - interviriam as entidades patronais e os trabalhadores, irmanados na conveniência mútua de resolução dos seus problemas comuns. O fundamento de uma corporação económica, de composição restrita aos chefes de empresa, residiria no facto de serem estes os donos e os responsáveis das explorações económicas, devendo pertencer-lhes, consequentemente, a direcção suprema dos negócios, além de serem para esse efeito os mais qualificados. Sendo assim no domínio interno de cada empresa, se daqui subirmos para o plano da corporação, não haverá mais do que transpor essa competência para nível superior e atribuir, portanto, aos chefes de empresa, exclusivamente, a condução das actividades económicas de todo o ramo de produção considerado.
33. A tese, lógica à primeira vista, não resiste a um exame mais aprofundado. Primeiramente porque, se pode pôr-se em dúvida que aos trabalhadores sejam conferidos alguns poderes de co-gestão económica na sua empresa - e parece que só no aspecto informativo e consultivo eles serão de considerar -, o que não pode discutir-se é o interesse dos trabalhadores na disciplina da actividade económica em cujo âmbito desenvolvem o seu labor profissional e onde o sector do trabalho está também em causa.
Por outro lado, se a co-gestão económica, no âmbito interno da empresa, levanta problemas delicados quanto à unidade de direcção, princípio de autoridade e re-