O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

576 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 43

em qualquer sector da vida moderna: a investigação tem de acompanhar, para lhe dar vida e sentido progressivo, qualquer plano de realizações.

§ 6.º

Dificuldades que se opõem à execução do plano

12. Vão ser muito grandes as dificuldades que se opõem à execução do plano. Essas dificuldades resultam da natural inércia do meio, que resiste aqui, como em toda a parte, às rápidas alterações da técnica, a menos que os resultados económicos se mostrem imediatamente compensadores.
Assume a Lei n.º 2069 as proporções de uma «campanha» de «defesa do solo» e de «produção de produtos florestais».
No aspecto da «defesa do solo» a «campanha» não encontra da parte dos interessados uma consciência suficientemente forte da gravidade, do problema com que se debatem: cada seara que se renova é uma esperança e julga-se que terá de ser revisto o conceito que se encontra ainda nos nossos livros únicos do ensino médio de que o Sul é o «celeiro de Portugal». Bom seria que deixasse de o ser, no sentido de um exclusivismo absurdo da produção, confinando a cerealicultura às zonas de melhor capacidade produtiva, que bem podem manter abastecido o «celeiro» mercê do recurso a novas técnicas de utilização dos sequeiros, e explorando hábil e decididamente outras vocações do meio, recorrendo, num bom ordenamento, ao regadio, à cultura arbórea e ao povoamento florestal.
Não é fácil, porém, fazer aceitar a quem nasceu a ver searas sem fim, a quem depois viu ligada a vida à própria continuidade da seara, a quem conserva ainda a tradição de uma «campanha do trigo» que suprimiu charnecas; não é fácil fazer aceitar que, ano a ano, cada vez mais se degrada o solo, se altera o clima e se comprometem as reservas hídricas. A seara já não vai nalguns cabeços, mas somente porque a charrua deu na rocha, ou minguaram as sementes abaixo do que tem interesse alimentar; nada se suspendeu a tempo em resultado de raciocínio informado e inteligente. Porque assim é dilata-se o solo erosionado, onde não há árvores, ou onde as azinheiras e sobreiros sofrem a tortura de um tratamento que leva à ruína. Reflectindo a imagem do meio, o trabalhador rural, curtido pela aridez da terra exausta e pelo invariável desgaste das «crises de desemprego», aguarda um milagre, conformando-se com um pouco de agricultura, dias ociosos e obras públicas.
No ponto em que a Lei n.º 2069 assume as proporções de uma «campanha de produção de produtos florestais» a questão assume aspectos muito particulares. O apelo ao trigo mobilizou energias que descortinaram um benefício imediato. Ao romper a «campanha do trigo» na bacia hidrográfica do Terges e do Cobres, Mértola desfez-se em cereal, chamando a um esforço heróico os «seareiros» do Sul. Bastou romper os matos, o que, não sendo fácil, era possível para agricultores de profissão; semear e colher um produto que veio a ter venda garantida, apenas com dificuldades momentâneas num ano de excesso. Mas a transformação de mato em seara foi pronta e tanto bastou para criar um ambiente eufórico, que somente as leis inflexíveis da natureza vieram obscurecer, vingando-se por terem sido ofendidas.
Já alguma coisa se tem escrito sobre o problema, e decerto foi dito que nunca é fácil disciplinar, sem que se tomem seguras precauções, as forças económicas e sociais que se desencadeiam sem um perfeito conhecimento do meio sobre o qual incidem. Os que lembraram o risco da erosão nunca poderiam ser entendidos; os que lembraram a força moderadora e protectora da floresta traziam consigo uma visão, no momento, utópica. Se no País, sem indústria, a floresta nada produzia além da cortiça, pouco valorizada, carvão vegetal e suínos nada apurados, como resisitir à tentação de colaborar, com proveito imediato, numa política au-tárcica em relação ao trigo, em grande voga na Europa de 1929?

13. A «campanha de produção de produtos florestais» surge agora, ao fim de trinta anos, como o necessário e fatal complemento de uma campanha de
extensificação da cultura do trigo. No ponto de vista económico deixou de ser utópica, mas promete rendimento a certo prazo, por vezes largo de mais para poder ser entendida por todos. Daqui a invalidação do seu poder aglutinador de esforços e energias; daqui a sua situação obscura, não espectacular, que corresponde a um apelo ao bom senso, à inteligência de agricultores e proprietários prudentes, chamados a uma tarefa difícil, como muitas outras, de defesa do «bem comum».
Existem, portanto, dificuldades específicas nesta campanha, dificuldades de carácter psicológico e económico e, para além de tudo, apresentam-se problemas sociais que não podem deixar de ser ponderados.

II

Exame na especialidade

§1.º

Generalidades

14. O plano agora apresentado à Câmara Corporativa mostra que a unidade territorial escolhida para aplicação da Lei n.º 2069 foi a bacia hidrográfica. Sabe-se, na verdade, como são grandes os inconvenientes que resultam da falta de coordenação entre os trabalhos de defesa do solo e da água e as obras de aproveitamento hidroeléctrico e hidroagrícola.
Uma bacia hidrográfica onde se não tomem medidas de defesa contra a erosão, de que o revestimento florestal constitui, sem dúvida, o meio mais importante, põe em risco algumas das referidas obras, ameaçando as albufeiras de progressiva diminuição da capacidade de armazenamento, mercê do transporte de mais ou menos volumoso caudal sólido que fatalmente determinará o completo assoreamento.
Acontece, porém, que este problema, posto com grande acuidade nalgumas das nossas bacias hidrográficas onde se realizaram importantes obras de hidráulica, não determinou a escolha de prioridade na aplicação da Lei n.º 2069. Escolheu-se o Terges e o Cobres, afluentes do Guadiana, rio onde se projecta, é certo, um aproveitamento hidroagrícola de realização ainda distante: a barragem da Rocha da Galé, não incluída no II Plano de Fomento.
De outras obras já realizadas e em exploração pode dizer-se que se mantêm à mercê da erosão das encostas, como sucede em relação à obra da campina de Silves, Portimão e Lagoa, que, se não beneficiar de rápida intervenção, terá vida bem curta.
Não pretende a Câmara Corporativa sugerir outra prioridade, convencida como está de que um plano desta natureza tem de apoiar-se em elementos seguros, de organização morosa, de que se não dispõe em todo o País. E foi certamente essa circunstância que levou à escolha do Terges e do Cobres. Mas esta escolha não deve impedir que, de futuro, estes trabalhos possam ser devidamente coordenados.
Mas, como o problema do assoreamento das albufeiras é demasiadamente grave para permanecer esquecido, não