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ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 58 710

mais ou menos longinquamente fundadas em vagas disposições de lei e tiveram uma feição caracterizadamente regulamentar 1.
De qualquer modo, os perigos e inconvenientes da iniciativa parlamentar, no capítulo das receitas, vieram a ser, se não conjurados, pelo menos restringidos, primeiro pela Lei de 20 de Março de 1907 e depois pela «Lei travão», de 15 de Março de 1913, que proibiu aos membros das Câmaras apresentarem projectos de diminuição de receitas durante a discussão orçamental e consagrou a legitimidade do veto financeiro do Governo para os projectos de lei que, em qualquer momento diferente desse, diminuíssem as receitas.

8. Foi provavelmente tendo em couta o facto histórico de ns normas tributárias serem entre nós praticamente todas editadas pelo Executivo, quer no exercício de autorizações legislativas, quer no exercício da sua competência regulamentar, e considerando ainda, de um lado, a natureza especial das questões tributárias, de índole marcadamente técnica e especializada, e, de outro, a incúria parlamentar neste domínio como em outros, que na Constituição vigente se consagrou a competência concorrente da Assembleia Nacional e do Governo em matéria de impostos e de taxas 2. Neste domínio, tanto pode legislar a Assembleia Nacional como o Governo.
Os Deputados por seu turno, têm praticamente (nos termos do artigo 97.º) o poder de iniciativa ou de emenda restrito à criação de novos impostos ou taxas ou à alteração dos existentes, em termos de não ser diminuída a receita do Estado criada por leis anteriores. Quer dizer: não gozam de iniciativa para a diminuição das exacções fiscais. Nada impede, portanto, que apresentem na Assembleia projectos de lei ou propostas de emenda para a criação de impostos ou taxas.
Deve salientar-se que, mesmo quando se confiasse à Assembleia Nacional a competência de decisão em matéria de receitas, também não poderia caber aos Deputados iniciativa, para apresentar projectos de diminuição destes réditos fiscais, de acordo com um cânone mais ou menos admitida hoje no direito constitucional comparado.

9. Será aconselhável modificar agora este sistema de repartição dos poderes constitucionais entre a Assembleia Nacional e o Governo?
Há-de reconhecer-se que atribuir à Assembleia Nacional competência, em princípio exclusiva, para legislar em matéria fiscal corresponderia a desconhecerem-se ns realidades e, de toda a maneira, a fechar os olhos nos graves inconvenientes que tal medida poderia acarretar. As realidades, com efeito, são estas: em toda a parte onde há governos estáveis e eficientes a regra é serem eles a monopolizar a iniciativa fiscal, ficando aos deputados, como na Inglaterra, o papel de apoiarem as medidas legislativas propostas e a função de controlarem a actividade financeira do Executivo. De qualquer modo, a nossa tradição e, portanto, as realidades portuguesas são no sentido de, como se disse atrás, ser o Executivo a legislar em matéria tributária, com grande latitude, ficando ao Legislativo o papel de atribuir autorizações legislativas ou de consignar directrizes muito vagas à actividade regulamentar do Governo. A tradição portuguesa é no sentido, em suma, de fazer da função fiscal uma função predominantemente executiva.
Depois, o Governo poderia, durante o período de funcionamento da Assembleia, ter que se debater com a inércia ou com as demoras desta na votação das medidas tributárias julgadas indispensáveis ao interesse público. Porventura pior do que isso seria o facto de as medidas legislativas do Governo, tomadas fora do funcionamento efectivo da Assembleia, em caso de urgência o necessidade pública, terem de ser sujeitas a ratificação, nos termos gerais, não vigorando, claro está, então, as limitações do artigo 97.º da Constituição. Estaria, assim, aberto o caminho para a possibilidade de criação de desaconselháreis dificuldades à vida financeira do País, no mesmo tempo que se daria oportunidade à verificação de atritos indesejáveis entre o Governo e a Assembleia. De qualquer modo, na concepção constitucional portuguesa, o Governo tem e deve continuar a ter uma posição primordial na orientação da vida financeira do Estado. É esta posição que se pretende agora abalar e comprometer, sem vantagem que se possa reconhecer. É preciso não esquecer que, inclusive num regime de tão vincadas características parlamentares como é o inglês, o Parlamento tem, na matéria que estamos considerando, um papel secundário, pertencendo a função tributária primordial e realmente ao Executivo. Será o caso de devermos abandonar uma concepção para a qual outros fundamentalmente se orientam?
Esquece-se, aliás, muito facilmente, ao pugnar-se pela restauração da prerrogativa parlamentar em matéria fiscal, que o Governo é, por assim dizer, um órgão indirectamente representativo, na. medida em que se apoia na vontade de um órgão, esse directamente representativo e responsável perante a Nação, que é o Chefe do Estado.
Esquece-se também, por outro lado, que a Assembleia Nacional tem competência para se pronunciar anualmente sobre a cobrança de impostos estabelecidos por tempo indeterminado ou por período certo que ultrapasse uma gerência (§ 2.º do artigo 70.°) e, naturalmente, sobre os impostos a estabelecer por um período anual, na ocasião da votação da Lei de Meios. Os impostos criados no intervalo das sessões, para serem cobrados durante a gerência, serão com certeza excepcionais.
Por último, não se esqueça que a Assembleia, ainda muito recentemente, conferiu ao Governo autorização para proceder ao complemento da reforma fiscal em curso, reconhecendo assim, implicitamente, que, em matérias de tal melindre e tecnicidade, melhor será deixar a decisão final no Governo e aos técnicos de que possa rodear-se.

10. Tudo ponderado, a Câmara Corporativa entende não dever apoiar a inclusão da projectada alínea f) no artigo 93.º, e, consequentemente, pensa que tem de ficar prejudicado o § único que se pretende adicionar a este artigo.

11. Em princípio, a matéria dos vários direitos, liberdades e garantias individuais, enunciados nos diferentes números do artigo 8.° da Constituição, não é regulada em leis especiais, isto é, em leis que tenham esses assuntos exclusivamente por objecto, mas sim em leis gerais, ou seja em leis que se lhes referirão no quadro da regulamentação de matérias mais amplas com as quais esses direitos, liberdades e garantias individuais têm conexão. Ora, na maior parte das vezes, não se justificará que essas matérias mais amplas sejam disciplinadas em leis propriamente ditas. Seria anómalo exigir-se que, no estabelecer-se a regulamentação delas, se enviasse à Assembleia tudo quanto dissesse