1548 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 124
(...) a adaptá-los «progressivamente às necessidades que lhes cabe satisfazer» e levá-los «à defesa equilibrada dos interesses que integram», com a preocupação do assegurar o bem comum.
E que, como nesse relatório igualmente se assinalou, qualquer sistema político-social, mesmo quando alicerçado nas realidades da vida, não é coisa que se possa erguer de uma só vez, de um jacto e como um bloco, mas antes, diversamente, «se vai desenvolvendo e aperfeiçoando com o rodar dos anos e o esforço dos homens».
Decorridos dezasseis anos sobre o momento em que tais considerações foram feitas, ocorre naturalmente perguntar se as corporações carecem de aperfeiçoamento estrutural que lhes facilite a realização dos respectivos fins ou se as suas estruturas continuam a ser adequadas às necessidades actualmente sentidas.
A resposta a esta pergunta supõe, além do mais, que se tenham bem presentes os propósitos e finalidades associados aos mais altos organismos do sistema corporativo, ponto sobre o que é particularmente elucidativo aquilo que um determinada emergência escreveu o Prof. Marcelo Caetano:
... é a corporação que logrará legitimamente obter uma parcela do poder público para organizar, regulamentar, disciplinar, as actividades que reúne e engloba, punindo os seus desmandos, arbitrando as suas pendências, gerindo o seu património comum, representando-as na vida política e fazendo-as valer na legislação do Estado.
E também merece ser retida estoutra afirmação do actual Presidente do Conselho:
... a associação profissional e a corporação são o reduto em que o homem defende a sua personalidade e no mesmo tempo encontra o ampara necessário para multiplicar as suas forças na luta da vida moderna.
Deixando de parte outras incidências da concepção e propósitos atribuídos às corporações pelo Prof. Doutor Marcelo Caetano, recolho e assinalo como significativos pontos de referência extraídos do que fica transcrito, de um lado, a ideia de que é legítimo as corporações obterem «uma parcela do poder público» e, de outro lado, a ideia de que devem ser encaradas como constituindo o «último reduto em que o homem defende a sua personalidade e encontra o amparo necessário para multiplicar as suas forcas na luta da vida moderna».
Reportando-me ao primeiro dos referidos aspectos, pode pôr-se em relevo desde, logo a relativa falta de audiência directa das corporações, falta repetida e insistentemente lamentada nos mais variados sectores e emergências.
Direi, no entanto, que a pretendida audiência sempre será insuficiente, do ponto de vista dos princípios e no plano prático, para assegurar um mínimo razoável de participação no poder público, com significativos reflexos mis fundamentais actividades da legislação e administração do Estado.
Certamente que é altamente vantajoso o diálogo directo, regular e permanente entre o Governo e as corporações. Aliás, a defesa da iniciativa privada e a esperança que o Chefe do Governo nela deposita exige, como pressuposto indispensável, esse diálogo, que é o meio adequado e eficaz do mútuo esclarecimento e veículo de recolha de elementos, de enriquecimento de conhecimentos, com vista a decisões oportunas e ajustadas as realidades.
Por isso mesmo, ignorar a necessidade de tal diálogo é, do ponto de vista humano, frustrar o dirigente corporativo e, do ponto de vista institucional, aniquilar uma das dimensões que justificam a existência das corporações.
Mas se, como acentuei, a audiência das corporações não pode, só por si, concretizar adequada participação no Poder Público, também cumpre reconhecer, de outro lado, que essa participação, a nível mais profundo, não pode ser encarada na perspectiva individual das corporações, cada uma naturalmente ura tanto propensa a certa unilateralidade de juízos de apreciação, reflectindo o contexto específico e sectorial em que se insere.
Não pode mesmo ignorar-se realidade sociológica dos chamados grupos de pressão que em quaisquer quadros político-sociais sejam eles capitalistas ou liberais, fazem reflectir a sua força nos próprios órgãos institucionalizados de interesses.
Tais grupos como alguém observou, sugerem a ideia de «lutas travadas para tomar as decisões dos Poderes Públicos conforme nos interesses ou às ideias de qualquer categoria social».
Ora, tomando conhecimento absoluto da sua existência e até do seu mérito, pelo sentido de desenvolvimento que muitas vezes encerram, parece mais realista encará-los do frente, tratá-los com verdade e canalizar as forças de que são portadores para em conjunto servirem o bem comum.
Pois rotulemos os seus representantes, identifiquemos estes com os interesses que servem, em vez de, fingindo ignorar a sua existência, recearmos a sua influência em actos do Governo na tentativa de orientar o Poder, em atitude de certo modo semelhante à dos partidos que o tentam conquistar.
De qualquer modo, a aspiração à mencionada participação, com mais relevante significada, só se entende, por conseguinte, num plano em que possam ser confrontados os pontos de vista de todas as corporações na procura de soluções equilibradas em que sejam, ponderados todos os interesses e solicitações em causa, numa constante preocupação do respeito pelas superiores exigências do interesse público.
Tal síntese de solicitações e interesses não pode deixar de fazer-se no âmbito de um órgão próprio, que entre nós não necessita de ser inventado porque já existe precisamente, esta Câmara Corporativa.
Aliás, as exigências inafastáveis dos interesses económico-sociais são de tal ordem que, mesmo nos sistemas políticos que as pretendem ignorar em termos de organização, acabamos por encontrar assembleias consultivas de representação orgânica, como o Senado, previsto na Constituição Bávara do 1946, a Câmara Económica Superior da Benânia (Constituição de 1947), o Conselho Nacional de Economia e Trabalho da Itália (1943) ou o Conselho Económico e Social da Constituição Francesa de 1958, órgãos que citamos a título exemplificativo. A par destes, ainda encontramos assembleias deliberativas de representação orgânica, como o Senado Irlandês (1937), as Cortes Espanholas (1966), os vários Concelhos, Económico, da Educação e Cultura, para os Assuntos Sociais e da Saúde, da Organização Política prevista na Constituição Jugoslava de 1963, para não citarmos outras.
Nào nos permite o tempo que analisemos em profundidade as várias soluções adoptadas e apontadas.
No nosso caso o sistema corporativo é apresentado como meio de fazer a síntese equilibrada e eficaz das divergentes solicitações dos vários sectores da produção.
Dentro de cada sector essa síntese deve atingir a sua plenitude no plano mais elevado do sistema - ou seja nas corporações.