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110 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 115

Também penso que escaparemos à fome, não obstante a existência de alguns grémios e sindicatos; mas, a continuar esta propaganda a favor da criação dos coelhos e das galinhas, haverá uma cousa a que não poderemos escapar - é à peste.
Lisboa não é das cidades que se encontram em melhores condições de higiene, e basta ver a poeira que se deposita nos nossos chapéus para se fazer uma idea da atmosfera da capital.
Se, além disso, se instalar em cada janela uma coelheira e em cada saguão uma capoeira, não só há-de ser difícil arranjar alimento para os animais, como também veremos que não haverá saúde que possa resistir as consequências insalubres que o facto há-de originar.
Mas eu não quero ofender êsses propósitos; vou continuar: desejo apenas que o Sr. Ministro das Finanças se disponha a arranjar uma guarda fiscal reforçada que nos defenda não só sob o ponto de vista da economia nacional mas também da epidemia do «piolho verde».
Devo também agradecer ao Sr. Ministro das Finanças o ter acabado com uma cousa que se chamava «mercadorias em trânsito», mas que, afinal, não era senão uma protecção oficial ao contrabando. Não é preciso dizer porquê.
E, mais uma vez, insisto por que S. Ex. também só não importe de fazer uma pequenina despesa com lanchas-gasolinas, mandando pôr no rio Minho umas três ou quatro destas Lanchas, que fiscalizem aquela fronteira, para assim se acabar com o contrabando, o que é fácil, pois de um lado e de outro há interesse em fazê-lo, e muitos trechos do rio ficam em zona morta em relação aos pontos de vigilância.
Tenho ainda a fazer uma outra reclamação sôbre umas exigências a que serve de pretexto o decreto-lei n.º 31:203, de 1 de Abril de 1941.
Por êsse decreto cria-se ou restabelece-se a zona fiscal da fronteira, determinando-se no artigo 3.º:
Presumir-se-ão em contrabando ou descaminho, conforme os casos, as mercadorias que forem encontradas dentro da zona fiscal tal como é definida no artigo 1.º, sem ser acompanhadas do passe a que se refere o artigo 53.º da 2.ª parte do Manual, das Praças da Guarda Fiscal, aprovado por decreto de 23 de Agosto de 1888; na hipótese prevista no artigo 2.º, igualmente se presumirão em contrabando ou descaminho as que se dirijam à raia fora dos caminhos directos dos postos fiscais».
Não pude completar o meu estudo sôbre êste assunto, porque não encontrei, na biblioteca desta Assemblea, o Manual da Guarda Fiscal. É talvez uma edição esgotada.
No entanto, posso dizer que na fronteira de Valença, graças a êste decreto, toda a mercadoria, para poder transitar nessa zona de 4 quilómetros e que exceda o valor do 100$, necessita de uma guia da guarda fiscal que custa 2$50, além do tempo perdido e transtornos causados.
É uma perda de tempo e de dinheiro, e isto faz-se numa região em que as contribuições representam a terça parte do rendimento ilíquido e em que o comércio está também muito tributado e quási paralisado por lhe faltar o crédito comercial.
Como na lei se diz «presume-se», parece não estar bem que tudo se considere contrabando ou descaminho de direitos. O excessivo está bem em evidência.
Quere dizer: as receitas não têm senão razão para deminuir, ao passo que as despesas não têm tendência senão para aumentar.
Em matéria de tributação, nós temos obrigação de dizer ao Governo, visto que estamos em contacto com as classes tributadas, que o plafond está atingido. Para me servir de outra expressão: a propriedade minhota, sob o ponto de vista de encargos, está na carga de rotura; ou ainda, por outra imagem da rainha profissão: que a estaca está na nega; podem continuar abater-lhe, a cabeça esboroar-se-á, mas a estaca não entra mais; e é essa a razão de ser de algumas manifestações que se têm dado no Pais.
Não obstante toda a justificação literária que o nosso saudoso colega (saüdoso porque nos faz falta) e ilustre professor Dr. Mário de Figueiredo pôs nas suas considerações, eu continuo a supor que é possível que possam dar uma idea da situação as palavras que Hippolyte Taine põe no comêço de um dos seus volumes das Origens da França contemporânea.: «Sire, não é uma revolta, é uma revolução...».
Quere dizer, Sr. Presidente, se continuarmos assim, pode acontecer que o determinismo económico se junte ao almejado determinismo político dos nossos inimigos e forme um circulo vicioso desagradável, passando cada um a ser causa e efeito do outro.
Pedia, pois, ao Sr. Ministro das Finanças a abolição da exigência dos 2$50 a que há pouco fiz referência.
Há uma ou outra mercadoria em que existe realmente descaminho ou contrabando, acredito; mas que seja tudo contrabando ... não pode ser. Que senão possa mandar uma vaca, um touro, um boi a uma feira sem ir buscar primeiro uma guia à guarda fiscal, que custa 2$50, é que me parece extraordinário e estravagante. Pedia, pois, a S. Ex.ª que acabasse com isto.
Há uma outra cousa com que S. Ex.ª podia acabar, e que se baseia na chamada defesa dos interêsses do Estado. Quando os guardas fiscais fazem apreensões do sabão, por exemplo, a mercadoria é a seu tempo arrematada em leilão por preços bastante altos. Isto não deve suceder, porque, embora seja a favor dos interesses quantitativos e materiais do Estado, vai de encontro aos interêsses morais dêsse mesmo Estado.
Se foi o Estado que classificou de delito o assambarcamento e especulação, não faz sentido que proceda depois o leilão, pois que, ipso facto, vai proteger o assambarcamento e a especulação, que estão um para a outra como o caso da galinha e do õvo. Para haver especulação é preciso haver assambarcamento.
Desejava também que S. Ex.ª acabasse com isso.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - A próxima sessão será na quarta-feira, 28 do corrente, com a seguinte ordem do dia: discussão, em sessão plenária, do aviso prévio do Sr. Melo Machado, sôbre hidráulica agrícola.
Está encerrada a sessão.
Eram 16 horas e 39 minutos.

O REDACTOR - M. Ortigão Burnay.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA