4 DE FEVEREIRO DE 1942 157
Figuravam entre eles as obras de hidráulica agrícola, irrigação e povoamento interior.
Ia ter finalmente princípio de solução um problema dos maiores, senão o maior, de Portugal, como já dissera Sertório de Monte Pereira, problema que a monarquia liberal ensaiara, que a república parlamentar democrática abordara, mas que continuava quáse intacto. Nem admira que assim tivesse sucedido. Fomento hidroagrícola supõe investimento, ainda que a título transitório, de capitais avultados, e antes de 28 de Maio o erário estava exausto, os governos não tinham estabilidade que permitisse obra cuidada e fecunda nem liberdade de acção de conjunto que lhes facultasse atender só ao maior bem nacional.
Tendo estabelecido pela ressurreição financeira a condição sino que para resolver o problema e dispondo das demais por estarem na base da Constituição Política, o Estado Novo, com perfeito sentido das superiores conveniências nacionais, inscreveu o problema de fomento hidroagrícola entre os primeiros da reconstituição económica a realizar.
Transformada a proposta a que me referi na lei n.º 1:914, de 24 de Maio de 1935, numa das primeiras sessões de Janeiro de 1937 vinha a esta Assemblea, já com o parecer da Câmara Corporativa, que o Governo directamente solicitara, a proposta de lei de fomento hidroagrícola. Depois de largamente discutida, aqui foi convertida na lei n.º 1:949, de 15 de Fevereiro desse ano, só regulamentada pelos decretos n.ºs 28:652 e 28:653, ambos de 16 de Maio de 1938, respeitando o segundo especialmente às associações de regantes e beneficiários.
Como V. Ex.ªs sabem, o problema foi resolvido, esquematicamente, pelo modo seguinte: o Estado, por intermédio da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, estuda, realiza e custeia as obras de fomento hidroagrícola (aproveitamento de águas públicas ou particulares para rega, ennateiramento ou colmatagem; drenagem e enxugo de terras e defesa contra inundações; e adaptação ao regadio das terras beneficiadas); e reembolsado pelos proprietários ou utentes das terras das despesas efectuadas no prazo de cinquenta anos, por meio de uma anuidade fixa, a cobrar com a contribuição predial, á que se chama a taxa de rega e beneficiação» e que não pode exceder a mais valia resultante das obras efectuadas.
As despesas de exploração e conservação das obras ficam também a cargo dos beneficiários, que pagam ao Estado uma taxa anual denominada «taxa de exploração e conservação):
Executaram-se algumas das obras estudadas e aprovadas as de Magos, Cela, Loures, Burgãis e Alvega -, e, quando começaram a ser exigidas aos interessados as respectivas taxas, foi um coro unísono de clamores: as despesas feitas eram de tal monta diziam os donos dos prédios enxugados ou irrigados que as terras não podiam suportá-las, e ou se arrumavam com o pagamento ou lhas arrebatava o fisco pelas execuções. E dirigiram-se representações ao Governo, a imprensa fez-se eco das reclamações dos interessados e a opinião pública impressionou-se com a desventura dos homens a terra, a quem a sorte é adversa em tantas conjunturas.
Sr. Presidente: o nosso ilustre colega Sr. Deputado Melo Machado medularmente lavrador, em contacto permanente com. as canseiras e ás contingências da exploração- agrícola, e levado pelo que S. Ex.ª, com elegância, chamou «este jeito de olhar mais longe pelo interesse do País», julgou dever de consciência provocar nesta Assemblea o esclarecimento do assunto mediante a apresentação do aviso prévio que temos discutido.
E é de justiça registar que, até pela forma interrogativa empregada, S. Ex.ª o formulou com perfeito sentido do melindre do problema que o Governo de Salazar inscreveu entre os primeiros a atacar no plano da reconstituição económica e que o desenvolveu com inteiro conhecimento de causa, com elevação, e sem nunca deixar, como, aliás, é «eu costume, de ir direito ao fim proposto e de chamar as cousas pelos seus nomes. Das suas virtudes não é esta a menor. Daqui lhe dirijo os meus cumprimentos.
A Junta de Hidráulica Agrícola enviou a esta Assemblea, sobre a matéria do aviso prévio, uma informação que aqui tem sido apreciada, e o debate vai adiantado.
Do que temos ouvido poderemos tirar já algumas conclusões seguras?
Creio que sim.
A primeira é a de que a política de reconstituição económica que o Estado Novo tem desenvolvido e de que se ufana merece o louvor e a gratidão de todos nós e deve prosseguir.
A segunda é a de que a lei de fomento hidroagrícola, aliás aprovada por esta Assemblea, estabeleceu os princípios que o Governo julgou por então mais consentâneos cora as realizações que se propunha e que não parecem de condenar.
A terceira é a de que nem tudo tem corrido bem na execução da lei, de que tem havido faltas lesivas dos legítimos direitos e interesses dos proprietários ou utentes das terras.
A este respeito proponho-me versar especialmente um facto que, embora já tocado por alguns Srs. Deputados, ainda não foi considerado em todos os seus aspectos.
Quero referir-me ÀS associações de regantes, que constituem na mecânica da hidráulica agrícola uma das peças mais importantes.
Vejamos, Sr. Presidente, o que é e que funções tem a associação de regantes.
Nos termos da base IX da lei e dos artigos 1.º a 3.º do decreto n.º 28:653, é uma associação agrícola, a que pertencem obrigatoriamente os proprietários ou utentes das terras beneficiadas, dotada de personalidade jurídica, a cuja direcção preside um agrónomo dos serviços agrícolas do Ministério da Economia e a que também pertence um engenheiro representante da Junta de Hidráulica Agrícola.
As funções das associações de regantes suo muitas e muito importantes. Nos termos da citada base IX da lei e do artigo 6.º do também citado decreto regulamentar, nada menos do que dezasseis lhes são atribuídas e delas se destacam as seguintes: pronunciar-se sobre os planos de aproveitamentos hidroagrícolas e de exploração das terras formulados pela Junta e designadamente sobre as suas vantagens higiénicas, demográficas, económicas e sociais; propor as modificações convenientes aos referidos planos, para serem atendidas no que possa interessar ao seu maior aproveitamento paca a comunidade e para os associados; promover a exploração e conservação das obras efectuadas e dos aproveitamentos hidroeléctricos delas resultantes; pronunciar-se sobre os programas de trabalhos para a conservação das obras; efectuar o lançamento e cobrança da taxa de exploração e conservação e das outras receitas; propor as alterações no arranjo das propriedades beneficiadas pelos aproveitamentos e colaborar com o Ministério da Economia nos estudos e trabalhos necessários à realização dessas alterações. E não enumero mais para não enfadar V. Ex.ª
Para que as associações de regantes possam exercer 'estas e outras importantes funções, determina a lei que elas sejam constituídas logo que tenham sido aprovados os projectos definitivos das obras pelo Ministro das Obras Públicas, e para isso deve a Junta levar tal apro-