4 DE FEVEREIRO DE 1942 161
que adopta para a determinação desta, pratica que, de resto, é harmónica com o decreto-lei n.º 28:290, de 21 de Dezembro de 1937, que manda aplicar a base VI da lei n.º 1:949 às despesas de conservação pagas pela Junta Autónoma.
Mas a conclusão que se pretende tirar do princípio da base vi da lei n.º 1:949 e artigo 55.º do decreto n.º 28:652 quanto à desnecessidade da modificação do* princípio da incidência de todos os encargos somente sobre os proprietários é que me parece não ser legítima, e isto por duas razões: 1.ª, porque a comparticipação do Estado nos encargos, tal como a defendo, é um princípio de aplicação geral e permanente, derivado, por um critério racional, de justiça e até de sã moral, do facto de os melhoramentos hidroagrícolas terem também como objectivo e objectivo predominante o interesse económico-social, e esse objectivo subsiste sempre em qualquer caso, mesmo naquele em que os proprietários não tenham prejuízo com o pagamento dos encargos; 2.a, porque o que a lei proíbe e impede é que os encargos igualem ou excedam a locais valia, mas não proíbo nem impede que eles sejam tais que, com a minúscula diferença de alguns escudos, a absorvam, e, nesse caso, já que fica reduzido o benefício económico da obra para os proprietários? Quási a zero, porque ficam só com o rendimento que a terra lhes dava antes da obra, e os resultados desta constituem então somente o benefício económico-social para a colectividade.
Mas, então, presunto: se o proprietário não foi prejudicado, mas também não foi beneficiado tam infinitamente, pequena foi a diferença entre os encargos e a mais valia, o que é que justifica que ele pague ao Estado todo o custo das obras e ainda o aumento das contribuições? Se o Estado nada gastou em proveito do proprietário, com que direito é que lhe há-de exigir o custo da obra? j Se o proprietário depois da obra ficou na situação económica que já tinha antes dela, o que é que legitima a obrigação de pagar um benefício que não teve?
Nesse caso o reembolso do Estado não será o pagamento de uma dívida, roas uma pura doação; e se não pode negar-se-lhe o direito de exigir que lhe seja pago o que lhe for devido, nada autoriza a conferir-lhe o de exigir que o proprietário lhe faça essa doação.
Apoiados.
Vejamos agora, Sr. Presidente, o segundo defeito orgânico da lei:
Em tese, a todo o aumento patrimonial ou de riqueza corresponde aumento de rendimento colectável e, portanto, a ente, logicamente, um aumento de contribuição.
Mas precisamente deste postulado fincai deriva necessariamente como corolário que o aumento de contribuição só deverá verificar-se quando se verificar também o aumento de rendimento colectável, emquanto este último aumento não se verificar, não há matéria nova colectável, não ha base fiscal para u aumento do imposto.
Ora, se é certo que a horticultura ou as culturas arvenses, por exemplo, podem produzir aumento de rendimento logo no primeiro ano de exploração, outras há, como, por exemplo, a pomicultura, que demandam prazos mais ou menos longos para produzirem aquele aumento, não se justificando portanto que os proprietários, no segundo caso, passem a pagar o aumento da contribuição logo após a entrada dos terrenos em regadio, como exige a lei.
Trata-se, pois, nessa exigência, de um defeito orgânico da lei.
Passemos agora aos defeitos que chamei funcionou ou de execução da lei, do seu modus faciendi.
Haverá [pouco cuidado na execução cios orçamentos, visto que são sempre largamente excedidos? É a 2.ª pregunta do aviso prévio.
Por maior que seja a competência e previdência dos técnicos e o cuidado com que fazem as estimativas das obras que projectam, por muito que eles pontifiquem nas suas especialidades, não têm contudo o dom da infalibilidade, que é privilégio de outros pontífices, e sempre ou quási sempre os orçamentos de qualquer obra são excedidos na nua execução, por inevitáveis erros de previsões, por superveniente necessidade ou conveniência de modificações ou alimentos, etc.
A ultrapassagem dos cálculos orçamentais não é, pois, um facto especifico dos orçamentos de obras hidroagrícolas, pelo qual possa inteiramente responsabilizar-se sem injustiça a incompetência ou incúria dos técnicos, mas um facto comum ou geral nos orçamentos de todas as obras.
Há, porém, ainda nos orçamentos a que se refere o aviso prévio circunstâncias especiais muito para ponderar.
Quando foi criada a Junta Autónoma, em 1930, não havia ainda no País, pode dizer-se, postos hidrométricos faiara medição das quedas das chuvas, para medições dos caudais e coeficientes de escoamento, cadastros, inventários de terras irrigáveis, cartas apropriadas, reconhecimentos de locais para albufeiras, experiências e estudos apreciáveis, numa palavra, quási nada sobre que os técnicos pudessem trabalhar. E quando faltam esses dados fundamentais e certos, obtidos por informações e trabalhos morosos e de confiança, recorre a engenharia a previsões ultra prudentes baseadas em números baixas, que têm inconvenientes graves para a elaboração dos projectos e sua execução - são autorizados engenheiros que o afirmam.
E, pôsto que a Junta Autónoma fosse depois suprindo gradualmente essas lacunas, deviam ser ainda deficientes os materiais, estudos e quadros burocráticos quando teve de elaborar os seus planos.
Não dispunha a Junta de uma equipe ou elite numerosa de técnicos e por isso o decreto-lei n.º 22:786, de 29 de Junho de 1933, autorizou o Ministério das Obras Públicas a mandar, como mandou, missões d« técnicos da Junta Autónoma ao estrangeiro.
E não há no que deixo dito sombra de desprimor para os quadros burocráticos, cujo presidente sei que tem, pessoalmente, uma distinção natural «m nada inferior à sua alta distinção de ilustre professor « engenheiro, porque os 'especialistas, seja do que for, não se improvisam, não nascem por geração espontânea, não «urgem, feitos inopinadamente, de um jacto, como, se a minha memória não me trai, Marte surgiu, já armado com todas as insígnias bélicas, de um dos membros inferiores de Júpiter. Por outro lado, os serviços públicos da hidráulica agrícola só vieram a ter uma mais perfeita e a sua definitiva organização pelo decreto n.º 25:049, de 16 de Janeiro de 1935, completado mais tarde pela lei n.º 1:949, de 15 de Fevereiro de 1937, o pelo decreto n.º 28:652, de 16 de Maio de 1938.
Veria, pois, perfeita explicação, por todas essas razões, que os orçamentos das obras projectadas pela Junta Autónoma nesse período de transição viessem a carece de correcções ou modificações ulteriores, se é que delas careceram por esse motivo. Foi o que se deu com os primeiros melhoramentos hidroagrícolas em todos os países que os têm realizado. Mas, quanto aos orçamentos de que se trata, circunstâncias especiais se deram que devem ter sido a principal causa das modificações. É que só depois de elaborado pela Junta Autónoma foi mandado organizar o cadastro, de grande dispêndio, pelo decreto n.º 28:652; foram feitas expropriações ao» proprietários, que receberam, sem protesto,