O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

17 DE MARÇO DE 1944 245

cial que se preconiza, e julgo, Sr. Presidente o Srs. Deputados, que isto é fundamental, que constitue a maior aspiração das almas bem formadas e votadas ao desejo de bem-fazer e o traço dominante dos nossos sentimentos de povo cristão. Há ainda a considerar as quantias avultadas que provém da iniciativa particular, e que não poderíamos ir buscar a outras fontes de receita sem o risco de cairmos num estatismo condenável.
Mas pode objectar-se: à onde não chegarem as iniciativas particulares deixa de fazer-se assistência?
O diploma esclarece: aonde não chegarem as iniciativas particulares cabe ao Estado a sua função supletiva. Quere dizer: não deixa de praticar-se o plano integralmente; estimula-se a iniciativa particular e realiza-se em íntima cooperação com o existente o plano de conjunto.
Integra também o diploma as nossas Misericórdias no plano geral, com funções de coordenação de todas as modalidades da assistência concelhia, restituindo-lhes assim a sua missão tradicional.
Êsses organismos, pela forma modelar e pelos princípios elevados que os orientam, têm cumprido e são a melhor garantia para que a iniciativa particular não esmoreça e os corações generosos não receiem que as suas dádivas deixem de ter a aplicação humanitária que lhes destinaram. Sabem que os seus óbolos vão enxugar muitas lágrimas, aliviar muito sofrimento, mitigar muita fome e agasalhar muita nudez.
No norte do País, região que eu conheço melhor, pratica-se a assistência quási exclusivamente à custa da iniciativa particular, o que constitue título de orgulho para as suas populações. A Misericórdia do Porto é um exemplo. Mantém variadíssimos serviços hospitalares, maternidades, creches e lactários, dispensários, hospícios e ainda avultados subsídios. Pratica-se, portanto, a verdadeira assistência, baseada no amor do próximo, expressão magnífica da solidariedade humana.
Há um assunto para o qual desejo chamar a atenção da Assemblea e sugerir ao Govêrno a necessidade imperiosa de sua imediata resolução. É o problema da lepra, que no diploma não traz referência especial, como merecia pela sua importância e gravidade.
Existem actualmente - números oficiais - três mil leprosos, mas pode afirmar-se sem receio que tal número está muito longe da verdade. São muitos mais e andam por êsse País fora, nos transportes, nos hotéis, nas pensões, nos cafés, nas tabernas, nas escolas, em toda a parte, em suma, a disseminar o terrível flagelo.
Esta modalidade de assistência não é das mais caras. O que se torna necessário é enfrentar o problema com vontade de o resolver. Para melhor salientar tal necessidade chamo a atenção de V. Ex.ª para esta frase do distinto higienista Froilano de Melo: «Hoje são 3:000 amanhã pode ser qualquer de nós».
Isto é uma verdade flagrante e cometemos um erro, digo mesmo, um crime, continuando nesta passividade em face de tal assunto.
Vem a propósito lembrar idêntica campanha levada a efeito no Estado da índia Portuguesa por êsse eminentíssimo cientista que exclusivamente da iniciativa particular conseguiu angariar fundos bastantes para resolver naquela longínqua parcela do nosso Império o problema da lepra, e hoje é grato verificar-se que a sua leprosaria é uma das mais belas do Oriente, onde o leproso encontra carinho, tratamento e conforto.
Pratica-se a luta com energia mas com humanidade.
Guerra à lepra, paz ao leproso.
Não é possível isolar os 3:000 leprosos existentes, mas seria possível isolar os mais contagiosos e tratar os gestantes fornecendo-lhes, além de remédios, disciplina higiénica necessária, a fim de evitar o contágio dos sãos, que a maior parte das vezes são as pessoas das suas próprias famílias.
A lepra é hoje uma doença curável, quando no seu início, e é com certa emoção que eu relembro as palavras ainda deste mesmo cientista ao referir-me a um congresso realizado em Calcutá, em que foi apresentado o primeiro caso de cura.
Tratava-se de uma criança de 13 anos de nome Sybiil.
Diz êle: «Sybiil está curada! Está curada até quando? Deus o sabe».
Mas a verdade é que essa criança ia regressar ao ambiente da família, ia brincar com os irmãozinhos. Quanta satisfação não representa êste regresso à vida para aqueles que com paciência, com fé e com saber realizaram o milagre.
Conheço uma aldeia onde a mulher de um leproso era padeira e onde leprosos convivem numa promiscuidade criminosa com crianças e adultos e lavam as suas roupas infectas nos lavadouros públicos. Situação apavorante que é preciso remediar, porque, volto a repetir, aos 3:000 leprosos de hoje Deus sabe se se juntará amanhã qualquer de nós.
Nós encontramo-nos neste assunto atrasados sôbre nós mesmos cerca de sete séculos, como muito bem refere Rocha Brito, pois nos primórdios da nacionalidade tivemos modelares estabelecimentos de luta contra a lepra.
Temos serviços de assistência modelares, mas falla-lhes coordenação. A êsse fim visa a proposta governamental.
No entanto quero destacar de entre alguns generosos esforços que por êsse País se têm feito sentir os realizados no distrito de Vila Real, onde a assistência está integrada num vastíssimo plano bem delineado, já em grande parte funcionando eficientemente. Criaram-se creches, dispensários, jardins-escolas, escolas de artes e ofícios e escolas de donas de casa, hospitais e casas de anciãos, tudo em intima ligação. Falta apenas dar-lhes a assistência social no domicílio, com um corpo de enfermeiras-visitadoras e assistentes sociais, essas preciosas colaboradoras que constituem a base de toda a assistência bem orientada, no sentido da família.
Da apreciação do parecer verifica-se que há certas divergências na maneira de encarar a solução deste momentoso problema.
É um estudo notável, que não deixará de merecer do Govêrno a justa atenção quando for regulamentada a presente proposta de lei. Aqui deixo a minha homenagem aos seus autores.
O diploma, dentro dos princípios da doutrina corporativa e nos princípios cristãos da caridade, prevê a solução ampla do problema da assistência. O diploma traduz longa meditação, estudo e experiência.
Confio nas virtudes desta tentativa governamental e nos princípios que a orientam. Como Deputado e no uso de um direito, dou o meu voto ao diploma na generalidade e confio plenamente no êxito da sua realização. As obras valem pelo que valerem os seus executores. E eu tenho confiança absoluta no poder realizador do Govêrno, na actuação inteligente do Sub-Secretário da Assistência.
Existem, no entanto, dentro deste problema assistencial alguns aspectos, previstos no diploma, é certo, que me feriram especialmente a atenção, e são os que se referem à prestação da assistência por diferentes organismos, corporativos, particulares e públicos, dependentes de Ministérios diferentes e de cuja eficiente colaboração é lícito duvidar.
Parece-me, por isso, louvável a sugestão da Câmara Corporativa quanto à criação de um Ministério do qual dependessem todas as entidades que prestem assistência.
Seria de aceitar a criação do Ministério das Corpora-