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DIÁRIO DAS SESSÕES — N.° 168
Por outro lado, a rigidez do seu funcionamento e a falta de permeabilidade à evolução dos progressos científicos, que é defeito insanável de todos os monopólios, impediram-no de acompanhar as transformações económicas e de aperfeiçoar, como era mester, o seu equipamento técnico e os seus métodos de exploração.
As causas apontadas, a que veio acrescer a deslocação das actividades produtoras para os centros de grande consumo, criaram ao caminho de ferro uma nova situação.
Entretanto, os transportes automóveis, indiscutìvelmente mais flexíveis e, em certos casos, mais cómodos e mais económicos, tomaram em larga escala o seu lugar.
Essa concorrência dos dois meios de transporte veio agravar a situação, já precária, dos caminhos de ferro.
Os elementos estatísticos relativos ao período decorrido entre 1929 e 1935, que a Direcção Geral de Caminhos de Ferro publicou, ilustram de modo frisante a afirmação feita.
O número de passageiros baixou nesse período de 25.849:156 para 24.748:804. A receita correspondente sofreu também uma redução substancial.
De 136:476 contos ela desceu no mesmo período para 108:644.
Igual fenómeno se verifica na tonelagem transportada, que caiu do total de 4.393:520 toneladas para 4.075:709, com uma quebra na respectiva receita de quási 12:000 contos.
No conjunto a receita total baixou de 326:361 contos para 287:645 e os saldos de exploração de 42:669 contos para 35:376.
Os anos decorridos até à guerra confirmam a continuação da crise descrita e em nada alteram as conclusões que dos números citados podem extrair-se.
Mas, ao mesmo tempo que isto sucedia, os transportes automóveis atingiam um vertiginoso desenvolvimento.
Entre 1933 e 1944 o número de carreiras passou de 596 para 801 e os quilómetros de estrada servidos de 9:865 para 12:058.
Em 1939, isto é, no ano da eclosão da guerra, havia no País 798 carreiras de passageiros, de mercadorias e mixtas.
Estas carreiras utilizavam 1:300 veículos e serviam 11:606 quilómetros de estrada,
O número de passageiros, que em 1935 fora de 11.000:000, com a receita correspondente de 59:800 contos, elevou-se em 1939 a 21.479:931 e atingiu em 1943 o seu ponto mais alto, com 22.961:282, ou seja um número quási igual ao do caminho de ferro.
Apesar do seu valor como índices, estes números perderiam parte do seu significado se correspondessem, ao menos, a uma partilha racional do tráfego e traduzissem uma cooperação harmoniosa das duas actividades ao serviço do bem geral. A verdade, porém, é muito diversa.
Aproveitando-se da estagnação em que caíram os transportes ferroviários, do excessivo formalismo dos seus serviços e da rotina que presidia à sua exploração, o automóvel lançou-se numa concorrência desordenada ao caminho de ferro, disputando-lhe o próprio terreno que constituía zona reservada à sua aptidão específica.
Não é esta, como acentuei, a única causa da crise dos caminhos de ferro, mas constitue, sem dúvida, um dos factores que estão na base das suas dificuldades actuais.
A situação que descrevi basta, Sr. Presidente, para comprovar que, apesar dos esforços feitos, não se obteve ainda a necessária coordenação dos dois meios de transporte e que a relativa desorganização em que temos vivido reclama providências urgentes no sentido de se pôr têrmo a um estado de cousas que a ninguém aproveita e que só pode traduzir-se em prejuízo colectivo e em desgaste injustificável de elementos valiosos do activo nacional.
Mas se a concorrência deve ser substituída pela cooperação e se a desordem das actividades deve ceder lugar à uma coordenação salutar, parece-nos que a acção a desenvolver em tal matéria não deve ser de molde a proteger um dos sistemas, em detrimento de outro, ou a criar a qualquer das duas formas de actividade situações de favor ou de privilégio, condenáveis não apenas em face da pura ética, mas sem justificação suficiente no plano superior do interêsse nacional.
Vozes: — Muito bem!
O Orador: — Tem-se invocado, como razão justificativa de uma protecção especial ao caminho de ferro, o facto de êle constituir uma das parcelas importantes da riqueza nacional e de contribuir, pelos impostos que o oneram, com uma cota considerável para o conjunto das receitas públicas.
Não se contesta o facto, mas importa acentuar, em abono da verdade, que êle é igualmente exacto no que se refere à camionagem.
Numa interessante tese que elaborou e que oxalá seja dada à publicidade, pois constitue uma útil contribuïção para o estudo do problema dos transportes no nosso País, o Sr. Dr. Manuel Fernandes, funcionário superior da Direcção Geral dos Serviços de Viação, produz a êste respeito números que parece elucidativo divulgar.
Anteriormente à guerra o valor da rêde ferroviária portuguesa era avaliado em 2.500:000 contos e o material circulante, compreendendo os veículos de tracção e de rodagem, atingia o total de 11:638 unidades.
Por seu lado circulavam no País 47:000 veículos, cujo custo era computado em 1.410:000 contos.
A esta importância acresce o valor das instalações fixas e os capitais investidos no comércio da gasolina e outros produtos, cujo total foi recentemente calculado em cêrca de 2.000:000 de contos.
No que respeita ao pagamento de impostos, o argumento aduzido em favor dos caminhos de ferro não possue maior consistência.
O imposto ferroviário rendeu, é certo, no triénio anterior à guerra a média anual de 26:804 contos, mas as receitas arrecadadas pelo Estado no mesmo triénio e por motivo da circulação nas vias de comunicação terrestres atingiram por seu lado a média anual de 106:005 contos.
Se acrescentarmos agora que, devido à fraca densidade da nossa rêde ferroviária, apenas 2/5 do território nacional são servidos por comunicações directas por combóio e que os restantes 3/5, ou seja a maior parte do solo português, apenas dispõem de transportes por estrada, teremos completado o quadro, habilitando quem nos ouve a formar um juízo aproximado da posição relativa dos dois meios de transporte no conjunto da economia nacional.
Estes dados do problema não podem deixar de estar presentes no espírito do legislador ao procurar estabelecer, um sistema de coordenação.
Na verdade, coordenar transportes não é apenas evitar a sua sobreposição, através da demarcação de zonas económicas, reservadas a cada uma das actividades em presença de harmonia com as suas características técnicas e as suas especiais aptidões.
Coordenar transportes é mais alguma cousa.
Vozes: — Muito bem!