108 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 63
sublocação e pela possibilidade de provar a prescrição, quase todos os inquilinos que por qualquer forma negoceiam com a casa que arrendaram, embora o façam transgredindo o contrato de arrendamento.
Impõe-se que, além do contrato de sublocação o si constituir fundamento de despejo, todo o qualquer contrato que o inquilino faça, com quem quer que seja, que envolva alojamento remunerado.
b) O problema dos traspasses carece de ser modificado, por forma a evitar a continuação dos abusos que diariamente se vêm verificando.
Para fugir à actualização de rendas, que em casos de traspasses pode ter lugar, e às imposições fiscais, dissimulam-se os traspasses sob a forma de cedência de quotas, quer nas sociedades por quotas, quer nas sociedades em nome colectivo.
Adoptando-se, como se adopta, com larga frequência estes expedientes, são manifestos os prejuízos que disso resultam para o Estado e para o proprietário urbano.
c) Outro aspecto que importa modificar é o que coloca os prédios destinados a habitação como que em regime de enfiteuse perpétua.
Por força de lei, o direito ao arrendamento, por morto do arrendatário, transmite-se aos herdeiros legitimários, com excepção apenas dos que não tenham coabitado com ele nos últimos seis meses.
Daqui resulta que no direito ao arrendamento se sucedem tantos inquilinos quantas forem as gerações que provenham do inquilino originário. O arrendamento transmite-se assim ad perpetuum, permanecendo inalteráveis as suas condições.
Isto garante, sem dúvida, a estabilidade do lar; mas garante também, à custa do senhorio, um aumento do património do inquilino, que deixa aos seus herdeiros a diferença que vai da renda que a casa produz para a que devia produzir.
Para garantia do lar à custa do senhorio são já suficientes as demais restrições à liberdade contratual. A. transmissão do direito ao arrendamento ad perpetuum ultrapassa a medida da justa protecção à família.
d) Constituindo as disposições que regem a matéria do inquilinato medidas de excepção e de protecção ao inquilinato, em detrimento dos interesses do senhorio, devia ter-se adoptado, em relação aos estrangeiros, o regime de reciprocidade.
Na verdade, se circunstâncias de emergência podem impor ou aconselhar temporariamente o sacrifício dos interesses de uma classe de indivíduos, em benefício de outra classe, é de elementar justiça que aquele sacrifício reverta apenas a favor de portugueses, visto que são portugueses os que o suportam, salvo quando se verifique a reciprocidade.
e) Importa acelerar a marcha dos processos judiciais de despejo, designadamente quando fundados em falta de pagamento de rendas, e revogar o preceito do Código das Custas Judiciais que torna dependente do pagamento das custas em que o inquilino tenha sido condenado a execução de sentença que tenha decretado o despejo.
Esta disposição significa que quando o inquilino não efectua o pagamento das custas em que foi condenado, por ter sido vencido na acção, terá o senhorio, se quiser executar a sentença, de pagar as custas do processo em que não foi condenado, juntando assim ao prejuízo das rendas que não recebeu o encargo das custas.
Também não é razoável manter a favor do inquilino um regime de privilégio em matéria de recursos, pois que, ao passo que o inquilino pode sempre recorrer até ao Supremo Tribunal de Justiça da sentença que lhe for desfavorável em processo de despejo, o senhorio só o poderá fazer se o valor do processo o permitir.
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Nacional: o problema do inquilinato vem sendo debatido na imprensa, foi recentemente ventilado em sessão da Câmara Municipal de Lisboa, tendo sido observado com grande elevação por alguns Srs. Deputados na Assembleia Nacional na anterior legislatura.
Dada a justiça das aspirações contidas na presente reapresentação, onde se faz apenas a reedição do que em anteriores exposições se afirmou, e dada a publicidade que estes assuntos têm tido nos últimos tempos, pode afirmar-se que a opinião pública, reconhecendo a justiça e a oportunidade das reivindicações expostas, está preparada para aceitar de boamente as modificações ao regime de inquilinato que as circunstancias impõem.
A acrescentar à delicada situação em que se encontra a, propriedade urbana, surge agora a lei de autorização de receitas e despesas para o ano de 1947 (lei de meios), em cujo artigo 5.º, § J.º, se estabelece que o valor dos prédios urbanos para efeitos de liquidação de sisa ou do imposto sobre sucessões ou doações será o da matriz, acrescido da percentagem de 20 por cento.
Isto significa que nas transacções sobre prédios urbanos, quer por título gratuito, quer por título oneroso, a respectiva contribuição é agora agravada de 20 por cento, o que mais vem contribuir para a desvalorização da propriedade.
Esta nova circunstância, a somar à s anteriormente referidas, mais vem pôr em evidência a oportunidade do se procurar uma solução, ainda que temporária, para o problema do inquilinato.
A Associação Lisbonense de Proprietários vem perante V. Ex.ª, como digno Presidente da Assembleia Nacional, e perante os Srs. Deputados da Nação, como o foi perante o Governo, na pessoa do seu ilustre Presidente, pedir para o problema que expõe a solução urgente que ele reclama. Hoje a solução é ainda fácil. Se se deixar correr o tempo, a solução tornar-se-á muito mais difícil.
A Associação Lisbonense de Proprietários não pede que se decrete desde já a liberdade de rendas, pois bem compreende que, estando os principais produtos e serviços consumíveis sujeitos a tabelamento, não há razão para que as rendas urbanas o não estejam também. Mas pretende que esse tabelamento, como vem sucedendo para os outros produtos e serviços, e em face dos números-índices oficiais, seja ajustado à depreciação do valor aquisitivo da moeda e se estabeleça o princípio de que, de futuro, se deslocará, em períodos a fixar, com as flutuações desse valor.
Se, mercê da alta competência do Governo da Nação e das circunstâncias económicas, for possível reconduzir a situação económica e financeira da Nação ao ponto de equilíbrio a que os poderes públicos conseguiram levá-la antes da guerra, não haveria mal em restabelecer a liberdade contratual para as casas que então viviam nesse regime, estabelecendo-se uma escala de aumentos graduais de renda para as que já então estavam fora do regime da liberdade contratual.
Se, porém, se tornar impossível, pelo menos por algum tempo, o restabelecimento do equilíbrio antigo e até, possivelmente, tiver de aceitar-se um agravamento da situação actual, parece à Associação Lisbonense de Proprietários de mais elementar justiça que se integre a propriedade urbana dentro das condições do nosso equilíbrio económico, suprimindo a actual imobilidade das rendas e tabelando-as, como se faz aos principais produtos e serviços, de acordo com as flutuações do poder aquisitivo da moeda, determinadas pelas tabelas oficiais dos números-índices.
A bem da Nação. - O Presidente da Direcção, Visconde de Santarém.