398 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 80
A falta de pneus, que bastou para provocar grande e geral alarme, porque se traduzira em preocupadora crise de transportes, com grandes transtornos para a circulação de passageiros e de mercadorias, chegando-se quase ao bloqueio de povoações afastadas que não dispunham de outro meio para a deslocação dos respectivos habitantes, também se atenuou, embora se registe a opinião geral de que o poderia ser em maior grau se à sua importação e ao livre comércio dos pneus de fabrico nacional - que, é-nos grato afirmá-lo, já conquistaram boa fama, a qual se reflecte na sua crescente procura- não se opusessem entraves burocráticos, entre os quais, segundo é voz pública, figura o de se impor a aquisição de certos pneus estrangeiros aos que pretendem adquirir os de fabricação nacional, do que resulta a imobilização de grande stock daquele artigo, com inconvenientes de ordem técnica e financeira e, sobretudo, prejudicando-se a economia nacional, que absolutamente cumpre libertar, e quanto antes, de tudo quanto possa entravar a expansão das actividades.
Registam-se também dificuldades opostas à aprovação de novos serviços de camionagem de passageiros ou de mercadorias em regiões insuficientemente dotadas com meios de transportes, bem como a tolerância de utilização em serviços colectivos de veículos anacrónicos e desprovidos do mais elementar conforto, nos quais os passageiros são expostos às intempéries, por falta de vidros, e o desgaste dos órgãos mecânicos se traduz na irregularidade e risco das viagens, onde os horários raramente se cumprem.
Em algumas dessas carreiras é o arbítrio que fixa o preço do transporte de pequenos volumes, o qual, além disso, não é cercada das indispensáveis facilidades e garantias, como seria necessário para defesa dos interesses da colectividade, que tem o absoluto direito de exigir uma boa organização em serviços públicos que a lei beneficia com importantes privilégios.
E, se as consequências da guerra explicam muitas insuficiências, é geralmente sabido que o mercado já está em condições de preencher muitas faltas. A maior parte das irregularidades que o público vem pacientemente suportando resulta de defeituosa organização, que não seria difícil remediar, sem para isso se ter de recorrer ao estrangeiro ou de agravar a tesouraria do Estado com novas despesas.
Sr. Presidente: outras restrições vigoraram, mas foram-se atenuando, como a que suspendera a realização de exames de condutores de automóveis, mas de que a portaria n.º 10:880, de 28 de Fevereiro de 1940, exceptuou depois os candidatos à condução de motociclos o automóveis ligeiros para o transporte de passageiros em serviço não remunerado, e. mais tarde, a portaria n.º 11:373, de 1 de Julho de 1946, também exceptuou os candidatos a condutores de automóveis pesados, ficando assim a vigorar apenas para candidatos a automóveis ligeiros destinados a serviços remunerados.
Contudo, um fenómeno se tem verificado e, deploravelmente, ainda se manifesta, que é o da formação de intermináveis bichas nas direcções dos serviços de viação, notoriamente na desta capital, onde os pretendentes aguardam, por vezes, algumas horas para serem atendidos; são também obrigados a esperar meses seguidos a entrega de um livrete definitivo, tendo de circular com uns papéis provisórios, que precisam de ser chancelados periodicamente, sempre nas inevitáveis bichas e com perda de tempo precioso, papéis que não suprem a apresentação do livrete definitivo para diversas formalidades em que ele é legalmente exigido.
E as vistorias a automóveis? E os exames de condutores?
Quantos meses há que esperar antes que se seja atendido?
E a série de reprovações que lamentavelmente se regista no resultado dos exames?
Ouvi dizer ser agora corrente o recurso de os candidatos irem a Espanha, onde as provas de condutores são orientadas por outro critério, para ali fazerem o exame indispensável, e depois munirem-se com cartas internacionais para legalmente conduzirem veículos automóveis neste País, onde haviam sido reprovados.
Sr. Presidente: eu presidi cerca de quinze anos à Comissão Técnica de Automobilismo do Norte e sei, por experiência própria, que não é de tais excessos de rigor nos exames que resulta maior segurança na circulação de veículos automóveis, como não é com a exigência de absoluta integridade física dos candidatos a condutores que melhor se defende a regularidade do trânsito.
Por isso, quando me coube legislar sobre tão fundamental problema, ao publicar, em 1930, o Código da Estrada, ali se disse que as insuficiências físicas sómente poderiam impedir o candidato de obter carta de condutor quando se verificasse estorvarem-no de bem conduzir automóveis e que as provas a prestar nos exames seriam variáveis com as diferentes categorias de condutores.
Do prudente e esclarecido critério dos que houvessem de julgar os candidatos se confiava a conveniente aplicação daqueles princípios.
Uma decisão de que depende o futuro de quem precisa de servir-se do automóvel como instrumento de trabalho é da maior responsabilidade. Importa, por isso, só reprovar quando seja absolutamente indispensável fazê-lo.
Sr. Presidente: o que fica dito é apenas uma parte do panorama apreciado neste sector por quem observa as coisas como político, para averiguar se estão bem ou se há alguma providência a tomar em defesa dos legítimos interesses da colectividade.
Não é, pois, de espantar que o decreto-lei n.º 35:911, de 19 de Outubro de 1946, que reorganizou os serviços de viação, tivesse sido lido com particular satisfação por tantíssimas pessoas a quem o automobilismo directamente interessa.
É que no respectivo preâmbulo se promete remédio rápido e seguro para algumas das numerosas insuficiências que venho de apontar.
Eis alguns dos seus períodos:
Forçoso é, porém, reconhecer que a organização vigente dos seus serviços e os actuais quadros do seu pessoal não se adaptam já às condições do momento.
A razão está em que o constante desenvolvimento verificado desde então em matéria de transportes automóveis -e que, seguramente, se há-de acentuar cada vez mais com a progressiva normalização da situação criada pela guerra- trouxe aos serviços daquela Direcção Geral novos e apreciáveis encargos, a que urge fazer face.
Por outro lado, as crescentes exigências dos transportes públicos por estrada e a cooperação que àqueles serviços se impõe na realização prática da coordenação de transportes, em que o Governo se mostra empenhado, originam importantes problemas, que demandam urgente e segura solução.
Importa, assim, reformar a orgânica dos serviços de viação, dotando-os do pessoal indispensável e apetrechando-os dos meios necessários ao cabal desempenho da importante missão que lhes compete.
Sr. Presidente: «Tardou mas chegou» - foi o comentário que então ouvi. Não pretendo comentar por agora o critério que orientou neste diploma a limitação das áreas atribuídas às diferentes direcções de viação, e que obrigará os interessados residentes a poucos quilómetros