912 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 106
criados para julgar, punir ou absolver os responsáveis em contendas desta natureza!
Elaborado o relatório, a comissão de inquérito resumiu-o em várias conclusões.
A primeira é a de que o sistema sai desta devassa, levada até às últimas extremidades, inteiramente salvo.
Os princípios foram excelentes, são excelentes, continuarão a ser excelentes; servidos por homens que. os saibam interpretar, que queiram actuar dentro da doutrina que os informa, satisfazem por completo às necessidades e aos interesses nacionais.
Há, sim, que reprimir os que não compreenderam a alta função em que foram investidos, ou que meter na ordem os que, tendo compreendido essa função, dela abusaram e abusam, assumindo atitudes de tiranetes ridículos, umas vezes inacessíveis, outras de repulsiva má educação.
E, acima de tudo, há que contrariar certas ampliações de funções, que uma situação excepcional de guerra até certo ponto justificaria, mas que a partir da aproximação da paz se encontram deslocados ou, o que é pior, sem finalidade.
Com independência e clara concepção das circunstâncias a comissão de inquérito indicou sucintamente os principais erros, os principais desnivelamentos, desorientações ou abusos que teve ocasião de constatar.
Voltando um pouco atrás e em confirmação de que os vícios não são do sistema mas de alguns dos homens seus servidores, direi que não sou agricultor, nem industrial, tendo feito toda a minha vida completamente afastado de situações do Estado, no exercício exclusivo e restrito da minha profissão.
Pode, por consequência, haver exagero naquilo que vou referir; mas precisamente porque estamos aludindo aos princípios, e o princípio averiguado pela comissão de inquérito foi o de que o sistema em si continua ileso, reputo oportuno informar V. Ex.ª de que, ainda não há horas, um dos maiores lavradores da nossa terra me garantiu que determinada comissão reguladora exerceu a sua actividade por forma a permitir que este País realizasse nos anos de seca, de carência absoluta de adubos e num período de racionamentos e tabelamentos confusos, sucessivas colheitas de arroz que teriam sido impossíveis se essa comissão não houvesse garantido aos ranchos que trabalhavam nos arrozais do sul do País o abastecimento indispensável.
Deste facto se concluo que sempre que houve um organismo que soube satisfazer a função, apoiar os seus agremiados, servi-los no momento oportuno, orientá-los, suprir-lhes as faltas, exercer junto do Poder Central aquela acção indispensável para em momentos de crise evitar faltas e dificuldades por vezes quase insuperáveis, desde que houve organismos que conseguiram com perfeita isenção e absoluta fidelidade executar até final o sen objectivo, o sistema resultou perfeito.
Evidentemente que a comissão de inquérito tem razão, tem carradas de razão quando em seguida se alonga em discriminar razões de queixa que, por isso mesmo que andam na boca e na consciência de toda a gente, merecem desta Assembleia Nacional uma providência que conduza ao seu rápido aniquilamento.
Em primeira linha avulta a desurbanidade ou a petulância de certos funcionários de alguns organismos corporativos ou de coordenação económica.
Perco me raras vezes nessas paragens. Não posso, por conseguinte, depor pessoalmente; mas são às dúzias, às dezenas, às centenas as queixas que tenho ouvido de pessoas que no uso do seu direito se dirigem ao organismo que sustentam com as suas quotizações para dele receberem serviços e ai são acolhidas como elementos indesejáveis, obrigadas a esperar horas sobre horas, a lançar num papelinho o objecto da entrevista que solicitam do grãmanitu, que se mantém fechado a sete chaves num gabinete mais alto que a torre de marfim, ao ponto de na maior parte das vezes desistirem e resolverem por si próprias as dificuldades, visto que a entidade criada para as apoiar, acolitar ou defender esquece imperdoàvelmente o cumprimento dos seus deveres.
Sabemos todos, também, que nestes últimos anos muitas das moradias de Lisboa foram adquiridas por organismos de coordenação económica ou organismos corporativos, a fim de nelas instalarem faustosamente as suas repartições.
Objectam-me que esta censura carece de fundamento, visto ser fácil fazer a prova de que a maior parte dessas aquisições foram feitas a preços inferiores, pelo que, com a desvalorização da moeda, se hoje se proceder à revenda desses prédios luxuosos hão-de obter se cifras bastante superiores às despendidas como preço de aquisição.
A isto serenamente oponho que não é função dos organismos corporativos ou de coordenação económica funcionarem como agentes de compra e venda de propriedades ...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ...A isso oponho que o Estado, numa orientação de economia, mantém modestamente instalada a quase totalidade dos seus serviços. A isso obtempere, por último, que contrastam impressionantemente e desagradàvelmente as instalações dos serviços da Nação e a riqueza, o luxo de alguns desses organismos corporativos ou de coordenação económica.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mais: a comissão de inquérito oferece no seu relatório quadros que representam um valioso elemento de estudo para esta Assembleia.
Destaco de entre eles o quadro III em relação ao quadro V, e o quadro IV em relação ao quadro VI.
O quadro III refere-se ao número de dirigentes de organismos da espécie de que estou tratando.
O quadro V diz respeito às despesas com os honorários desses dirigentes.
O quadro IV refere-se aos números representativos do pessoal dos organismos de coordenação económica.
O quadro VI diz respeito às despesas com remunerações desse pessoal.
Comparando estes quadros, vê-se que em 1945 havia 1:028 dirigentes de organismos corporativos ou de coordenação económica, que recebiam por ano 7:399.163$ como honorários, e que havia, nada mais nada menos, do que 9:937 empregados recebendo 119:493.983$.
São excessivos os salários?
Para o pessoal a capitação anda ao redor de 12 contos anuais, para os dirigentes algum tanto menos, o que desmente a campanha, profusamente difundida, de que são ordenados de autênticos nababos os pagos nos. organismos corporativos e de coordenação económica!
O Sr. Mário de Figueiredo:-V. Ex.ª dá-me licença?
Eu creio que V. Ex.ª calculou mal a capitação. Não quero significar com as minhas palavras que de um modo geral os dirigentes recebem mais do que isso.
Quero informar V. Ex.ª e, desde este momento, a Assembleia, de que há organismos, como os grémios da lavoura, em que os dirigentes recebem o que se chama uma autêntica ridicularia, há dirigentes que não recebem nada, como são os dos chamados e grémios do comércio», e, em geral, dos grémios facultativos. Ficam os dirigentes dos organismos de coordenação económica e dos grémios obrigatórios.
Faço esta nota sem deixar ao mesmo tempo de sublinhar que nem eu nem a comissão consideramos ou con-