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10 DE MARÇO DE 1948 297

E Heliodoro Salgado teve na revolta, como elemento preponderante, um seu irmão.
E isto afoita-me a, sem agravo, reproduzir o que Ramalho Ortigão escreveu, pouco depois, na Gazeta de Noticias, do Rio de Janeiro:

À passagem do motim abriam-se sucessivamente para a rua as janelas dos prédios, a que assomavam, estremunhadas, as cabeças dos moradores, surpresos e atónitos, e lenços brancos acenados por entre as persianas davam os bons dias aos guerrilheiros madrugadores, os quais, em sábado magro, recordavam, pelo pitoresco da aventura, as luzidas cavalhadas que tão afamado tornaram outrora o Carnaval portuense.

Mas o tempo escasseia. Vejamos rapidamente o que seriam os resultados do. triunfo do episódio de 31 de Janeiro de 1891. O meio mais seguro e valioso está nos testemunhos da época. Testemunhos importantes e insuspeitos a demonstrar que a da ta indevidamente comemorada deve ser esquecida.
Na Revista de Portugal, que Eça de Queirós dirigiu, Oliveira Martins, sob o pseudónimo de «Spectator», escreveu:

Pensa alguém, com dois dedos de juízo no cérebro, que a supressão do trono suprisse os homens e os seus vícios, fazendo brotar do chão outros portugueses diferentes do que somos? É insensato.
Na hora em que uma república se proclamasse em Portugal, nesse próprio instante transporiam a fronteira os exércitos hespanhóis. Ninguém contesta este facto.
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Contra estes argumentos pode haver declamações, invectivas, injurias; argumentos não há.
Força é reconhecer, portanto, que só há momento em que a implantação da República seja a consumação da catástrofe, esse momento é o de agora. Perderíamos ao mesmo tempo as colónias e a metrópole, resvalando de chofre na agitação da anarquia em que morreram miseravelmente as nações apodrecidas.

E em local citado por seu sobrinho, o ilustre escritor Dr. Francisco de Oliveira Martins, o historiador afirmou que a mudança de regime implicaria em Portugal conflitos de natureza externa que afundariam a ordem pública e com ela a independência política e a liberdade pessoal.
É insuspeita a opinião deste homem ilustre, que, como poucos, se indignou com a tirania do ultimatum e do tratado de 20 de Agosto.
Luís de Magalhães - que, levado pelos seus sentimentos patrióticos justamente alarmados, acreditara ingenuamente no sucesso da Liga Patriótica do Norte, de que fora um dos fundadores-, disse que o triunfo da revolução originaria inevitavelmente a violência de uma invasão espanhola, porque Canovas não a toleraria ao pé da porta.
Aqui, no Parlamento, em sessão de 3 do Março de 1891, o Deputado republicano Latino Coelho, embora se manifestasse contra a proposta de felicitações a El-Rei pela jugulação da insurreição, chamou calamidades às revoltas ou guerras civis.
E na sessão de 14 de Março de 1891, portanto mês e meio depois do acontecimento, Augusto Fuschini, político inteligente e arguto, e notável financeiro, depois de dizer que não lhe repugnava a transformação das instituições da forma monárquica em republicana, afirmou:

A questão está em saber o que melhor corresponde, num dado momento, aos interesses morais e materiais. Hoje, porém, no grave momento histórico que atravessamos, a menor comoção política seria perigosíssima. Se a transformação política era. um erro sob o ponto de vista nacional, neste momento seria, a meu ver, ainda mais grave erro sob o ponto de vista internacional. Pequeno país encravado numa nação regida pela Monarquia, a República em Portugal podia ser também seguida da ameaça de 40:000 espanhóis na fronteira, se não sofrêssemos também ainda a vergonha de uma manifestação naval nas águas do Tejo.

Por isso, a Câmara Municipal do Porto, numa mensagem dirigida a El-Rei, disse: «Uma parte da guarnição praticou o maior dos atentados contra a Pátria».
Muito e muito mais podia referir; mas, para finalizar, basta dizer que António Cândido, a Águia do Marão - cujo busto ainda não vemos no átrio desta Assembleia, no lugar que parece destinado aos grandes oradores e já não está deserto - António Cândido declarou, na sessão de 6 do referido mês de Março, - que a rebelião «ficaria assinalada para sempre como uma data fúnebre na história do nosso País».
Pois, Sr. Presidente: é esta data fúnebre que ainda se celebra em Portugal cinquenta e sete anos depois! Uma derrota; passo triste de uma história tão recheada, de grandes feitos, que ilustram oito séculos de nacionalidade.
Celebra-se o dia 31 de Janeiro e estão excluídos das nossas galas o da fundação de Portugal, o da independência, os da nossa grande epopeia marítima, o de 28 de Maio e outros!
Não, não deve ser.
Dir-se-há - há sempre que dizer: «O 31 de Janeiro consagra os precursores da República». Mas nem assim se presta louvor e justiça aos que o foram na propaganda e nas ideias, porque estes, na sua maioria, não se envolveram na aventura que liquidou em poucas horas; e antes foram discordantes, ostensivamente discordantes. Os seus nomes não foram incluídos no Governo provisório que Alves da Veiga proclamou das janelas da Câmara Municipal. E dos indicados, os mais marcantes, como Rodrigues de Freitas, apressaram-se a declarar no julgamento que não tinham autorizado a inclusão do seu nome. E José Falcão disse um dia a Oliveira Martins: «Se a Monarquia nos pode salvar, faça-o».
É que este homem de bem e alguns outros eram, antes e acima do tudo, portugueses.

O Sr. Homem de Melo: - Muito bem!

O Orador: - Sem embargo, pelo facto de ser abolido o feriado os precursores da República, como as vitimas, não deixam de ter a consagração merecida. Dos primeiros, os que foram sinceros têm-na na gratidão dos republicanos e no respeito dos adversários, e os seus nomes andam pelas praças, ruas- e avenidas; as segundas, além da misericórdia de Deus e dos homens, têm a sua memória consagrada no monumento votivo do Prado do Repouso. Se lá passar, descubro-me.
Querer hoje mais não é homenageá-los. É exploração dos vivos, especulação demo-liberal, como pretexto para a apologética de uma República velha, já morta também. E morta por eles.
Sr. Presidente: a rebelião de 31 de Janeiro de 1891 foi antinacional, antipatriótica. Disseram-no os da geração do tempo; por maioria de razão podem dizê-lo os da geração de hoje, com o saber de desastrosa experiência feito.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Que mais é preciso, além do exposto e do que, por brevidade, omito? Querem outra prova?
Pois bem: tenho-a presente.