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310 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 134

Dias depois realizou-se em Lisboa uma sessão magna na sede da Maçonaria.
Não tinha outro fim senão a congratulação pela publicação do diploma, que tinha bem marcado no seu texto o selo do triângulo maçónico ...
Afonso Costa apareceu, foi muito aplaudido e justificou a lei da separação com todos os argumentos do laicismo triunfante:

Está admiravelmente preparado o povo português, disse aí, para receber essa lei; e a acção da medida será tão salutar que em duas gerações Portugal terá eliminado o catolicismo, que foi a maior causa da desgraçada situação em que caiu...

Os aplausos reboaram pelo salão maçónico, mas a história, felizmente, não deu realidade à macabra profecia. Agrava-se a situação e atinge o auge a luta com os prelados; o seu célebre protesto colectivo enfurece o Poder.
À luta prolonga-se e a guerra mundial arrasta-nos para o turbilhão sangrento.
Surge então Sidónio, que acalmou com a sua política de entendimento com a Santa Sé os espíritos exacerbados, indo ao encontro de certas exigências justificáveis.
Fez-se muito então, mas ainda assim tudo quanto se fez não correspondeu plenamente ao que reclamava a consciência religiosa do País.
Nesse tempo organizou-se o Centro Católico, por considerar-se de bom conselho a intervenção da Igreja na vida política da Nação, formando um partido próprio para defesa dos seus direitos postergados. Em certa altura é apresentada à consideração da Câmara dos Deputados e do Senado, pelos leaders. católicos, respectivamente Dr. Lino Neto e cónego Andrade, uma moção de homenagem ao Sumo Pontífice Pio XI, por passar o quarto aniversário da sua eleição. A moção foi aprovada por unanimidade. Estávamos já em 1926.
O facto passou-se a 6 de Fevereiro, a poucos meses, portanto, da eclosão do movimento libertador do 28 de Maio.
Nesse mesmo dia realiza-se à noite na Sociedade de Geografia uma memorável -sessão de homenagem ao Vigário de Cristo.
Quem vai presidir à sessão? Bernardino Machado, Chefe do Estado. É um dos oradores. Ao encerrar a sessão falou e disse, entre outras coisas, que, «graças ao espírito de concórdia com que Sua Santidade tem concorrido para que se estabeleça a paz entre os portugueses, nunca mais será possível em Portugal um conflito entre o poder religioso e o civil. Acertou na profecia.
Mas houve um orador oficial, também alto expoente da democracia e da República-Cunha Leal, chefe do partido União Liberal.
Vale a pena registar algumas das suas afirmações:

Sou filho de pais católicos e fui educado catolicamente. O estúpido racionalismo do século passado, desvairando os cérebros da mocidade, desvairou o meu. Morreu a crença mas ficou sempre no íntimo do meu próprio ser um fundo de religiosidade e de atavismo católico, que o decorrer dos anos vai, cada vez mais, fixando em mim, como se, para me salvarem, todas as forças do passado se lançassem ao assalto da minha consciência. Quantas vezes, junto ao leito dos meus filhos doentes, eu tenho pensado que a graça, esse dom de Deus, poderá, com o seu clarão divino, iluminar de repente a negrura da minha dor!

Preciosa confissão esta dos erros passados. Os tempos eram outros. Estávamos já bem longe do jacobinismo demagógico dos primeiros anos do regime...
A opinião pública, cansada das violências e dos perigos do racionalismo que inspirava a obra inicial da República, evolucionara.
Sr. Presidente: quero com estas palavras e com este bosquejo histórico apenas manifestar à Assembleia quão longe estamos desse espírito jacobino que ilustrou tristemente a obra revolucionária da República e a que a revolução de 28 de Maio pôs definitivamente termo, restituindo ao País as suas tradições históricas, profundamente cristãs.
A revolução de 28 de Maio é pois uma revolução bem diversa nos seus fundamentos e nas suas intenções da de 5 de Outubro. Bem ao contrário. Procurou desenraizar dum jacobinismo feroz o Governo da Nação e fazê-lo assentar de novo nas bases antigas da sua tradição.
É nesse sentido orientador da revolução que foi apresentado este projecto de lei. Ele satisfaz inteiramente a consciência católica do Pais, que há muito o reclamava.
Este projecto, ou na fórmula do autor ou na outra fórmula, a da Câmara Corporativa, vai perfeitamente de encontro a essas aspirações e às necessidades nacionais e até internacionais do momento que passa, satisfazendo estes anseios de espiritualidade, que são um grito universal de regresso ao que um século de desvairo fez perder e que deflagrou no materialismo da hora actual.
Sr. Presidente: vou concluir, dizendo a V. Ex.ª que na discussão na especialidade terei de fazer ainda algumas considerações.
Desde já posso afirmar que aceito qualquer das propostas apresentadas, com excepção da do Sr. Dr. Antunes Guimarães, pois não concordo com a sua proposta de eliminação há pouco apresentada.
Quanto à faculdade de dar ao Estado a possibilidade de fixar com a Santa Sé um entendimento com respeito a feriados, não poderá conseguir-se isso mesmo aprovando o texto da Câmara Corporativa?
Há alguma coisa que o impeça?
Não há. Se houvesse não iria para esse caminho.
Não me parece que, uma vez aprovada a fórmula da Câmara Corporativa, fique inibido o Estado de um entendimento para qualquer redução possível do número dos dias santificados. A Câmara Corporativa fixa um princípio: o de o Estado incluir nos feriados os dias santificados, e mais nada.
O seu número pode ficar dependente de acordos posteriores.
Sr. Presidente: creio ter feito as necessárias considerações sobre o essencial deste diploma, desejando que ele, uma vez aprovado aqui e transformado em lei, vá na realidade dar plena satisfação à consciência nacional, essa satisfação que ela há muito tempo deseja que lhe seja dada.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprir alentado.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão será amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia, isto é, a continuação da discussão do projecto de lei do Sr. Deputado Mendes de Matos.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 5 minutos.

Srs. Deputados que entoaram durante a sessão:

Álvaro Eugênio Neves da Fontoura.
António de Almeida.
António Maria Pinheiro Torres.