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30 DE NOVEMBRO DE 1950 71

Da Presidência do Conselho pedindo seja promovida a pronta distribuição do Diário das Sessões e a rápida entrega nos Ministérios a que se destinam de documentos apresentados à Assembleia Nacional sobre os quais possam ser necessários quaisquer esclarecimentos por parte dos mesmos Ministérios.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Magalhães Ramalho.

O Sr. Magalhães Ramalho: - Sr. Presidente: fez no passado dia 10 deste mês seis anos que nesta Casa se iniciou - com uma altura digna das suas melhores tradições - o estudo de um problema cuja oportunidade e transcendente alcance nacional creio que já ninguém hoje discute, mas que, estou certo também, só as gerações futuras - com aquele ângulo e transparência de visão que o tempo usa dar à apreciação das grandes realizações - verdadeiramente poderão vir a apreender, na beleza e plenitude das suas perspectivas.
Muitos de VV. Ex.ªs que aqui estão terão participado nesse debate, numa época em que, apesar da guerra - ou até talvez por causa dela!-, o conteúdo da consciência de muitos homens era então outro e em que a dura experiência das realidades - a grande mestra da vida - não tinha ainda vindo pôr em foco, com a crueza com que o fez depois, o amoroso cuidado que nos devem merecer alguns pontos fracos da nossa modesta economia.
Estou-me referindo, Sr. Presidente, à proposta de lei da electrificação do País, com que culminaram - numa síntese de ideias mestras que considero felicíssima - a teimosa e agitada campanha, de mais de duas dezenas de anos, de um punhado de técnicos, talvez por vezes irreverentes, mas verdadeiramente apaixonados pela grandeza da sua terra, e uma fase brilhante da obra política de uma grande figura de Ministro e parlamentar.
Recordando esse facto eu desejo antes de mais nada prestar as minhas mais calorosas homenagens ao político habilíssimo que tão bem a soube promulgar como Ministro e defender como Deputado - o Sr. Dr. Rafael Duque - e ao engenheiro ilustre -o Sr. Prof. Ferreira Dias - que por ela tão galhardamente se bateu e teve a rara felicidade, que a vida a poucos concede, do ajudar a plasmar, por suas próprias mãos, como Subsecretário, o que havia sido o seu sonho de tantos anos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Já lá vão seis anos, Sr. Presidente, e parece que ainda foi ontem! Ao recordar todo o caminho andado nesse tempo - com todos os seus insucessos, hesitações e vitórias - eu creio que a Nação terá o direito de criticar alguns erros cometidos; não poderá, porém, duvidar jamais da capacidade realizadora dos seus técnicos e administradores, quando se seleccionam com escrúpulo os homens e se lhes asseguram as condições materiais e morais adequadas ao exercício das respectivas funções.
Atrever-me-ei mesmo a dizer que no que está já realizado se materializaram tão vivamente as nossas qualidades e defeitos como homens de acção que só tenho pena de não ter os méritos nem o poder persuasivo de um bom escritor para fazer chegar a lição desse exemplo ao mais recôndito da alma de todos os portugueses
- sobretudo dessa mocidade que nos há-de seguir - e torná-los bem conscientes de qual tem sido, quase sempre, a causa fundamental dos nossos insucessos, hoje como através de toda a nossa história: onde há verdadeiros chefes, e com eles a fé, removem-se montanhas ou cruzam-se mares desconhecidos, mas damos sempre ao Mundo, mesmo sem grande experiência anterior, verdadeiras lições de exemplar realização.
Onde aqueles ou aquela faltam, os mais simples empreendimentos oscilam, num ondear constante de hesitações e de erros, e, para que ao menos terminem num tempo que nos não envergonhe muito, há que usar de preocupações de campeonato, sempre indesejáveis e perigosas em qualquer tarefa, muito particularmente naquelas em que entram em jogo as forças cegas e dificilmente domáveis da natureza!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: vem tudo isto a propósito de irem entrar muito brevemente na sua fase final de experiências partes importantes do apetrechamento das centrais hidroeléctricas do Zêzere e do Cávado-Rabagão e das primeiras grandes linhas a 150:000 volts, que, partindo daquelas centrais, hão-de fazer o transporte - de início só para Lisboa e Porto - da respectiva energia eléctrica aí gerada.
A primeira dessas centrais deverá vir a ser inaugurada com um avanço de um a dois anos sobre a data prevista para a respectiva efectivação e com um dispêndio total da ordem dos 600:000 contos, incluindo expropriações dos terrenos alagados, material dos estaleiros, comparticipação na Companhia Nacional de Electricidade, etc.
Ficará preparada, quando completamente equipada, para uma produção anual da ordem dos 300 milhões de kilowatts-hora de energia permanente. Apesar de ser considerado o empreendimento mais difícil desse género até hoje realizado no País, julgo que se cumpriram em relação a ele, e até algumas melhoraram, grande parte das previsões que inicialmente haviam sido feitas sobre o mesmo, e em termos tais que se não receiam confrontos com os resultados a que se tem também chegado em países estrangeiros em trabalhos similares aí ultimamente realizados.
Pena é que igual orgulho se não possa ter com respeito à 1.ª fase do aproveitamento Cávado-Rabagão, que, não obstante ter sido de começo considerado como mais simples, mais rápido e mais económico, acaba afinal por se realizar em condições totalmente opostas, por motivos que não vêm agora para o caso aqui apreciar.
Basta que se saiba que para uma produção anual do cerca de metade da central do Castelo do Bode -150 milhões de kilowatts-hora de energia permanente - virá a ficar à roda de 450:000 contos, o que fará com que o preço de venda do seu kilowatt-hora venha a sair aproximadamente 15 por cento mais caro que o do Zêzere.
Pelo que respeita ao esquema das grandes linhas e instalações acessórias a 150:000 V -previstas, numa 1.ª fase, para o transporte da energia do Cávado e do Zêzere para os grandes centros de consumo de Lisboa, Porto, Setúbal e Beja e interligação das principais centrais eléctricas que, presentemente, já servem essas cidades -, tem estado a ser matematicamente executado, embora haja motivos para recear que na sua última parte - nas linhas do Lisboa - Setúbal e Setúbal - Beja - se venham a verificar atrasos, como consequência da conhecida falta de capitais com que todos os empreendimentos eléctricos em curso vêm lutando desde que no País se começaram a sentir os nefastos efeitos da crise de deflação que o tem flagelado nestes últimos anos do pós-guerra.
Na construção daquele esquema de linhas e funcionamento de serviços acessórios dever-se-ão aplicar, até final, cerca de 370:000 contos, que, somados aos investimentos feitos no Zêzere e no Cávado, perfazem um total de cerca de 1.400:000 contos, importância valtosíssima para os nossos escassos recursos, sobretudo se se atender ao curto prazo em que teve de ser mobilizada