30 DE NOVEMBRO DE 1950 73
A S. Ex.ª o actual titular da pasta da Economia vai caber, certamente, tão ingrato como impopular papel, e só há, por isso, que assegurar-lhe o apoio moral que justamente merece e esperar com confiança que a sua já bem demonstrada coragem, tacto político e imparcial espírito de decisão saiba encontrar a solução justa de um tão delicado problema, para o qual, de resto, deve bem frisar-se - para não haver confusões -, nem de longe nem de perto sequer contribuiu.
Ao emitir esse voto estou certo de que ao seu esclarecido critério não passarão despercebidos todos os aspectos fundamentais da questão que se acha posta.
Julgo, porém, do meu dever chamar daqui a sua atenção para dois deles, pela relevância das consequências de ordem política e económica que dos mesmos podem resultar:
O primeiro é o de que quaisquer actualizações tarifárias que superiormente venham a ser julgadas justas devem ser de aplicação simultânea a todos os concelhos nas mesmas circunstâncias, e não, como até aqui, com uma prioridade variando na razão directa da pobreza ou falta de peso político das povoações em causa e na inversa do quadrado da respectiva proximidade às cidades do Porto e de Lisboa ...
A parte continental do território da Nação Portuguesa é geográfica e constitucionalmente um todo único e, portanto, indivisível.
Por mais fortes que possam ser as razões de ordem política com que se queira fundamentar qualquer outra orientação em matéria de tarifas de energia eléctrica, eu desde já lamento não poder aceitar discriminações territoriais de tratamento em tal assunto se a economia ou a técnica as não justificarem com razão.
Assim o declarei peremptoriamente há dias quando da defesa que tive de fazer dos interesses da minha região - a propósito do aumento das suas tarifas de energia eléctrica - nos serviços que oficialmente têm esse assunto a seu cargo.
Aqui deixo, por isso, igualmente consignado esse ponto de vista, na certeza de que ele será bem compreendido e como tal aceite por quem de direito.
Quanto ao segundo aspecto, desejo dizer o seguinte: de uma maneira geral, e como VV. Ex.ªs não desconhecem, quase toda a população do País estava preparada psicologicamente para um abaixamento dos preços de venda da energia eléctrica, e nunca para a sua alta, quando da entrada ao serviço das novas centrais hidroeléctricas.
As razões de ordem social, económica e política que militam a favor de uma tal política são tão evidentes e metem-se tanto pelos olhos dentro que não vou cansar VV. Ex.ªs repisando sobre o assunto argumentos de todos já bem conhecidos.
Há, porém, aspirações e realidades e se, como receio, estas não permitem ainda, em matéria de tarifas de electricidade, realizar aquelas, pelo menos em certas regiões, só há um caminho a seguir: aceitá-las com calma, tal qual são, e redobrar de esforços, para que essas aspirações acabem também aí por ser realidades!
Quanto a mim, que tenho o horror de todas as situações fictícias ou duvidosas - se há realmente necessidade inadiável de actualizar tarifas em bastantes concelhos do Pais, como me informam pessoas insuspeitas e conhecedoras do assunto -, preferiria mesmo que tal se resolvesse de uma vez para sempre, com toda a imparcialidade e justiça e sem deixar quaisquer raízes para novas ou futuras desilusões.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Procurar-se ainda, num último, mas já inglório, esforço de agradar a populações que, de qualquer modo, vão ficar penalizadas, estabelecer preços que tenham de ser novamente aumentados em pouco tempo, que ponham em perigo o equilíbrio financeiro de empresas em fase incipiente da sua evolução, ou que desalentem, perigosamente, os capitais privados que às mesmas confiantemente acorreram, é que não me parece ser o melhor remédio, se acaso se chegar a pensar em aplicar tal critério.
Com efeito, tem-se já a certeza de que é necessário prosseguir, sem interrupção, na caminhada encetada, se não quisermos que nos falte a energia, de que tanto carecemos, dentro de muito poucos anos.
Sabe-se igualmente, pela experiência anterior, que os capitais do Estado não podem - nem mesmo devem - chegar a tudo.
Cautela então, não vamos agora deixar-nos cair também na tentação fácil - na preocupação de efeitos políticos fugazes - de prejudicar o andamento de uma obra quê importa fundamentalmente ao futuro da Nação - não ao seu presente -, matando à nascença a galinha dos ovos de ouro do interesse dos capitais privados pelos empreendimentos eléctricos!
Mas, claro, isto é meramente um ponto de vista pessoal de uma pessoa sem responsabilidades no assunto e que nem sequer tem interesses, directos ou indirectos, em qualquer companhia de electricidade nem economias para poder alimentar tais devaneios ...
São considerações que me vieram apenas à ideia ao estudar com cuidado aquilo que VV. Ex.ªs acabaram de ouvir e ao lembrar-me de certas palavras de alguém que cada vez mais admiro: «Não se governa só para agradar», e ainda: «Advoguei sempre que se fizesse a política da verdade, dizendo-se claramente ao povo a situação do País, para o habituar à ideia dos sacrifícios que haviam algum dia de ser feitos, e tanto mais pesados quanto mais tardios».
Porque se esqueceram, ou houve conveniência em que se esquecessem, tão prudentes e salutares conselhos, não temos agora que estranhar as consequências: há apenas que voltar a dar razão a quem nunca, de resto, a deixou ainda de ter ...
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Morais Alçada: - Sr. Presidente: na passada sessão legislativa formulei nesta Câmara determinadas queixas a respeito da forma negligente como decorriam os serviços dos caminhos de ferro na linha da Beira Baixa e, simultaneamente, dirigi a S. Ex.ª o Ministro das Comunicações instante apelo para que se adoptasse solução cuidadosa, tendente a servir num mínimo o interesse público desses serviços.
E, ou fosse porque já nesse momento estava no ânimo e no plano da Administração reparar a situação referida, ou fosse porque a minha intervenção aqui tivesse radicado no espírito do Sr. Ministro a ideia precisa de que o problema suscitado necessitava de solução equilibrada e justa do Governo, dando, por isso, instruções no sentido de ser alcançada, o que é certo é que, já depois de encerrada a passada sessão legislativa, aqueles serviços foram modificados para melhor, atendendo com maior solicitude ao interesse da gente a quem mais directamente respeitam.
Não quero deixar decorrer mais tempo sem uma palavra de reconhecimento público a S. Ex.ª o Ministro das Comunicações, reconhecimento que, em qualquer das hipóteses acima postas, seria sempre de expressar em nome dos interesses que nesta Assembleia tenho a honra de representar.