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10 DE MARÇO DE 1951 577

No entretanto, parece que com o alvorecer do dia da redenção outra vida surge nas nossas ilhas e nova vibração agita a nossa gente.
Desenvolvem-se os pomares de laranja, e já no começo do século XVIII a produção é muito importante. Diz Francisco Afonso de Chaves e Melo, o notável autor da Margarita Animata, que algumas árvores dão por safra 6:000 frutos, e todos os anos se carregam com laranjas muitas embarcações para França e Inglaterra.
No entanto, só nos começos do século XIX é que a exportação de laranja toma incremento apreciável e constitui a grande riqueza dos Açores, mas especialmente da ilha de S. Miguel, que há cerca de um século recebia do estrangeiro anualmente à roda de 500.000$.
As dificuldades com os embarques eram tão grandes e o valor do produto tão importante que o Governo, reconhecendo a necessidade de um porto de abrigo em Ponta Delgada, ordenou a sua construção (começada em 1860), a fim de evitar os naufrágios constantes, com o seu doloroso cortejo de perdas de vidas e haveres.
Ainda em 1874 se calculava o valor desta fruta enviada para Inglaterra em cerca de 320:000 libras!
Infelizmente por essa época ao bicho da laranja» começou a aniquilar os pomares e a concorrência das citrinas doutra origem deu-lhe a estocada final.
Contudo, o espírito de iniciativa dos micaelenses não se deixa vencer pela desgraça, e já nesse terceiro quartel do século passado se tenta a cultura do chá e se instala e desenvolve a indústria do álcool tendo como matéria-prima a batata doce. Chegou-se a produzir em 3. Miguel 8 milhões de litros, o que constituía um rendimento fiscal de nada menos de 500.000$.
O álcool açoriano, igual ao melhor produzido no estrangeiro nessa época, era quase todo consumido na preparação dos vinhos generosos portugueses, mas medidas legislativas tendentes a resolver uma crise vinícola impediram a sua entrada no continente, e mais uma grande riqueza se esboroa em plena floração.
Como compensação, é permitida em S. Miguel, alguns anos depois, a produção do açúcar a partir da beterraba. Surge, com tal medida, uma nova indústria, que espalha alguns milhares de contos por operários e cultivadores e origina a entrada naquela ilha de 10 a 15:000 contos todos os anos a contrabalançar, com magnífico saldo positivo, a compra de sementes e adubos para a cultura da matéria-prima.
Tem-se mantido a produção do álcool através de múltiplas dificuldades, e esta indústria, que ainda deixa por ano, em média, mais de 4:000 contos em mãos micaelenses, tem sido sempre - não deve isto ser esquecido - fonte de recurso para o abastecimento do País.
Também no começo do século actual a cultura dos ananases já apresenta notável interesse, assim como a do tabaco e a industrialização desta planta.
Era novamente fácil a vida em S. Miguel há quarenta anos. A fertilidade do solo, que parece se não cansa nunca, dando cultura sobre cultura, duas ou três indústrias importantes e algumas de pequena amplitude em actividade, mas principalmente a facilidade da emigração, tomando os excedentes demográficos e originando entradas apreciáveis de dinheiro, eram a origem do bem-estar social. E creio que é eloquente índice das boas condições de vida o poder-se afirmar que eram raríssimos os casos de tuberculose em S. Miguel antes de 1920.
Mas nova desgraça cai sobre nós com a guerra do 1914, que aniquilou completamente a indústria do ananás, só refeita em 1925.
A falta de emigração e o crescimento da população, que aumenta de forma extraordinária, começaram há vinte e cinco anos a criar um certo mal-estar, que, por motivo daquele crescimento, vem agravando-se de ano para ano.
A indústria do ananás, que toma muitos braços e chegara outra vez a atingir importante valor (mais de 12:000 contos anuais), cai novamente na ruína com o último conflito internacional. Graças, no entretanto, a esforços do Governo, avizinha-se para esta cultura nova prosperidade, embora nos encontremos longe da posição ocupada em 1939.
Está-se caminhando no aproveitamento das últimas jeiras de terra ainda susceptíveis de se transformarem em pastos. Desenvolve-se cada dia mais a pecuária, que muito maior amplitude deveria ter atingido já, mas que, por virtude de medidas que não quero apreciar agora, se encontra nitidamente prejudicada.
Sr. Presidente: fiz esta rapidíssima passagem através de cinco séculos de vida do distrito de Ponta Delgada para mostrar que os homens que durante esse tempo por lá viveram provaram sempre ser os legítimos descendentes dos duros portugueses tenazes e corajosos que venceram o pavor do Mar Tenebroso e, trazendo à Pátria as belas e perfumadas flores colhidas além cabo Bojador, lançaram também nesses mundos desconhecidos sementes de tal vigor que não morrerão jamais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A cada golpe da adversidade respondem os micaelenses com nova iniciativa. Ao pastel, ao açúcar, à pedra-ume segue-se a laranja; a esta o chá, o álcool, a espadana.
Cai o álcool, surge o açúcar novamente, desenvolve-se o ananás e o tabaco, aparecem a chicória e as conservas, toma muito notável incremento a pecuária e a industrialização do leite.
Criaram-se em S. Miguel duas companhias de navegação, com capitais inteiramente locais, que ocupam na marinha mercante nacional destacado lugar, e a ligação aérea comercial entro algumas ilhas faz-se com aviões micaelenses também.
Enquanto a luta pude ser mantida pela iniciativa particular foi ganha a batalha, mas a situação é agora muito mais grave.
Viria a propósito apresentar neste lugar estudos cujos resultados são concordantes, de forma impressionante, para provar que a casa é pequena para conter tanta gente e mostrar em que condições vive o nosso rural.
Julgo inconveniente detalhar aqui aqueles trabalhos e parece-me desnecessário fazê-lo, pois o Governo tem conhecimento do caso micaelense e sabemos e agradecemos o que tem feito para atenuar a sua gravidado.
O Sr. Engenheiro Cancela de Abreu, quando Ministro do Interior, visitou o distrito de Ponta Delgada e, sem se poupar a canseiras, percorreu toda a ilha de S. Miguel. Viu e sentiu os problemas que afligem aquela terra e em toda a parte teve a palavra gentil que cativa e soube enternecer as gentes simples que sinceramente o aplaudiram.
As suas poucas promessas formais estão cumpridas e aquilo que, para aliviar as dores que viu sofrer, só a si próprio jurou fazer está em curso.
O Sr. Dr. Trigo de Negreiros, já quando Subsecretário da Assistência, deu provas do interesse que tem por S. Miguel e conhecemos a preocupação que as condições de vida do nosso distrito lhe causam.
O Sr. Ministro das Obras Públicas deslocou-se há alguns meses aos Açores. Da sua visita já muitos benefícios nos chegaram e quero afirmar-lhe que a gente micaelense não é insensível à sua acção.
Apoiados.
Nestes últimos meses foram terminados no seu Ministério dois estudos da maior importância: o dos aproveitamentos hidráulicos da ilha de S. Miguel e o dos portos de pesca e cabotagem dos Açores. Trabalhos de vastís-