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14 DE DEZEMBRO DE 1951 53

O Orador: - Constitucionalmente nada obsta a que o Governo promulgue decreto-lei em contrário a uma lei votada pela Assembleia.

Todavia, no exercício das faculdades constitucionais, há regras de cortesia, e até de bom senso, que limitam os diversos poderes do Estado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A revogação daqueles preceitos volvidos apenas dois dias sobre a publicação da lei pode ser interpretada como falta de consideração do Governo pela soberania da Assembleia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E sei de Deputados que, por esse motivo, deixaram de comparecer às sessões.

Formulando este aviso prévio, proporciono ao Governo o ensejo de dar à Câmara -como lhe cumpre - a satisfação devida por aquilo que, ao menos na aparência, constitui um fundo agravo.

De momento, nada acrescentarei.

Aguardo a designação de dia para este aviso ser discutido.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Domingues Basto: - Leva-me a usar da palavra, em ligeira intervenção antes da ordem do dia, o decreto-lei sobre o plantio da vinha.

Com data de 23 de Novembro do ano corrente publicou-se no Diário do Governo o Decreto-Lei n.º 38:525, com que se pretende unificar a legislação vária e dispersa em matéria vitivinícola e, modificando o condicionamento do plantio da vinha, promover o aperfeiçoamento da qualidade dos vinhos nacionais.

Para ser-se justo, têm do se louvar os intuitos do Governo e de reconhecer que o Sr. Ministro da Economia procurou, com igual empenho, fugir da liberdade anárquica do plantio, grandemente nociva à economia nacional, tanto como dos rigores do condicionalismo que levassem a intervenção do Governo além do que é indispensável para que, partindo das realidades vitivinícolas, a todos se dê justa satisfação, num equilíbrio de conjunto.

Quando a imprensa anunciou que o Governo, pela pasta da Economia, ia legislar em tal matéria e só tornou do conhecimento público o projecto que ia ser apresentado ao estudo da Câmara Corporativa, algumas vozes se ergueram nesta Assembleia a reclamar que o projecto não fosse publicado sem os Deputados, representantes das várias regiões do País, e atentos às suas realidades vitivinícolas, se pronunciarem sobre ele.

Entendeu o Governo não dever atender esses desejos da Assembleia Nacional, e certamente terá fortes razões a justificar esta atitude.

Sem desprimor, e acatando essas razões, seja-me lícito afirmar que, declarando-se no preâmbulo do decreto-lei em referência ter-se partido das realidades vitivinícolas das regiões do País para se chegar a uma solução de interesse comum e de bem comum, nenhum mal poderia haver, antes toda a vantagem, em que os justos interesses de cada região vitivinícola fossem expostos e defendidos nesta Câmara, para que a solução de conjunto não desconhecesse a verdadeira fisionomia vitivinícola de todo o País e de cada uma das suas regiões.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Disse-se então, não sei com que fundamento, que o decreto-lei não viria a Assembleia Nacional, a fim de evitar que dentro dela se lançassem as regiões umas contra as outras.

Não compreendo, Sr. Presidente, nem me explico, semelhante receio. O mal não está em que cada região vinque o melhor possível o seu fácies específico o em que na solução de conjunto esse fácies seja respeitado ë, por esse respeito, integrado no plano nacional.

Tão pernicioso é o erro que, deturpando os regionalismos, faz deles apenas egoísmos regionais em briga com o bem comum, como a pretensão do resolver os problemas nacionais abstraindo das necessidades peculiares de cada região e esquecendo-as na solução de conjunto.

Nenhum Deputado está aqui para sobrepor os interesses da sua região aos de qualquer outra, mas apenas para que esses interesses não fiquem diluídos, pulverizados, sem o seu justo lugar no conjunto e na solução comum.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Porque penso que neste caso se aproveitaria com a colaboração da Assembleia Nacional, com toda a franqueza o digo e perante ela o declaro.

Com a mesma franqueza, ainda, perante ela .e à face do País, afirmo que tenho sérias dúvidas se o decreto-lei publicado sobre o plantio da vinha concorrerá para que se realize o fim desejado de cuidar mais da qualidade dos vinhos do que de aumentar a produção, mesmo a produção de vinhos de inferior categoria.

Sempre me bati, na imprensa, em palestras, em conferencias, para que na organização e arranjo vitivinícola do País se preferisse a qualidade à quantidade, por me parecer que temos vinhos a( mais de inferior qualidade e não temos feito tudo quanto devia fazer-se para acarinhar e estimular a produção, a preços de concorrência com vinhos de outros países, dos nossos vinhos nobres, que os temos, e de nobreza autentica, em várias regiões do País.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Foi em obediência a este critério que há anos me esforcei junto dos viticultores da região que represento nesta Câmara - a região dos vinhos verdes - para que fizesse, sem esperar as determinações da lei, nem expor-se às multas dos desobedientes, a enxertia dos produtores directos americanos.

Pude, contudo, verificar com amargura que noutras regiões do País havia viticultores que se valiam de toda a sua influência para que na dos vinhos verdes a enxertia fosse imposta à força de medidas draconianas e de pesadas multas, não pelo desejo de melhorar a qualidade dos vinhos e manter as castas regionais, mas apenas pelo interesse egoísta e pela injusta pretensão de inundar a região dos vinhos verdes de vinhos iguais ou inferiores, aos dos produtores directos americanos - os conhecidos «mata-ratos», dos doutras regiões para a dos vinhos verdes.

Sr. Presidente: o problema mantém-se hoje na mesma posição de então ...

A não ser em épocas anormais, produzimos vinhos a mais de inferior qualidade do que os necessários para o consumo nacional e não temos vinhos de qualidade, a preços de concorrência, para a exportação.

Temos sacrificado ao vinho e ao lucro imediato dele proveniente outras culturas mais necessárias à economia nacional e de preço remunerador e justo para o agricultor; tem-se sido demasiado indulgente em consentir que a vinha de fácil produção dos terrenos fundos, alagadiços, sujeitos a erosão e inundações, faça, dentro do País, desleal e injusta concorrência à vinha de terre-