14 DE DEZEMBRO DE 1951 57
Portugal, o que está longe de corresponder à realidade dos factos.
Foi aqui frisado nesta tribuna que o desemprego intelectual - aquele que não pode figurar nos registos do Comissariado, mas que também dele não pode receber protecção - é hoje no nosso país um problema agudo.
E se nestes seis meses decorridas ele se modificou foi para pior, com a saída das Faculdades de movas legiões de licenciados.
E, excluindo os intelectuais, poderá alguém afirmar que não existe desemprego?
Não pode. Porque se as inscrições nos registos oficiais são reduzidas, isso poderá derivar, em grande parte, na descrença nas providências adoptadas, as quais se limitam, a ser úteis, quando o são, para os trabalha dores manuais.
Não parece, portanto, que seja. de recomendar condescendência quanto vá este tipo de acumulações, desde que se mantenha aberta, para os funcionários competentes, a porta das actividades particulares.
Por isto mesmo não podemos aplaudir a intenção de se reprimir as actividades privadas do funcionalismo, quanto a nós inteiramente legítimas, especialmente para os que não são, mercê da sua categoria, obrigados a um dia útil completo de permanência no respectivo serviço.
Que poderá, neste aspecto, interessar ao Estado que um seu servidor dirija uma empresa comercial, dê consultas, ou lições, se dessas actividades não resultar qualquer situação de incompatibilidade com o seu cargo oficial?
Só devia reparar-se no facto quando essa prática ocorresse em tão elevado grau que revestisse aspectos imorais. Mas então não seria a qualidade de funcionário que lhe gravaria a imoralidade; quando muito poderia agravá-la.
As actividades particulares exercidas por funcionários públicos talvez ainda beneficiem o Estado, pelo treino que aqueles poderá daí advir. É o caso de um professor de Medicina exercer clínica, de um consultor jurídico ter cartório aberto, de um engenheiro de obras públicas prestar assistência técnica a trabalhos particulares.
É legítimo - e assim tem sido julgado até agora - que cada qual empregue como entender, e sem prejuízo das funções que desempenha, o tempo que delas lhe ficar livre.
Como é legítimo também que o Estado impeça a corrupção desta liberdade e obste a que a actividade secundária se transforme em primária, pelos proventos de 100, 110 e mais contos mensais ganhos ao serviço de empresas nacionais ou estrangeiras.
Funcionários nestas condições hão-de, por força julgar de somenos importância a função pública que exercem, e só não serão levados o abandoná-la por considerarem que os lugares particulares de que são detentores lhes foram oferecidos em virtude da sua posição oficial ou das suas relações nos meios oficiais.
Ora são exactamente estas grandes acumulações as. que o parecer da Câmara Corporativa defende, por serem - segundo afirma - baseadas na experiência e no valor de quem as usufrui.
Se nesta frase pudéssemos substituir valor por peso e experiência por influência, creio que ela ficaria bastante mais próxima da verdade.
Mas tudo isto perde o sentido ante a intenção do Governo de transformar em matéria colectável as situações anormais resultantes do abuso das acumulações.
Porque se abre um dilema: ouse procura eliminar as acumulações por serem um mal político e social, ou se lança sobre elas um imposto e se tornam em benemérita fonte de réditos públicos.
Aqui, colectar será perpetuar, porque o fisco as tomará então sob a sua protecção, zelando assim os interesses do erário público.
Imposto, em caso algum, nem mesmo a título provisório, dada a tendência que o provisório sempre tem mostrado para se tornar definitivo.
Por mim chego a pensar que o propósito anunciado de rever as acumulações não é senão um pretexto para as tributar. Pois será crível esta intenção da parte de uma entidade que tem sido nos últimos tempos um dos maiores fomentadores de acumulações? Não vale a pena citar factos, não só porque isso é sempre odioso e nada resolve, mas também porque todos terão presentes um ou outro na memória.
Talvez se trate de um acto de contrição do Poder. Mas então aguardemos a manifestação do propósito de não reincidência.
O alargamento da base de isenção do imposto profissional dos empregados por conta de outrém é um acto de humanidade que bem merece louvor caloroso.
Arrancar impostos a quem não ganha, o suficiente para viver (poder-se-á viver com decência auferindo 1.000$ por mês?) é verdadeiramente doloroso.
A compreensão governamental deve, sem dúvida, merecer o reconhecimento dos beneficiados, até porque,, em muitos casos, os vencimentos têm sido conservados abaixo do que desejariam patrões e empregados, apenas com o fim de fugir à tributação. E nisto reside a explicação de a cada alargamento do limite de isenção corresponder um maior rendimento do imposto. É que os ordenados baixos podem então subir até à base do novo limite, e os altos acompanham a subida proporcionalmente. É este um exemplo vivo de como muitas vezes o fisco estanca as fontes de receitas, na sua ânsia de tributação, e perturba fortemente a vida normal dos cidadãos.
Mais ainda poderia ser feito neste capítulo pelas entidades patronais se a contribuição de 15 por cento para a previdência social fosse diminuída em relação aos vencimentos mais elevados, pois quanto mais a empresa, paga aos seus servidores mais absurdamente tem de pagar para a previdência.
Mas isto é já outro assunto, embora estreitamente ligado no campo social a este do imposto profissional.
Pretende também o Ministério das Finanças reduzir o número das publicações oficiais e o seu custo.
Quanto a isto diz o parecer em discussão que «só importará impedir duplicações ou excrescências, assim como desperdícios de papel ou luxos excessivos de apresentação». (Foi naturalmente para colaborar já na economia de papel que o parecer tem só noventa páginas de prosa). A isto permito-me eu "acrescentar: importa também que a diminuição das publicações oficiais não vá colidir com o nível científico do País, já tão baixo em todos os campos. A produção científica em Portugal é quase toda de origem oficial, porque não há fundações mecenais capazes de sustentarem os grandes encargos da investigação científica. E mesmo a generalidade das grandes empresas particulares está longe de usufruir lucros» suficientes para manter estudos, experimentais privativos.
Reduzir publicações oficiais num país tão pobre nelas pode equivaler a baixar o nível intelectual, a inferiorizar o conceito em que somos tidos perante os ramos similares do estrangeiro e até mesmo a enfraquecer o nosso nível literário, já tão fraco que se chega a não haver quem mereça receber os prémios oficiais instituídos.
Poder-se-á, sem perigo financeiro, eliminar essa alínea do citado artigo, para que ninguém seja levado a encontrar nela indícios de mentalidade adversa à cul-