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912 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 161

Cedo, para tanto, a uma evolução de pensamento pela qual fui passando nestes últimos anos, que me foi desprendendo da rotina que sempre conhecera no ultramar para deixar lugar a outros conceitos que, por certo, mais se ajusta m à época.
Mas insisto, agora como sempre, em que as novas relações da autoridade civil com a autoridade militar devem ser estabelecidas por forma a manter-se inalterado o prestígio dos governadores nos vários territórios.
A prática do princípio tem de ser conciliada com a circunstância de serem os governadores os mais altos representantes da soberania nacional nas terras que governam, mesmo que se lhes não atribua, como parece não dever atribuir-se, funções de comando sobre as forças militares.
Sabemos que esta questão tem sido cuidadosamente encarada, tanto pelo Governo como pela Câmara Corporativa. Limito-me, por isso, tendo em vista que a sua mais certa solução se torna indispensável à melhor condução das coisas públicas, a propor esta regra, para que se consigne, neste ou noutro diploma, onde melhor couber: tanto em tempo de guerra como em tempo de paz, devem as relações entre os Ministérios militares e os comandos militares ser estabelecidas, quanto possível, através dos governadores das províncias do ultramar, como representantes do Governo da Nação. Em caso de urgência ou de eventual conveniência, poderão decorrer directamente, mas sem quebra do princípio da sua autoridade, com simultânea comunicação aos governadores dos assuntos tratados.
Refere-se o parecer da Câmara Corporativa à vantagem de, quanto possível, serem distribuídas pelo território de cada província, fora dos pontos de maior concentração de tropas, subunidades ou pequenas unidades.
As vantagens são evidentes: melhor acção de soberania pela presença; mais franca contribuição para o policiamento das varias regiões; maior facilidade de desenvolvimento do comércio e dos núcleos populacionais do interior; maiores possibilidades de assimilação dos indígenas para a moral, para os hábitos e para a língua dos Portugueses.
Transparece em grande parte do parecer da Câmara Corporativa uma preocupação financeira, em face dos aumentos de despesa que hão-de seguir-se à reorganização.
Relativamente a este ponto, evidencia o desejo de que se dê prioridade ao preenchimento dos baixos postos, cujas funções levam ao contacto directo com as tropas, de preferência ao dos altos comandos, cuja necessidade em tempo de paz não será tão premente como em tempo de guerra.
Igual critério me pareceu sempre aconselhável no preenchimento dos quadros do pessoal administrativo.
Deve, todavia, ter-se em conta, segundo foi frisado durante os trabalhos das Comissões pelo nosso ilustre colega Sr. Tenente-Coronel Sonsa Rosal, que a existência dos comandos superiores diminui por vezes os encargos, em vez de os aumentar, pela simplificação dos comandos subalternos.
No estudo dos elementos de trabalho que nos foram facultados surgiu o problema da proporção em que devem ser custeadas, pela metrópole e pelas províncias ultramarinas, as despesas com defesa militar e com a manutenção da soberania.
Nos territórios do ultramar, por virtude da preocupação de reservar recursos financeiros para obras de fomento, está muito espalhado o conceito de que as despesas de soberania devem constituir encargo da metrópole.
O critério oposto, a meu ver igualmente errado, é o de fazer suportar a cada território todas as despesas normais com os seus organismos de defesa militar.
A verdade é que, segundo o pensamento português de unidade nacional, as despesas de soberania de qualquer parcela do território são encargo comum de toda a Nação, devendo ser suportadas, na medida que melhor se adapte às conveniências e às possibilidades, por todos os seus elementos componentes.
A metrópole gasta presentemente com as forças militares 23,5 por cento das disponibilidades do seu orçamento. As províncias ultramarinas gastam cerca de 9 por cento. Apesar de existir desproporção nos números, não me parece que ela possa ser profundamente alterada. A maior parte das províncias não poderão suportar despesa muito maior do que a actual. A metrópole não poderá, portanto, deixar de aumentar grandemente a sua comparticipação.
Sr. Presidente: dentro dos princípios de política colonial que sempre temos seguido, julgo muito oportuna a medida legislativa que passa a permitir o acesso ao posto de sargento de praças provenientes das tropas indígenas.
Relativamente a este ponto, merecem, de resto, inteira concordância as considerações do parecer da Câmara Corporativa sobre o valor das qualidades militares que geralmente se encontram nos indígenas.
Esta resolução, como é evidente, vai além da faculdade, que já tinham, de conseguir acesso na carreira militar os indivíduos com direito ao estatuto de europeu.
Quanto a estes - quanto aos portugueses naturais do ultramar, mesmo sem ascendência europeia, no uso de todos os direitos civis -, alargam-se também as possibilidades de atingir a condição de graduados e o oficialato.
Não deve passar sem reparo quanto estas disposições constituem um elemento mais para demonstrar que erram, por desconhecimento da nossa política ultramarina e dos seus efeitos, aqueles que julgam servir o interesse, das populações nativas portuguesas na África e na Ásia, apoiando-se em teses de emancipação.
O excesso demográfico da metrópole e a carência de braços do ultramar conjugam-se para tornar de interesse mútuo uma intensa colonização; isto sem ter em conta outras conveniências de ordem política, económica e administrativa.
É por isso inteiramente acertada a precaução, que o diploma determina, do seleccionar os indivíduos a nomear para as tropas metropolitanas que se destaquem no ultramar entre aqueles que tenham condições para lá se fixarem, dando assim contribuição maior para melhoramento da colonização.
Ficam resumidas nestas notas as considerações com que julguei poder dar concurso a este debate. Termino declarando que aprovo inteiramente, na generalidade, a proposta de lei. E acrescento que muito me impressionou o cuidado com que foi elaborada pelo Governo, com que foi comentada pela Câmara Corporativa e com que foi analisada pelas comissões desta Assembleia às quais o seu estudo foi entregue.
Disse.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Múrias: - Se a proposta de lei da organização geral, recrutamento e serviço militar das forças ultramarinas visasse apenas problemas de natureza técnica militar, mal se compreenderia a intervenção de um membro não militar na Comissão do Ultramar desta Assembleia.
Acontece, porém, que - como não poderia deixar de ser esta proposta de lei traz consigo problemas de ordem política que ultrapassam as questões de or-