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4 DE DEZEMBRO DE 1952 123

O Sr. Pinto Barriga: - Sr. Presidente: é sempre com enternecimento, com orgulhoso enternecimento, que em Portugal falamos no Brasil, e hoje, ao referirmo-nos à situação confusa do acordo ortográfico no Brasil, não o fazemos com uma quezília de crítica, mas no desejo sincero de que o problema de unificação gráfica, que se deveria apresentar como um traço de união entre as duas nações irmanadas pela sua origem, possa dar uma ideia, até uma simples sombra de suspeita, de divergências ainda persistentes, que se projectem para além do seu aspecto idiomático.
No ano de 1931 firmou-se o 1.º acordo, que não atingiu a unificação ortográfica, por não terem sido as bases discutidas em reunião de representantes dos dois países. Imprimiram-se vários vocabulários em Portugal e no Brasil, todos, porém, com divergências e duplas grafias.
A Academia das Ciências de Lisboa editou, em 1940, o seu grande Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa e a Academia Brasileira deu a lume, em 1943, o Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, mas em ortografia comum.
Em consequência da Convenção de 1943, realizou-se a Conferência Interacadémica. Com os pareceres, firmou as 51 bases que constituíram o 2.º acordo ortográfico, de 10 de Agosto, para a organização do vocabulário, que ficou impresso em Dezembro de 1947.
Em Portugal tudo correu normalmente. Ratificada a Convenção, aprovou-se na altura própria o acordo e adoptou-se o vocabulário.
No Brasil, apesar de o ilustre académico e diplomata Dr. Ribeiro Couto, vigorosa e inteligentemente, ter concluído que ninguém de boa fé, bom senso e boa cultura pode ter interesse em apressar os divórcios idiomáticos e avultado que a liberdade de falar e escrever a língua materna, em função do berço e da latitude, nunca poderá ser prejudicada pela existência de uma ortografia comum, a Convenção do 1943 só foi aprovada pela Câmara dos Deputados em Dezembro de 1931, ainda está no Senado para discussão, e naquela Câmara apareceu em Outubro passado um projecto do Deputado Sr. Dr. J. Coelho de Sousa, em que se lêem estas asserções:

É revogado o Decreto-Lei n.º 8286, de 5 de Dezembro de 1945, que aprovou o Acordo Ortográfico de 1945;
Restabelece-se o sistema ortográfico de 1943, consubstanciado nas Instruções aprovadas pela Academia Brasileira de Letras aos 12 de Agosto de 1943 e no Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.

Em relatório justificativo havia, antes escrito o mesmo Deputado:

a) Seja remetido ao Plenário, para devida aprovação, o projecto de decreto legislativo, oriundo da Comissão de Diplomacia e Tratados, que aprova a Convenção Ortográfica de 29 de Dezembro de 3943, ficando destarte legalizado em definitivo o Acordo de 1943, consubstanciado nas Instruções e no Pequeno Vocabulário daquele ano;
b) Que esta Comissão redija um projecto de decreto legislativo revogando o Decreto-Lei n.º 8286, de 5 de Dezembro de 1945, que aprovou o acordo ortográfico de 1943, para que «as divergências ainda persistentes» a que se refere a mensagem presidencial sejam dirimidas por uma nova convenção que consulte a realidade brasileira e aos interesses do nosso povo, caso não seja julgado bastante, em face desta experiência, o acordo de 1943.
Em recente sessão do Plenário brasileiro foi aprovado o parecer do Sr. Deputado Coelho de Sousa. O leader da maioria, Sr. Dr. Campanema, apresentou um substitutivo que propõe nova conferência.
A discussão prossegue no Congresso Brasileiro, mas nós, por nossa parte, continuamos a cumprir um acordo que se revelou quase puramente interacadémico, embora sancionado pelos dois Governos.
Não nos aventuramos a determinar a nossa posição oficial, nem se há ambiente para novas sugestões, convenções ou conferências, mas surpreende-nos, como professor de Direito Internacional, a situação tão demorada de cumprimento. Confiamos inteiramente no alto tacto do nosso Ministro dos Estrangeiros para clarificar essa questão. Embora reconhecendo, como dever de elementar justiça ao Brasil, o condomínio da Língua e o muitíssimo que fizeram os Brasileiros para o seu extraordinário enriquecimento, não podemos deixar de estranhar esta demora. Acabamos como começámos: trazemos no nosso coração a imagem querida do Brasil, precisamos conhecê-lo ainda melhor na sua vida intelectual e económica, para nos ser mais familiar ainda do que é, com a singeleza da nossa língua comum.
Muito e muito mesmo para além do acordo ortográfico está a amizade fraterna entre Brasil e Portugal, que vive e revive como símbolo e expoente magnífico da nossa luminosa língua. O acordo foi interacadémico, mas, para fora desse ambiente, precisa de ter uma realidade política: executar-se, ou então reconhecer-se que ficou apenas a vegetar a vida efémera das rosas académicas, o que não desmerece o altíssimo serviço que as Academias prestaram. Bem hajam esses eminentes académicos por terem firmemente acreditado, na lúcida expressão do conceituadíssimo Prof. Doutor Rebelo Gonçalves, no futuro de um idioma, orgulho do dois povos e de duas culturas.
Terminamos com a frase expressiva e cintilante do Sr. Presidente da República irmã: a unificação ortográfica e uma obra destinada a respeitar essa força íntima e a conservar a fisionomia plástica do Idioma.
Tenho dito.

Vozes : - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua um discussão na generalidade a proposta de lei relativa ao Plano de Fomento Nacional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Silva.

O Sr. Duarte Silva: - Sr. Presidente: não me proponho fazer uma análise do Plano de Fomento Nacional que o Governo submeteu à apreciação da Assembleia. Outros, com muito brilho, já o fizeram. Alguns mais o farão depois de mim e todos com uma autoridade e uma competência que eu não posso arrogar-me e com um interesse da Assembleia que eu só por deferência e magnanimidade poderia esperar.
Vou, pois, ser muito breve.
Subi a esta tribuna, de que me acerco sempre receoso, com o simples propósito de fazer ligeiras observações à proposta do Governo na parte que diz respeito a Cabo Verde. São os reparos que ao Deputado pela província suscita o programa enunciado na proposta e o sincero desejo de colaborar de quem nasceu e tem vivido em Cabo Verde, conhece um pouco os seus problemas, aos quais tem ligada a sua vida, e a quem, por isso, não podem ser indiferentes as soluções que aos mesmos se pretendam dar.