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124 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 172

Antes, porém, de expor, sucintamente como penso fazê-lo, as observações que me sugere o programa dos trabalhos a realizar em Cabo Verde, não posso deixar de me associar aos louvores que ao Governo têm sido rendidos pelo magnífico trabalho que apresentou e pela grandiosa tarefa que se propõe com o Plano de Fomento Nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se o ambiente político em que temos vívido há um quarto de século não tivesse modificado a nossa mentalidade, ensinando-nos a reconhecer nos homens de governo a seriedade de propósitos e a honestidade de processos, se não nos tivéssemos já habituado às realizações, por certo que o Plano não seria tomado a sério.
Um programa mais modesto do que aquele que se contém na proposta do Governo seria há vinte e cinco anos, e com razão, considerado um bluff político ou, pelo menos, fantasia de um sonhador.
Felizmente, Sr. Presidente, mudaram os tempos; e, se o Plano nos merece reparos, não é que o consideremos irrealizável, mas porque pretendemos mais e melhor.
E essa própria insatisfação representa, sem dúvida, um notável progresso: mostra que a Nação adquiriu a consciência das suas possibilidades e encara confiadamente o futuro.
O Plano é a demonstração irrefutável de que o País tem sido superiormente governado; só uma administração honesta e criteriosa poderia permitir a elaboração e a execução de um programa de obras de tal vulto.
Nunca serão, pois, excessivas as palavras de louvor e agradecimento a quem tornou possível uma tão profunda transformarão da vida nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A elas me associo calorosamente e dou, portanto, o meu apoio à proposta do Governo, que tende a mobilizar todas as fontes de riqueza do País para garantir a todos os portugueses uma vida melhor.
No que toca especialmente a Cabo Verde, permito-me, todavia, apresentar algumas reservas à forma como o problema é encarado e às soluções que a proposta sugere.
Quer no quantitativo que o Plano destina a Cabo Verde, quer na sua distribuição pelas diferentes rubricas, a proposta do Governo, a meu ver, não satisfaz.
Sabe-se, efectivamente, ser Cabo Verde a província ultramarina que mais necessita de auxílio financeiro.
Pois no Plano, que prevê o investimento de 6 milhões de contos no ultramar, apenas se destina a aplicar a Cabo Verde a diminuta quantia de 102 mil contos!
É certo que o Plano se baseia, para o respectivo financiamento, nos recursos orçamentais de cada província e nas possibilidades de garantia que o seu orçamento possa oferecer para a efectivação de empréstimos.
Todos sabem que o orçamento de Cabo Verde é muito pobre; que as receitas dificilmente chegam para cobrir as despesas; que estas se não podem reduzir, e que a vida financeira da província é, portanto, muito precária. Os funcionários são tão mal pagos que os dos quadros comuns fogem de servir em Cabo Verde. Os aposentados vivem em tão grandes dificuldades que, sempre que podem, mudam a residência para a metrópole, onde as pensões recebem sensível melhoria. Não há possibilidade, por virtude da natureza insular do território, de diminuir o número de funcionários. Nas tabelas de despesa ordinária os verbas para obras de fomento são, a bem dizer, inexistentes. Assim, para o ano de 1951 o orçamento inscrevia para obras novas a quantia de 390 contos, aumentada na tabela de despesas extraordinárias com 600 contos para obras diversas. E no orçamento do corrente ano a dotação das obras públicas para construções novas é de 100 contos apenas, prevendo-se, todavia, na despesa extraordinária o gasto de 1200 contos em obras diversas e 500 contos em serviços agrícolas e pecuários.
Uma pobreza franciscana, como se verifica.
As dificuldades financeiras de Cabo Verde são tais que, como já aqui declarei, são elas a principal razão por que advogo a sua exclusão do sistema ultramarino, já que a orgânica deste sistema determina que cada província se baste financeiramente a si própria.
Não se julgue, porém, que Cabo Verde careça de condições de vida. O que sucede é que as suas fontes de riqueza estão todas por explorar.
Cabo Verde é um caso típico da nossa colonização. Sendo incontestavelmente das nossas províncias africanas aquela onde melhor se fez sentir a influência civilizadora sobre o elemento humano, criando uma população homogénea, completamente integrada na maneira de ser portuguesa, vivendo, pensando e sentindo como se vive, pensa e sente na metrópole, na Madeira ou nos Açores, o que, em minha opinião, só constitui para a Nação motivo de orgulho, Cabo Verde é também a província cujos recursos económicos menos atenção têm merecido; aquela que, no ponto de vista material, se encontra mais atrasada.
Daí a dolorosa condição de um povo que criou necessidades iguais às do europeu, que mantém o mesmo nível de vida e que se vê na triste situação de não obter os recursos de que necessita.
A responsabilidade moral da Nação é grande.
E o problema não se resolve com a simplicidade que alguns supõem, dizendo ao cabo-verdiano: se queres viver vai para S. Tomé substituir os angolanos e moçambicanos que para lá já não querem ir.
Essa solução só seria de aceitar quando de facto se reconhecesse que a terra cabo-verdiana tinha já esgotado todos os recursos próprios.
Cabo Verde, porém, tem, a meu ver, condições de vida e só é necessário que se promova o aproveitamento adequado dos seus recursos naturais.
Apetrechando convenientemente o Porto Grande, desenvolvendo a agricultura, facilitando as comunicações, intensificando a pesca e fomentando a indústria, Cabo Verde ficará em condições de utilizar toda a sua população.
São para tanto necessárias duas ou três centenas de milhares de contos?
Pois que se emprestem, ainda que a província não possa garantir a liquidação em curto prazo dos encargos respectivos.
Manda a verdade que se diga que a metrópole não tem faltado a Cabo Verde com os auxílios de que a província tem necessitado em épocas de crise. Mas o efeito é precisamente esse: os auxílios só aparecem nos momentos de crise aguda, e, por isso, não remedeiam o mal e apenas debelam os sintomas de ocasião.
Em 1948, sendo Ministro das Colónias o ilustre Deputado capitão Teófilo Duarte, que conhece bem a província, à qual dedica particular afeição, como ainda ontem demonstrou no notável discurso que proferiu neste debate, foi concedido a Cabo Verde um empréstimo de 50:000 contos, assumindo a metrópole generosamente o encargo dos juros durante os primeiros cinco anos.
O decreto que autorizou o empréstimo dizia:

Reserva-se, porém, a parte substancial do empréstimo para ser despendida no fomento de Cabo