12 DE FEVEREIRO DE 1953 631
Nem por se tratar de actividades marítimas isso me parece defensável, a não ser em situações de beligerância, da mesma forma que o Exército só nesta emergência interfere nas actividades industriais situadas em terra firme.
Em suma, e como já referi, não hesita o Sr. Deputado Jacinto Ferreira em classificar os males que no seu dizer afligem a marinha mercante no que respeita ao o social» como uma resultante imediata da integração da marinha mercante na ordem administrativa da marinha de guerra.
Entretanto, seja-me consentida rápida divagação.
Não é facto inédito nem coisa que se não tenha ouvido, e por vezes com certa sistematização, o slogan de que a marinha mercante deve ser aspirada da ordem administrativa da marinha de guerra.
Em consciência, punha-me a cismar, porque, não desconhecendo que alguns países adoptaram aquele esquema administrativo, não compreendia, contudo, que no momento em que, sob a égide da marinha de guerra, se efectua o movimento de crescimento da frota mercante e em que, sob a orientação suprema e directriz definitiva do Sr. Presidente do Conselho, o actual titular da pasta da Marinha, num esforço magnífico, em que a competência e a probidade se fundem solidariamente para, no superior interesse da Nação, atender às exigências materiais e humanas do movimento renovador, pudesse ter consciência o zunzum.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como mero parêntese, devo dizer que não me importo que me digam que estou criando limitações ou ferindo nota emocional. A verdade nunca tem carácter de redundância quando se repete. Clarifica ainda mais. Atribuí antes o zumbido ao significado do velho provérbio oriental: «Só se atiram pedras às árvores que têm frutos».
Porque é possível a muitos dos Srs. Deputados não ser familiar o assunto, vou permitir-me um pequeno apontamento, tanto mais que o Sr. Deputado Jacinto Ferreira apenas ditou uma arrumação por sentença empírica, ao alcance comum de quem quer que esteja polarizado ou encrencado mim sentido.
A marinha de guerra contém, dentro da sua ordem administrativa, duas grandes divisões: a militar naval propriamente dita e a que respeita ao fomento marítimo. No cimo o titular da pasta da Marinha dirigindo as duas.
No fomento marítimo, sob a alçada da Direcção-Geral da Marinha, encontram-se os serviços hidrográficos, faróis, marinha mercante, capitanias, pescarias, em ligação com a maravilhosa organização das Casas dos Pescadores, a Escola Náutica, etc.
No que respeita à marinha mercante, em si mesma, além da respectiva direcção e repartição técnica, com quadros especializados, capitanias, subordinados à Direcção-Geral, concorrem no movimento administrativo da marinha mercante a Junta Nacional, em ligação com o Grémio dos Armadores, a Escola de Marinheiros e de Mecânicos da Marinha Mercante, etc.
O regime, o problema do trabalho a bordo, enfim o a social», está inteiramente dependente do Ministério das Corporações, cujas determinações são postas em execução nas capitanias através, do contrato de matrícula, sob a autoridade do capitão do porto.
Neste rápido esboço quis apenas, demonstrar, sem comentário, que a esquematização administrativa da marinha mercante dentro do âmbito da marinha de guerra constitui um sistema completo de quadros e valores. E então pode dizer-se que, seja qual for a concepção
ou arrumação administrativa da marinha mercante, terá de obedecer nas suas paredes-mestras, nas suas bases fundamentais, àquele esquema que o tempo e a experiência foram .sucessivamente ensinando.
Posto com inteira lealdade, embora em síntese, este problema, será de considerar a «arrumação» do Deputado Jacinto Ferreira, embora tenham sido as considerações que produziu tão empíricas, tão cortadas à escovinha, tão magrinhas de conteúdo ou de fundo?
Vejamos ainda.:
Se considerarmos que a marinha de guerra nasce, como razão lógica e fundamental, da necessidade da protecção das frotas de comércio, se a última grande guerra mundial demonstrou a existência de uma tal interligação, colaboração íntima técnica e moral a ponto de em certos casos não haver diferenciação sensível nos armamentos e «té modos de acção, se .no momento o Estado-Maior Naval, em obediência a convenções ou compromissos, indica para os na vãos de comércio em construção um conjunto de detalhes de ordem técnica, se considerarmos que entre nós está dado largo passo em frente no, instrução e preparação militar dos alunos da Escola Náutica, como cadetes, em estabelecimentos de marinha em harmonia com os seus ramos de actividade, e que na mesma Escola Náutica, sob a directriz do Estado-Maior Naval, os alunos do curso de capitães recebem e ouvem palestras, instrutivas sob a designação de «curso de defesa» e que amanhã será necessariamente melhorado, pergunto: será este o momento aconselhável para a «arrumação» que foi sugerida pelo Sr. Deputado Jacinto Ferreira?
Será de considerar, sim, se estiver mal o que está.
Trata-se, pois de uma demonstração de facto.
Ao iniciar as minhas considerações disse que só me interessavam as sentenças e críticas do Sr. Deputado Jacinto Ferreira quando objectivadas, trocadas em miúdos, enfim, no terreno chão das realidades. Nas críticas no espaço não tomo posição para sim ou para não.
E, assim, tomarei os «casos», as concretizações, os factos expostos pelo Deputado Jacinto Ferreira, pela ordem cronológica com que foram apontados, procurando com o maior escrúpulo fazer a sua análise. À Câmara compete julgar.
Diz o Sr. Deputado Jacinto Ferreira (leio do seu discurso):
Quanto a horário de trabalho, bastará referir um exemplo típico:
O trabalho corrente e necessário dos oficiais náuticos para a determinação do ponto do navio e outros serviços de navegação a este conhecimento ligados só é considerado extraordinário na parte que exceda duas horas por dia.
Simplesmente, o imediato que faz o cálculo das estrelas às 5 da manhã e às 6 da tarde determina, em certos barcos, que ao cálculo deverão comparecer todos os oficiais, inclusive o que se deitou depois da meia-noite e o que terminou o seu quarto às 4.
Não será revoltante deixar este serviço fie ser considerado extraordinário para os que, tendo trabalhado até às horas referidas, vêm depois a ser perturbados no seu merecido repouso?
Suponho, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a exposição do Deputado Jacinto Ferreira escapa ao claro entendimento, sobretudo para quem desconhece o meio. Ponhamos a questão nos seus justos termos: O regime de serviço, quando navegando, para os oficiais pilotos é de três quartos corridos. O exercício do quarto é efectuado na ponte do navio. Daqui resulta